Manifestação anti-Brexit em Londres, Reino Unido: custo do processo de saída do bloco europeu será amplificado por negociações prolongadas, diz economista (John Sibley/File Photo/Reuters)
Gabriela Ruic
Publicado em 26 de março de 2019 às 09h46.
Última atualização em 26 de março de 2019 às 09h49.
São Paulo – A negociação do Brexit segue caótica e as dificuldades enfrentadas pela primeira-ministra britânica, Theresa May, para aprovar o acordo firmado com a União Europeia (UE), e que foi rejeitado duas vezes pelo Parlamento, mostram o quão difícil é deixar um arcabouço político, jurídico e regulatório sem um plano sobre como substituí-lo.
Essa é a visão de Mohamed El-Erian, economista-chefe da Allianz e presidente do Conselho de Desenvolvimento Global do ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. “Em um mundo no qual a política do ódio está presente, é mais fácil votar para desmantelar alguma coisa do que votar para reter, melhorar e construir”, disse o especialista, eleito quatro vezes como um dos maiores pensadores de política internacional pela tradicional revista Foreign Policy.
Por e-mail, El-Erian falou a EXAME sobre suas impressões acerca do momento atual das negociações sobre a saída do Reino Unido do bloco europeu, bem como as lições que esse longo e duro processo está ensinando ao mundo. Veja a entrevista abaixo na íntegra.
EXAME – Quais são as maiores lições que o Brexit ensina ao mundo?
El-Erian – Há muitas lições e três vem imediatamente à mente. A primeira, e mais importante: é difícil substituir algo com nada. Aqueles que defendem o Brexit precisam de uma alternativa que seja viável economicamente, financeiramente, politicamente e institucionalmente.
A segunda: em um mundo no qual a política do ódio está presente, é mais fácil votar para desmantelar alguma coisa que votar para reter, melhorar ou construir. Terceira, o custo desse processo pode ser amplificado justamente pelo que não é feito durante negociações prolongadas.
EXAME – Qual cenário para o Brexit você considera o mais plausível: acordo ou sem acordo?
El-Erian – Com acordo. Não porque o acordo perfeito existe. Pelo contrário, muitos dos acordos imperfeitos dominam uma saída desordenada do Reino Unido da UE quando se trata de efeitos de curto e longo prazo. A chave é conseguir uma decisão rápida para que o foco dos políticos e a energia possam endereçar o maior desafio: gerar um crescimento sustentável e inclusivo.
EXAME - Os desdobramentos recentes do Brexit mostram que o dilema da saída do Reino Unido da União Europeia está longe do fim. O que podemos esperar das negociações daqui para frente, uma vez estendido o prazo de saída?
Mohammed El-Erian – A expectativa é a de que os dois lados consigam chegar em algo que seja aceitável ao Parlamento britânico e também aos países-membros da União Europeia. E essa necessidade será amplificada em razão das eleições para o Parlamento europeu, que acontecem no final de maio.
Além disso, quanto mais tempo essa saga durar, mais as distrações irão desviar o foco das medias que são necessárias para promover produtividade e crescimento econômico num momento no qual o mundo se movimenta de maneira extremamente fluída.
A meu ver, o risco é o de que, quando chegarmos no momento de compromissos inevitáveis e da construção de consenso, os dois lados continuem mais confortáveis em rejeitar o que não querem, em vez de construir uma solução que seja viável.