Agência de notícias
Publicado em 15 de abril de 2024 às 12h14.
Última atualização em 15 de abril de 2024 às 15h08.
Quando duas voluntárias da campanha democrata bateram à porta de Davine Cortez, no Arizona, a empresária, sem interesses partidários, espiou timidamente pela fresta. Mas quando soube que elas estavam procurando assinaturas para proteger o direito ao aborto, abriu a porta.
"Claro que assino!", disse a mulher de 50 anos que, entusiasmada, lhes entregou um punhado de canetas: "Aqui! Para que mais pessoas possam assinar".
A recepção de Cortez dá uma ideia de como o acesso ao aborto, defendido pelo presidente, o democrata Joe Biden, pesará nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, ao contrário do seu rival, o republicano Donald Trump, cujo partido acaba de sofrer derrotas eleitorais com líderes que abraçaram a restrição deste direito.
"Ninguém deveria nos dizer o que fazer com nossos corpos. Isso inclui aborto, vacinas, qualquer coisa", disse Cortez à AFP. "As mulheres precisam do aborto por diferentes razões, portanto tirar isso é tirar um direito humano", acrescentou Cortez. "E uma vez que começa, só continua".
A Suprema Corte do Arizona restabeleceu, na última terça-feira, uma lei de 1864 que restringe quase completamente o acesso ao aborto, sem exceções para casos como estupro ou incesto.
A decisão é consequência da sentença de 2022 da Suprema Corte dos Estados Unidos, de maioria conservadora, graças a três juízes nomeados por Trump, que eliminaram a proteção deste direito a nível federal.
"Todos temos que entender quem é o culpado", disse a vice-presidente Kamala Harris na sexta-feira, em Tucson. Trump "quer devolver os Estados Unidos a 1800".
O Arizona será um cenário fundamental na disputa pela Casa Branca. Biden venceu em 2020 neste estado do sudoeste do país por pouco mais de 10 mil votos, terreno fértil para o negacionismo eleitoral.
Com uma revanche que promete ser acirrada, os democratas arregaçaram as mangas e saíram às ruas do Arizona neste fim de semana com os direitos reprodutivos das mulheres no centro da campanha.
"Espero que mais pessoas se registrem para votar porque se deram conta de que as eleições são importantes", disse o senador democrata Mark Kelly, que se reuniu com voluntários em Phoenix.
"Isso certamente ajudará a campanha democrata", afirmou Liz Grumbach, uma voluntária de 37 anos. Os direitos ao aborto "estão enraizados na história do estado", acrescentou.
Reflexo da situação nacional, a maioria dos moradores do Arizona apoia o acesso ao aborto, o que coloca em apuros os líderes republicanos, cuja base é constituída em parte por forças religiosas e conservadoras.
Trump vangloriou-se de ter contribuído para a composição conservadora da Suprema Corte e para a decisão de 2022 que estabeleceu as bases para que 20 estados com governos ou tribunais conservadores revertessem o direito ao aborto, provocando protestos e ações judiciais.
A iniciativa "Arizona pelo Acesso ao Aborto", promovida por organizações apartidárias, busca consagrar o aborto na Constituição regional por meio de um referendo que será realizado em 5 de novembro, ao mesmo tempo que a eleição presidencial.
O caso ganhou mais força esta semana após a decisão judicial. "Não estamos em 1800. Estamos muito mais avançados", comentou Lucy Meyer, uma bancária de 54 anos, ao assinar a petição. "Isso (uma lei mais antiga que o próprio estado) não faz sentido".
Os organizadores do "Arizona pelo Acesso ao Aborto", que afirmam ter coletado mais de meio milhão de assinaturas, também organizaram vários eventos no fim de semana para protestar contra a decisão judicial e aprofundar a campanha.
Centenas de pessoas com cartazes a favor do direito ao aborto ocuparam uma esquina comercial na cidade de Scottsdale, nos arredores de Phoenix, no domingo.
Chris Love, assessora principal do movimento, enfatizou à AFP que os ativistas estão aproveitando a ocasião para "conversar com compatriotas do Arizona de qualquer espectro político, porque nossa causa é popular".
"Temos visto repetidamente que quando o aborto está em debate, ele vence", acrescentou. Liz Grumbach concorda que causas como a defesa dos direitos reprodutivos constroem pontes na polarizada sociedade americana.
"Estamos em um momento muito tenso e frustrante", afirmou. "Mas a esperança que tenho é que cada vez que converso com alguém, mesmo que não concorde comigo, somos capazes de conversar sobre os assuntos que consideramos importantes. Existe um meio-termo".