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Conheça o símbolo da revolução energética alemã

EXAME.com conversou com o engenheiro colombiano Mauricio Rojas, um dos responsáveis pelo EUREF-Campus. Veja os principais trechos da entrevista

EUREF-Campus: local gera a própria energia renovável para recarregar baterias (Google Street View/Reprodução)

EUREF-Campus: local gera a própria energia renovável para recarregar baterias (Google Street View/Reprodução)

Anderson Figo

Anderson Figo

Publicado em 17 de dezembro de 2016 às 07h00.

Última atualização em 17 de dezembro de 2016 às 07h00.

São Paulo - Um quarteirão urbano de 5,5 hectares em Berlim é o símbolo da transformação energética pela qual a Alemanha vem passando, chamada de “Energiewende”. O país vai desligar todos os seus reatores nucleares até 2022 e pretende reduzir em até 95% a emissão de CO2 até 2050, através de subsídios que incentivam a descentralização da geração de energias renováveis.

O EUREF é um campus da Universidade Técnica de Berlim (TU, Technische Universität Berlin), base de empresas que trabalham com energia, sustentabilidade e mobilidade. O campus produz energia limpa, que é utilizada para recarregar baterias de carros elétricos, e a carga em excesso pode ser vendida para a administradora do sistema elétrico da cidade.

Além de sua autonomia, o que torna o EUREF um símbolo da “Energiewende” é o mecanismo inteligente com o qual o campus alterna as formas de geração de energia, conforme a percepção de tempo e de necessidade de uso.

EXAME.com conversou com o engenheiro colombiano Mauricio Rojas, um dos responsáveis pelo projeto, para entender o papel do EUREF na transformação da matriz energética da Alemanha e na abertura de caminhos para que estruturas semelhantes possam ser instaladas em outras partes do mundo, como na América Latina. Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

EXAME.com: O EUREF é um campus modelo para a administração de energia no futuro. O sr. pode nos contar como ele funciona?

Mauricio Rojas: Dentro das metas propostas pelo governo alemão para o futuro está reduzir de forma drástica as emissões de gases nocivos à atmosfera. Como é bastante sabido, os principais emissores são a geração de energia elétrica e o transporte.

Um dos desafios atuais é a inclusão da energia renovável na rede elétrica. O EUREF-Campus inova porque permite a geração de energia de maneira descentralizada, de forma que a energia é consumida no mesmo lugar em que é gerada, sem ter que transportá-la por grandes distâncias.

Além disso, o EUREF também disponibiliza uma das maiores estações de recarga de veículos elétricos da Alemanha. O mais notável é que a energia gerada no campus é limpa, por essa razão que o EUREF é uma excelente referência sobre os objetivos governamentais.

O segredo está no manejo da tecnologia da informação, onde constantemente estamos monitorando o estado do campus. Um algoritmo inteligente se encarrega de decidir qual é o melhor uso da energia produzida. Junto com a estratégia de eficiência energética presente no modelo dos edifícios, o campus pode chegar a economizar até 30% de energia.

O sr. disse que a energia gerada é limpa. Qual tipo de energia estamos falando especificamente? E como é feito o controle dela?

A energia é gerada de três formas: solar fotovoltaica, eólica em pequena escala e biogás. Como expliquei, sistemas de comunicação nos permitem monitorar o estado atual e incorporar projeções (climáticas, por exemplo).

Um sistema inteligente processa essas informações em tempo real e, assim, geramos os pontos de operação dos equipamentos instalados no campus, como as baterias, por exemplo.

Vale ressaltar que a gestão inteligente das baterias nos permite enfrentar com sucesso a vulnerabilidade natural das fontes renováveis de energia, como solar e eólica.

Vocês têm algum plano para expandir o que fazem com a energia gerada no campus no futuro?

A energia gerada hoje é utilizada principalmente para recarregar baterias dos carros elétricos através dos quase 50 pontos de recarga distribuídos pelo campus.

No curto prazo, há planos para integrar os edifícios ao redor na rede interna e, assim, proporcionar ao menos parte da energia que eles consomem.

O sistema também está projetado para permitir a venda de energia à empresa de distribuição local em casos de excesso de produção, como ocorre durante o verão, por exemplo, quando há muita energia solar disponível.

Como é mantido financeiramente o campus?

O campus é um lugar comercial, que se sustenta da mesma forma que qualquer outro lugar comercial da Europa. Uma ressalva é que a nossa micro rede inteligente foi financiada pelos governos federal e da cidade de Berlim através de projetos de pesquisa.

Mas o que temos aprendido nos permite levar essa tecnologia a outros lugares. Para isso, foi fundada uma empresa, a Inno2grid, que se encarrega do contínuo monitoramento e da comercialização desse tipo de sistema.

Há planos de construir outros modelos como o EUREF pela Alemanha?

Na verdade, estamos trabalhando nisso atualmente. Temos conversas muito avançadas com outros lugares em Berlim que vão instalar nossos sistemas nos próximos anos.

Cabe ressaltar que são sistemas de alta complexidade que envolvem muitos fatores, o grande problema às vezes não é nada técnico, mas, sim, atender às disposições legais.

O EUREF-Campus está em contínuo crescimento, ainda faltam alguns edifícios para ser construídos. A micro rede inteligente vai se ajustando às necessidades do campus.

Como o EUREF vai ajudar a Alemanha a atingir suas metas sustentáveis?

A maior contribuição é a combinação da geração descentralizada de energias renováveis com a alternativa de mobilidade mais amigável ao meio ambiente, com os carros elétricos.

O campus também continua sendo um centro de pesquisas onde se testam outras tecnologias, como a condução autônoma ou o uso de carros elétricos para ajudar a estabilizar a rede elétrica, passando pelos impactos que esses novos paradigmas podem gerar na sociedade, tanto em seus costumes quanto nos novos modelos de negócio necessários para sustentar essas iniciativas.

Quais são os problemas que o sr. enxerga para a geração de energia renovável na Alemanha?

Falta entender que o ambiente está muito mal gerido e que não há outra opção a não ser a de se afastar das tecnologias obsoletas para dar conta da demanda atual. A técnica existe, os custos estão cada dia menores, e os elementos são acessíveis em mais lugares.

O que falta na equação é a vontade política para criar melhores formas de implementação que os consumidores também aceitem. Creio que há muita consciência, mas ainda assim não é suficiente.

Qual é o custo de manutenção do campus?

O campus é uma iniciativa privada, onde cada inquilino paga pela manutenção do espaço. Falando da nossa rede em particular, os custos se amortizam muito rapidamente, dado que não somente desenvolvemos a técnica como também implementamos modelos de negócio inovadores, que nos permitem atingir um faturamento suficiente para a manutenção do espaço. Os projetos de pesquisa também ajudam a cobrir os gastos.

Seria viável construir um campus como este em países da América Latina como o Brasil?

Sim, é viável. Nós latinos gostamos de sair na frente sempre, sem complicações. De fato, os elementos que constituem uma rede inteligente são, em sua maioria, custosos. Mas é exatamente por isso é que há necessidade de converter a América Latina em um pólo de desenvolvimento de ideias, que são necessárias para nosso futuro.

Um problema talvez seria a falta de conhecimento técnico,  mas conheço muitos programas de capacitação e formação que incluem as matérias relacionadas. Não vejo por que não seria possível fazer [um campus como o EUREF] em nossos países.

Eu tenho um exemplo no meu país [Colômbia]. Existe uma rede inteligente [de geração de energia] em uma universidade de Medellín. É pequena, mas funciona muito bem e é uma fonte importante de conhecimento.

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