Primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan: ns últimas semanas, o governo de Erdogan realizou punições sem precedentes na alta hierarquia da segurança nacional (AFP)
Da Redação
Publicado em 10 de janeiro de 2014 às 12h44.
Ancara - A tensão entre o governo turco e a justiça se converteu em guerra aberta nesta sexta-feira, quando o Parlamento analisava a controversa proposta de lei para reforçar o controle político sobre o sistema judicial, em pleno escândalo político-financeiro.
A algumas horas do início da análise pela comissão parlamentar deste texto (às 15h00 locais desta sexta-feira - 11h00 de Brasília -), o Alto Conselho dos Magistrados (HSKY), uma das principais instituições judiciais do país, denunciou as intenções inconstitucionais do primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan.
"A proposta é contrária ao princípio do Estado de direito", considerou o HSKY em um comunicado.
"Com esta emenda, o Alto Conselho deve prestar contas ao ministério da Justiça. Esta emenda é contrária à Constituição", anunciou a Instituição, encarregada especialmente de nomear os magistrados.
Este projeto, redigido pelo Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), amplia a composição desta instituição e dá ao ministro da Justiça a última palavra sobre a nomeação de magistrados em instituições chave, como a Corte Constitucional.
O texto será votado a partir da próxima semana no Parlamento, onde o AKP goza de uma ampla maioria.
Após a operação anticorrupção de 17 de dezembro, esta iniciativa é a última tentativa dos islamitas moderados no poder de controlar a justiça, ante a investigação anticorrupção pela qual foram atingidos.
As investigações anticorrupção dirigidas pela Procuradoria de Istambul levaram à prisão de vinte empresários e personalidades próximas ao poder por corrupção, fraude e lavagem de dinheiro, e provocaram a renúncia de três ministros, além de uma ampla remodelação do governo.
Erdogan suspeita que na polícia e na justiça estão infiltrados membros do movimento muçulmano do pregador Fettullah Gullen, em guerra aberta contra o líder do país, a apenas alguns meses das eleições municipais de março e das presidenciais de agosto.
Nas últimas semanas, o governo de Erdogan realizou punições sem precedentes na alta hierarquia da segurança nacional, e vários magistrados foram transferidos ou declarados incompetentes, o que provocou muitas reações judiciais contra as pressões do governo.
A reforma do HSYK foi muito criticada pela oposição. "É evidente que é uma disposição contrária à Constituição", considerou o chefe do Partido Republicano do Povo (CHP), Kemal Kiliçdaroglu, "e o comunicado do HSYK é um ato de desafio ao poder".
A reforma judicial também foi denunciada por seus sócios europeus. O comissário de Direitos Humanos do Conselho da Europa, Nils Muiznieks, o considerou "um duro golpe à independência da justiça na Turquia".
Washington também mostrou na quinta-feira sua preocupação pela guinada dos acontecimentos e lembrou seu apoio "ao desejo do povo turco de ter um sistema judicial justo e transparente".
Além das consequências sobre a divisa nacional e os mercados financeiros, a tempestade político-judicial que atinge a Turquia também ameaça o futuro de Erdogan, na liderança do país desde 2002.
Uma pesquisa mostrou na quinta-feira uma queda nas intenções de voto ao seu partido, que obteria 42% de apoios se fossem realizadas eleições legislativas nesse momento, o que marca uma queda de 2% em relação a julho.