Venezuela: Reboques movem o petroleiro President, ancorado há dois anos na baía de Pampatar na ilha Margarita (AFP Photo)
Agência de notícias
Publicado em 22 de janeiro de 2024 às 14h28.
A flexibilização do embargo petroleiro que os Estados Unidos impuseram à Venezuela permite à combalida indústria do país caribenho recuperar antigos canais para vender seu petróleo e retomar sociedades com empresas estrangeiras, embora se trate de um processo que, segundo especialistas, levará tempo.
A Venezuela assinou no final do ano passado contratos com a francesa Maurek & Prom e a espanhola Repsol, cujas especificações são confidenciais, para a exploração de petróleo e gás. Esses convênios, disse à AFP o especialista petroleiro Rafael Quiroz, permitirão "amortizar" a dívida com essas companhias.
A dívida total da estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA) com seus parceiros e terceirizados é estimada em cerca de US$ 15 bilhões (R$ 73,8 bilhões, na cotação atual).
Os passivos da PDVSA com a Maurel & Prom giram em torno dos US$ 900 milhões (R$ 4,3 bilhões ) e com a Repsol, em torno dos US$ 340 milhões (R$ 1,7 bilhão), segundo dados revelados por essas empresas.
Os novos contratos permitirão reinvestir em projetos conjuntos e gerar receita com arrecadação de impostos, argumenta Francisco Monaldi, diretor do Programa Latino-Americano de Energia do Instituto Baker, na Universidade de Rice, no Texas.
Os lucros poderão ser distribuídos em "um terço (da dívida), um terço (em reinvestimento) e um terço (em impostos)", projetou Monaldi em declarações à AFP.
A americana Chevron já havia reativado as operações na Venezuela em junho passado, após receber o aval dos Estados Unidos. O país sul-americano também assinou, em dezembro, um acordo com a Shell para produzir e exportar gás junto com Trinidad e Tobago.
A Venezuela, que produzia 3 milhões de barris diários (bd) quando Hugo Chávez chegou ao poder, há 25 anos, viu sua produção cair para menos de meio milhão em janeiro de 2021. A cifra fechou em 800.000 bd em 2023, de acordo com a Opep.
A PDVSA aposta em "um aumento acelerado" em 2024, mas as previsões de especialistas sugerem que a flexibilização das sanções terá um impacto modesto.
Os contratos assinados podem levar a oferta venezuelana a 900.000 bd ou, em um cenário favorável, ao milhão prometido pelo governo do presidente Nicolás Maduro todos os anos.
A Maurel & Prom projetou que poderia produzir na Venezuela entre 20.000 e 24.000 barris diários em 2024.
A Repsol, por sua vez, disse à AFP que espera "um aumento substancial", sem revelar valores.
Especialistas calculam que os convênios com a Repsol e a Chevron podem aportar cerca de 100.000 bd à produção venezuelana.
"Tudo isso, obviamente, dependerá da manutenção da licença geral (outorgada pelos Estados Unidos para a exploração de petróleo e gás na Venezuela apesar das sanções) e que obviamente tudo continue funcionando", acrescentou Monaldi.
As receitas da PDVSA dobraram em um ano, ao passar de US$ 3 bilhões (R$ 14,7 bilhões) em 2022 para US$ 6,32 bilhões (R$ 31,1 bilhões) em 2023, segundo dados revelados recentemente pelo governo. No entanto, esse número é bastante inferior às estimativas independentes, em torno de 10 bilhões de dólares (49,2 bilhões de reais).
Em 2024, "estariam entrando cerca de US$ 16 bilhões (R$ 78,7 bilhões)" na Venezuela, estimou Monaldi. "É um aumento muito importante. Então, os contratos não servirão apenas para pagar dívidas, mas também para que haja mais receitas", acrescenta.
Economistas concordam, no entanto, que o aumento da renda derivada do petróleo não se traduzirá de início em uma melhoria imediata para o cidadão comum.
Os venezuelanos enfrentam uma inflação crônica, assim como uma constante desvalorização da moeda local.
Os Estados Unidos suspenderam o embargo até abril após um acordo em outubro entre o governo de Maduro e a oposição sobre as eleições presidenciais deste ano. Os especialistas acham pouco provável que as sanções sejam revertidas, devido à crise energética resultante da guerra na Ucrânia.
"Se a licença for mantida e esse processo se consolidar, pode ser que outras empresas cheguem", afirma Monaldi, alertando que para chegar a 2 milhões de bd seria necessário um investimento de 100 bilhões de dólares (492 bilhões de reais) em sete anos para recuperar a deteriorada infraestrutura da indústria venezuelana.
Quiroz destaca que a PDVSA "não tem um centavo para investir".
Assim, a estatal venezuelana depende de parceiros estrangeiros e, adverte, "nenhuma empresa transnacional vai investir sozinha".