Donald Trump é retirado de comício após som de tiros em Butler, Pensilvânia (Anna Moneymaker/AFP)
Editor de Macroeconomia
Publicado em 15 de julho de 2024 às 17h09.
Última atualização em 15 de julho de 2024 às 17h10.
O atentado contra o ex-presidente Donald Trump, que levou um tiro de raspão na cabeça, mudou o cenário de perspectivas para o resultado das eleições nos Estados Unidos. Mas, afinal, quais os efeitos imediatos dessa tentativa de assassinato, como vem chamando o FBI, responsável pela investigação?
Para Mauricio Moura, sócio do fundo Zaftra, da Gauss Capital, professor da Universidade George Washington e analista do podcast O Caminho para a Casa Branca, há dois efeitos imediatos.
Primeiramente, aumenta, consideravelmente, a tensão e a polarização política nas redes sociais. "Começou um blaming game (jogo de culpar o outro) entre republicanos e democratas", diz Moura.
Segundo ele, pesquisadores independentes e democratas apontam que a situação de Trump ficou "mais confortável", pela possibilidade de se posicionar como vítima ou mártir após o atentado.
"Mas eles têm dificuldade de ver isso como algo que fará os independentes votarem no Trump", diz Moura.
O raciocínio de Moura é que do total do eleitorado, 41% são independentes -- e são eles os definidores de qualquer eleição nos EUA.
Para vencer, candidatos normalmente conquistam de 20% a 25% desses independentes -- isto é, pelo menos a metade. "O Trump está distante disso. Hoje, ele tem em torno de 10% a 12% desse total", afirma o professor da Universidade George Washington.
Por isso, o tom da narrativa de Trump pós-atentado será crucial. "Para avançar, Trump não deveria aumentar a temperatura, para avançar sobre os independentes. O evento por si só não conquista votos", diz. "Se ele baixar a temperatura, aumenta muito a probabilidade. Se aumentar a retórica, ele vai inflamar a base dele."
Por sua vez, a imprensa americana noticia que Trump pretende amenizar o tom nos próximos discursos, em linha com a narrativa de união nacional feita por Biden em suas últimas declarações à nação.
Outro efeito imediato do ataque a Trump é que a pressão o atual presidente e candidato democrata, Joe Biden, aumenta significativamente. Ele já vinha sendo pressionado para abdicar de sua candidatura por causa dos questionamentos sobre sua capacidade cognitiva após um desempenho decepcionante no debate com Trump no final de junho.
Desde então, vem tentando convencer -- sem sucesso -- de que sua campanha é competitiva.
"O ataque coloca uma pressão muito grande nos democratas para decidir o que querem. A equipe do Biden está jogando com o tempo. Sabe que está claro que há nenhuma ação no curto prazo que reverta as condições ruins deles", diz. "Mas se passar muito tempo faltará opção ao partido para substitui-lo."
Para o professor, o movimento anti-Biden está crescendo. "Vimos a executiva do partido discutir o procedimento de como eleger uma nova pessoa caso Biden saia, por exemplo", diz Moura.
Há uma data-chave nesse cronograma do democrata: 7 de agosto. "Esse é o dia em que são disponibilizados os nomes de candidatos a presidente e vice para os delegados, antes da convenção. Assim, se ele desistir antes disso, haveria tempo para apresentar mais nomes para a escolha dos delegados", afirma.
A atual vice-presidente, Kamala Harris, desponta como principal candidata para substituir Biden, embora seu desempenho nas pesquisas não seja muito melhor que o do atual mandatário.
Com o atentado, dois cenários se desenham para o atual presidente. Em primeiro lugar, Biden deixa de ser, de imediato, o tema. Sua idade e a discussão sobre suas faculdades mentais não estampam mais as manchetes diariamente. "Na prática, a campanha de Biden tirou todas as propagandas anti-Trump", diz.
Ao mesmo tempo, a pressão, sobretudo nos bastidores, cresce significativamente. "Vai aumentar a pressão, porque o Trump ficou mais favorito. Especialmente nos bastidores", afirma.
Moura descreve que essa pressão vem de vários lado. Como membro da ala moderada dos democratas, Biden já recebeu chamados públicos de expoentes de seu grupo, como a ex-presidente da Câmara, Nancy Pelosi.
"Não está sofrendo pressão da ala mais à esquerda do partido democrata. Ao mesmo tempo, essa ala quer que ele incorpore mais políticas da esquerda", afirma. "Ou seja, é uma pressão política de dois lados: dos moderados, para sair, e da esquerda, para incorporar sua agenda."
Além disso, há intimidações dos doares. Segundo New York Times, alguns dos principais doadores de Biden disseram ao maior super grupo de financiadores pró-Biden, chamado Future Forward, que decidiram congelar cerca de US$ 90 milhões em doações prometidas se o presidente dos EUA, Joe Biden, mantiver sua candidatura.
Um caso foi emblemático foi o do ator George Clooney. "Ele é muito importante, mais pela capacidade de mobilização financeira do que pela contribuição que faz", afirma Moura.
Além disso, quase 20 membros democratas do Congresso pediram ao presidente que deixasse a corrida eleitoral imediatamente. Some-se, ainda, o constrangimento da imprensa. "No círculo democrata, a pressão da imprensa é muito mais forte do que entre os republicanos. Bate muito forte", diz.
Por fim, Moura avalia que a campanha de Biden está fazendo uma aposta que não deixa margem para erros. Em sua análise, há seis estados que definirão a campanha, os chamados swing states: Geórgia, Nevada, Arizona, Wisconsin, Michigan e Pensilvânia.
"As pesquisas mostram que Trump lidera acima da margem de erro na Geórgia, Nevada e Arizona. No Blue Wall - Wisconsin, Michigan e Pensilvânia -, estão empatados", diz. "Ou seja, ele precisa ganhar nos três estados que estão empatados, dado que os outros parecem favoráveis a Trump. Não há margem para erro."
Para Moura, a comparação entre o atentado a Trump e o sofrido pelo ex-presidente do Brasil Jair Bolsonaro durante sua campanha de 2018 não guardam correlação -- ao contrário de uma narrativa que se alastra nas redes sociais.
"Não tem nada a ver o contexto do Bolsonaro com esse. O Bolsonaro era um outsider, que nunca tinha governado", diz. "Nos EUA, existe uma história de atentados a presidente. Não é algo novo na política americana."
Além disso, lembra, Bolsonaro teve risco de vida iminente e ficou praticamente fora da disputa. "Não vai acontecer o mesmo com Trump", afirma. "As eleições dos EUA também estão muito distantes. No caso do brasil foi mais próximo. Muita gente decretou a vitória do Trump, na comparação com Bolsonaro. Mas essa é uma análise superficial."