Jovem egípcio caminha ao lado de um retrato do presidente deposto do país, Mohamed Mursi: "redes se preocupam mais em comunicar os pontos de vista de seus sócios capitalistas do que em informar de maneira profissional e objetiva", afirma analista (Fayez Nureldine/AFP)
Da Redação
Publicado em 23 de julho de 2013 às 11h03.
Dubai - A cobertura da derrubada do presidente egípcio, Mohamed Mursi, compromete a credibilidade das duas grandes redes de televisão via satélite árabes, a saudita Al-Arabiya e a catariana Al-Jazeera, já que ambas refletem a postura dos países que as financiam sem se preocupar com a objetividade.
"As duas redes se preocupam mais em comunicar os pontos de vista de seus sócios capitalistas do que em informar de maneira profissional e objetiva", considera o analista saudita Abdalah Shamry.
A Al-Jazeera, do Catar, e a Al-Arabiya, que recebe capital saudita, já deixaram claras as suas diferenças com uma cobertura da Primavera Árabe ligada às posturas de seus respectivos governos e "polarizaram o panorama midiático árabe", explica.
O contraste ficou claro com a cobertura das manifestações que levaram à deposição de Mohamed Mursi, da Irmandade Muçulmana, pelo Exército no dia 3 de julho.
"A Al-Jazeera e a Al Arabiya fazem a cobertura destes acontecimientos de duas maneiras diametralmente opostas", considera Mohamed El Oifi, especialista em imprensa árabe na Universidade de Sorbonne de Paris.
Enquanto a Al-Arabiya transmitiu ao vivo os protestos dos críticos a Mursi na Praça Tahrir, no Cairo, a Al-Jazeera dividiu sua tela em duas para mostrar a famosa praça cairota e um segundo local da capital egípcia onde haviam se reunido os partidários do presidente islamita.
A rede catariana chama de "golpe de Estado contra a legitimidade" a derrubada de Mursi. Já a saudita fala de "segunda revolução".
A Arábia Saudita manteve uma tensa relação com os novos governos no Egito e na Tunísia, dominados pelos islamitas, enquanto o Catar os apoiou ativamente.
Para Oifi, a cobertura da Al-Arabiya "é o reflexo fiel" da posição da Arábia Saudita, cujo rei foi o primeiro chefe de Estado estrangeiro a felicitar o presidente interino Adly Mansour, que substituiu Mursi.
Mas a Al-Jazeera "adotou uma posição mais hostil aos acontecimentos de 30 de junho do que o Estado do Catar que parece ter aceitado, mais ou menos, a queda de Mursi", acrescentou.
Com sua cobertura dos acontecimentos no Egito, as duas redes estão "perdendo sua credibilidade" em favor de outros novos canais em língua árabe, como a France24, a BBC ou a SkyNews, explica Shamry.
A situação se repetiu vários dias depois, quando 53 partidários do presidente deposto foram assassinados diante da sede da Guarda Republicana. A Al-Arabiya deu prioridade às declarações do Exército e a Al-Jazeera divulgou ao vivo uma entrevista coletiva à imprensa da Irmandade Muçulmana, enquanto exibia imagens de manifestantes mortos.
"As duas redes ofereceram uma cobertura completa dos fatos", assegura, no entanto, o acadêmico kuwaitiano Saad al-Akhmi.
"A diferença está na escolha das palavras que refletem as posições políticas" de cada uma, acrescenta este ex-ministro da Informação que considera que o ângulo utilizado para captar as imagens "refletiam claramente as tentativas de aumentar o número de manifestantes tanto de um lado como de outro".
Na internet, os telespectadores criticaram fortemente os dois canais.
No Twitter, o hashtag "#Tuitem como se fossem a Al Arabiya" foi utilizado para brincar com a rede, enquanto que no Facebook um grupo com mais de 6.000 membros acusa a Al-Jazeera de "semear a divisão entre os egípcios".
Segundo Akhmi, a concorrência entre a Al Arabiya e a Al-Jazeera é saudável. "Sua cobertura distinta dos acontecimentos beneficia o público. Seria injusto para o telespectador árabe ter apenas um ponto de vista", disse.