Primeiro ministro Narendra Modi visita região de Ladakh: região vive disputa entre os países (Bureau/Handout/Reuters)
Victor Sena
Publicado em 4 de julho de 2020 às 13h42.
Última atualização em 4 de julho de 2020 às 14h58.
A disputa entre militares da Índia e da China, os dois países mais populosos do mundo, escalou nos últimos dias. Reportagem do diário South China Morning Post, de Hong Kong, mostra que outro vizinho, o Paquistão, pode se envolver no conflito. Resultado: três países que juntos somam 3 bilhões de habitantes, e um amplo arsenal de armas nucleares, podem entrar em guerra. A possibilidade, embora remota, amplia ainda mais a guerra fria entre a China e outra potência, os Estados Unidos.
O conflito se dá no extremo nordeste da Índia, na região da Caxemira, perto das montanhas do Himalaia. Nas últimas semanas, tropas chinesas se concentraram de seu lado da fronteira, numa sinalização de que Xi Jinping quer no mínimo ampliar sua presença na região. Em 15 de junho, militares dos dois países protagonizaram uma batalha corpo a corpo que deixou 20 indianos e um desconhecido número de chineses mortos, no primeiro confronto entre os dois países em 45 anos. Um cessar-fogo impede trocas de tiros entre os dois países desde 1962, o que ajuda a explicar a inusitada batalha corporal.
Ontem, o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, visitou uma base militar em Ladack, a região em disputa. Estava acompanhado do chefe do estado-maior do Exército, numa incursão pensada para mostrar força. Como parte de uma campanha de boicote a produtos chineses, Nova Délhi anunciou na segunda-feira a proibição de 59 aplicativos chineses (como TikTok, Weibo, WeChat e CamScanner) na Índia em nome da segurança nacional.
Segundo o South China Morning Post, o confronto atraiu a atenção do Paquistão. Os paquistaneses e indianos vivem em pé de guerra desde a saída britânica da região, e debatem a divisão de fronteiras rotineiramente. A fronteira entre os dois países na Caxemira foi decidia pela ONU, em 1949. Em fevereiro de 2019, a Índia lançou um ataque aéreo contra um campo de treinamento de militanes paquistaneses, e anexou uma parte da Caxemira em agosto. Desde então, vivem no mais acirrado clima de conflito desde sua última guerra, em 1999.
No fim de junho, o que estava ruim ficou pior. Os dois países expulsaram diplomatas de seus territórios depois de acusarem um ao outro de espionagem, além de detenção e tortura de seus diplomatas. O chanceler indiano ainda acusou os paquistaneses de financiarem atividades terroristas. A disputa tem lances surreais. Em maio a polícia indiana libertou um pombo que pertencia a um pescador paquistanês depois de uma investigação não comprovar que a ave estivesse envolvida em espionagem.
"Acredito que um conflito é uma possibilidade real", disse ao diário de Hong Kong Harsh Pant, professor de relações internacionais do King's College, em Londres. Rabia Akhtar, membro do conselho consultivo do governo paquistanês, outro especialista ouvido, disse que a Índia pode estar se preparando para uma guerra em duas frentes, mas que não há evidência que Paquistão e China se preparem para um ataque.
Em uma conferência de imprensa na semana passada, o major paquistanês Athar Abbas disse que seu país não tem intenção de se unir à China contra a Índia porque um conflito na Caxemira certamente escalaria para uma guerra mais ampla envolvendo potências como os Estados Unidos. No fim de junho, Índia e Japão realizaram exercícios militares conjuntos, num indicativo que podem estar unindo forças contra um inimigo em comum, a China.
O instituto de pesquisas Sipri, da Suécia, calcula que a China tem 320 armas nucleares, que o Paquistão tem 160 e que a Índia tem 150. São 630 motivos para os três países evitarem um conflito.