Michelle Bachelet: não há indicação de que o país sairá da Aliança do Pacífico, um bloco comercial estimulado por Piñera, que também inclui México, Colômbia e Peru (MARTIN BERNETTI/AFP)
Da Redação
Publicado em 16 de dezembro de 2013 às 13h21.
Santiago - O Chile, sob a administração da sua próxima presidente, a política de centro-esquerda Michelle Bachelet, deve dar menos prioridade às relações com os governos mais conservadores da América Latina e se aproximar mais do Brasil e de outros países mais à esquerda na região.
A ex-presidente Bachelet vai reassumir o poder em março, substituindo o atual presidente chileno, Sebastián Piñera, de centro-direita, depois de ter vencido a candidata governista, Evelyn Matthei, nas eleições deste domingo.
O Chile não deve fazer mudanças radicais sob Bachelet. O país terá que lidar com os desdobramentos da decisão, prevista para 2014, da Corte Internacional de Justiça em Haia sobre uma disputa marítima com o vizinho Peru.
No entanto, não há indicação de que o país sairá da Aliança do Pacífico, um bloco comercial estimulado por Piñera, que também inclui México, Colômbia e Peru, países mais orientados para a economia de mercado.
A preocupação do lado de Bachelet é que o Chile construiu esses laços em detrimento das relações com governos mais à esquerda, especialmente o peso-pesado regional Brasil e a vizinha Argentina.
Isso é algo que Bachelet quer resolver.
"Valorizamos os esforços para a integração da Aliança do Pacífico, mas vamos assegurar que a nossa participação no bloco não vá de encontro a outros projetos de integração na região", diz o manifesto de campanha de Bachelet.
"O Chile diminuiu a sua presença na região, e as relações com os seus vizinhos são problemáticas. Uma visão comercial foi imposta sobre nossos laços na América Latina." Bachelet tem semelhanças com a presidente Dilma Rousseff. As duas iniciaram na política como opositoras de ditaduras repressivas.
As duas deram uma guinada para o centro quando no poder, e o principal desafio dos governos dos dois países é lidar com as exigências de uma classe média crescente, em meio a economias baseadas em commodities e que crescem em ritmo lento.
Em mensagem no Twitter nesta segunda, em que parabenizou a presidente eleita, Dilma indicou que a mudança no governo vai ampliar as relações entre os dois países.
"Estou certa que o meu governo e o de Michelle Bachelet irão aprofundar ainda mais as relações entre nossos países. Brasil e Chile têm muito a cooperar e a construir juntos. Temos uma compreensão clara do papel da integração da América do Sul", disse.
Dois campos?
Bachelet quer evitar divisões na América do Sul, disse Michael Shifter, chefe do Inter-American Dialogue, um centro de análises.
"Acho que podermos esperar uma tentativa de Bachelet de aprofundar a relação com o Brasil de Dilma e certamente evitar a sensação de que o Chile está num campo, e o Brasil está em outro campo", afirmou.
Os comentários do analistas estão afinados com uma reunião que ex-presidentes tiveram em Santiago no mês passado, quando o ex-mandatário brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-líder do Chile Ricardo Lagos fizeram um chamado para uma integração mais profunda.
Segundo Lagos, é importante evitar um sentimento de que a América do Sul está dividida em duas, com os países mais à esquerda banhados pelo Atlântico, como Brasil, Argentina e Venezuela, num campo, e países mais orientados para o mercado e banhados pelo Pacífico, como Chile, Peru e Colômbia, no outro.
Ele comparou tal divisão ao Tratado de Tordesilhas, que séculos atrás dividiu terras entre Portugal e Espanha.
"Acho que é muito importante que quando falamos de um entendimento com o Pacífico que a voz do Brasil esteja lá", declarou Lagos. Como presidente, ele nomeou Bachelet ministra, abrindo o caminho para ela ganhar as eleições e governar entre 2006 e 2010.
Bachelet também vai querer melhorar as atualmente frias relações com os governos mais esquerdistas de Argentina e Bolívia, dizem os analistas.
No entanto, tais movimentos podem não ter consistência, segundo o professor de ciência política Peter Siavelis.
"Talvez, de forma cosmética, ela terá relações mais amigáveis com governos de esquerda da América Latina, mas sem interferir no central da política externa chilena, que é promoção comercial", disse.
O Chile também está em discussão com outros países do Pacífico para criar a Parceria Transpacífica, um pacto comercial. Um acordo final ainda não foi alcançado.
Disputa marítima
Em janeiro próximo, o Chile também entra por um período de dois anos no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).
No entanto, o maior desafio do país em política externa no próximo governo serão as relações com o vizinho do norte, o Peru.
A decisão de Haia sobre a disputa entre Peru e Chile sobre fronteira marítima deve sair em janeiro. Os dois países se comprometeram a respeitar o resultado da Corte Internacional de Justiça, mas deve afetar as relações bilaterais, especialmente se houver insatisfação popular.
"Lidar com isso vai ser um teste para a liderança dos dois países", disse Shifter. "É algo complicado para a relação biltareal, e certamente não vai ajudar a Aliança do Pacífico."