Ativistas chilenos protestam no centro de Santiago: jovens querem mais investimento em educação pública (Martin Bernetti/AFP)
Da Redação
Publicado em 27 de outubro de 2011 às 16h50.
Santiago - Os estudantes chilenos completam seis meses de protestos com poucos resultados concretos a ostentar em sua luta por melhor educação pública, mas o balanço tampouco foi bom para o presidente Sebastián Piñera, que cedeu pouco e com isso pagou caro em popularidade e credibilidade.
O movimento estudantil fez seu primeiro protesto em 28 de abril e, desde então, organizou 40 passeatas para pedir uma educação pública gratuita e de qualidade, em um movimento que deu grande popularidade a seus líderes - particularmente Camila Vallejo e Giorgio Jackson - e que mobilizou a cidadania.
No entanto, segundo analistas, os avanços concretos foram pequenos. Até agora, o governo enviou ao Congresso dois projetos de lei para diminuir a taxa de juros dos créditos estudantis e permitir a renegociação de 110 mil créditos atrasados.
Também se comprometeu a dar bolsas para 40% dos estudantes mais vulneráveis e criar uma superintendência de fiscalização para garantir que as universidades particulares não obtenham lucro. Por lei, as universidades no Chile são consideradas entidades sem fins lucrativos.
Mas não há mudança radical do modelo atual, no qual não há universidades gratuitas e em que só 40% dos colegiais frequentam escolas públicas grátis que são de qualidade inferior às pagas.
A demanda de acabar com o sistema educacional herdado da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) tem o apoio da população, sobretudo na classe média, a mais afetada por um sistema que estimula o endividamento para financiar os estudos.
São os integrantes desta classe que têm acompanhado os estudantes em suas marchas, algumas delas as mais multitudinárias das últimas duas décadas e que na maioria terminou em distúrbios violentos.
"Os protestos fizeram com que os chilenos se preocupassem mais com a qualidade de educação que seus filhos recebem. Este é um bom resultado do movimento. Um país preocupado com a qualidade da educação que seus filhos recebem é um país que tem suas prioridades bem colocadas", disse à AFP o cientista político Patricio Navia, da Universidade Diego Portales.
"O problema é que o governo, ao invés de aceitar que se volte a discutir o modelo, até hoje não fez mais do que se refugiar em suas convicções ideológicas e responder com firmeza que o próprio modelo poderá ser revisto e reeditado, mas que sua essência de mercado, lucro e concorrência permanecerá inalterada", disse à AFP o especialista em educação Mario Waissbluth.
Devido a esta posição, o apoio ao presidente desabou em um ano 63% para 22%, o índice mais baixo desde a volta à democracia, após a ditadura.
Os maciços protestos de rua, quase semanais, dominaram a agenda pública desde o fim de abril, ofuscando as reformas sociais revolucionárias aplicadas por Piñera, como a ampliação da licença maternidade para seis meses e a eliminação de um desconto nas aposentadorias.
Os dois projetos, longamente aguardados pelos setores mais pobres, fazem parte de uma série de realizações com as quais Piñera pretendia coroar o segundo de seus quatro anos de governo.
"O governo não conseguiu avançar em outros temas de sua agenda e parece preso ao conflito. Supunha-se que o grande ano das realizações e prioridades do governo tinha que ser 2011, mas este foi um ano dominado pelo conflito estudantil", avaliou Navia.
"É um ano perdido para o governo, com níveis de aprovação mínimos, apesar de ter feito as coisas bem no âmbito das políticas sociais", emendou o analista Maurício Morales, também da Universidade Diego Portales.
O problema, explicou Morales, é que "estas políticas, dirigidas aos setores mais desprotegidos, não produziram os efeitos esperados e se mantém a ideia de que este governo é dos empresários, de uma elite e que a desigualdade se mantém", acrescentou.
A falta de concessões aos estudantes aumenta a percepção negativa de Piñera, um empresário multimilionário que defende a iniciativa privada.
"Piñera é um presidente que está extremamente frustrado porque se deu conta de que fazer política não é tão fácil quanto fazer negócios", resumiu Morales.