Agência de notícias
Publicado em 27 de setembro de 2024 às 07h35.
Última atualização em 27 de setembro de 2024 às 07h38.
Na véspera de representar o Brasil em uma reunião na qual será apresentada a um grupo de cerca de 15 países a proposta de paz para a guerra entre Rússia e Ucrânia elaborada junto à China, o assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, mostrou-se otimista, destacou o que enxerga como o papel do Brasil como “líder do Sul Global”, e disse que a rejeição do presidente ucraniano,Volodymyr Zelensky, à iniciativa “não a afeta em nada. Não é desprezo, mas é preciso ver a realidade”. Amorim considera que tanto na Assembleia Geral da ONU como em todas as reuniões paralelas realizadas em Nova York, o Brasil “mostrou ser uma referência”.
Sua afirmação contrasta com a de fontes de governos estrangeiros, analistas e diplomatas, entre eles o ex-subsecretário do Departamento de Estado para o Hemisfério Ocidental, Thomas Shannon, que considerou a proposta sino-brasileira “utópica”, e vê o Brasil como uma “potência média, que poderia ter um papel de mediador entre grandes potências e o mundo”. Perguntado sobre lideranças do Sul Global, Shannon afirmou que “este grupo é tão diverso que não pode ser liderado, apenas organizado”.
O encontro de hoje encerrará uma semana na qual o governo Lula buscou ocupar um espaço de destaque na ONU e nos eventos paralelos realizados em Nova York. O de hoje é um dos mais importantes para o Brasil, e o que deu mais destaque a Lula na imprensa internacional. Esse destaque foi conseguido graças à fala de Zelensky sobre a proposta sino-brasileira, em seu discurso na Assembleia Geral:
"Quando alguns propõem alternativas, planos de acordo pouco entusiasmados, isso não apenas ignora os interesses e o sofrimento dos ucranianos, não apenas ignora a realidade, mas também dá ao [presidente da Rússia, Vladimir] Putin o espaço político para continuar a guerra".
O professor Andrés Malamud, da Universidade de Lisboa, analisou a repercussão dos debates na ONU na mídia internacional e diz que “ao atacar a proposta de Brasil e China, Zelensky acabou dando mais relevância ao presidente brasileiro”. Fontes do governo Lula concordaram que a fala do presidente ucraniano “acabou favorecendo a divulgação da proposta de China e Brasil”.
"Lula não é mais novidade", aponta Malamud.
Fontes de governos europeus concordaram que “o discurso de Lula na Assembleia Geral não surpreendeu”. A percepção dentro do governo Lula é diferente. O presidente, seus assessores e ministros, asseguraram fontes oficiais, foram intensamente procurados por representantes de governos estrangeiros. Os europeus, disseram as mesmas fontes, “estão interessados na proposta sino-brasileira”.
As mesmas fontes apontaram que “o importante não é falar em lideranças. Aqui o importante é impedir que duas guerras se tornem guerras mundiais”.
"Nada contra Zelensky, mas o caminho que ele escolheu chegou num beco sem saída", frisa Amorim.
Para Shannon, “se alinhar com a China nesta iniciativa não ajuda. Europa e Estados Unidos não vão aceitar”. Mas o governo Lula chegou a Nova York convencido de que o documento intitulado “Entendimentos Comuns entre a China e o Brasil sobre a Solução Política da Crise na Ucrânia” é um caminho possível.
A expectativa é de que seja divulgado um comunicado após o encontro, no qual os países convidados respaldem a iniciativa. No texto, disseram as fontes consultadas, não se “condenará ninguém”, o que para diplomatas veteranos como Shannon significa “premiar os russos”.
O governo brasileiro nega ter uma posição “pró-russa” no conflito, e as mesmas fontes confirmaram que tanto russos como ucranianos se queixaram por não terem sido consultados sobre a organização do encontro — do qual não participarão.
Será o encerramento de uma semana intensa em matéria de política externa, com críticas de Lula a Zelensky e ao primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. O Brasil segue buscando um espaço de liderança global , mas há controvérsias sobre as chances de alcançar esse objetivo.