A cadeira do demissionário presidente da FIFA, Joseph Blatter, na sede da instituição, em Zurique (VALERIANO DI DOMENICO/AFP)
Da Redação
Publicado em 3 de junho de 2015 às 20h51.
Zurique - A renúncia anunciada na terça-feira por Joseph Blatter, que segundo vários meios de comunicação estaria sendo investigado pela justiça americana, deixa a FIFA sem o seu presidente dos últimos 17 anos, mas ainda restam muitas coisas por resolver, incluindo seu sucessor.
Blatter, de 79 anos, quase 40 deles dentro da FIFA, renunciou na terça-feira, apenas quatro dias depois de ter sido reeleito para o quinto período à frente da entidade, alegando que o "mandato não conta com o apoio de todo o mundo do futebol".
Segundo a imprensa americana, Blatter, cujo sucessor não será conhecido antes de um congresso extraordinário que deve acontecer entre dezembro de 2015 e março de 2016, em Zurique, está sendo investigado pela justiça dos Estados Unidos.
Para o jornal New York Times, Blatter "tentava há vários dias se distanciar do escândalo", mas as autoridades "esperam obter a cooperação de alguns dirigentes da FIFA indiciados" por corrupção para fechar o cerco ao suíço.
O canal ABC News informou sobre uma investigação do FBI a respeito de Blatter, com base em fontes anônimas das forças de segurança, assim como fontes ligadas ao processo, mas sem revelar detalhes.
Nesta quarta-feira, a Interpol emitiu, a pedido das autoridades americanas, seis pedidos de detenção para extradição, incluindo para dois ex-dirigentes da FIFA: o trinitino Jack Warner, ex-vice-presidente da entidade, e o paraguaio Nicolás Leoz, ex-integrante do comitê executivo.
Warner, que foi presidente da Concacaf, foi detido durante 24 horas depois que se apresentou de maneira voluntária na semana passada à polícia de Trinidad e Tobago. O ex-dirigente da FIFA foi liberado depois de pagar fiança de 400.000 dólares.
O paraguaio Nicolás Leoz, que também foi presidente da Conmebol, está em prisão domiciliar desde segunda-feira em seu país.
Quatro executivos de empresas de marketing esportivo também estão na lista, incluindo o brasileiro José Margulies, diretor da empresa Valente Corp. e Somerton Ltd.
Abalada há vários anos por escândalos e suspeitas de corrupção, a entidade se viu particularmente fragilizada com a revelação de terça-feira do New York Times sobre o envolvimento do francês Jérôme Valcke, secretário-geral e braço direito de Blatter, em uma transferência de 10 milhões de dólares para contas administradas por Warner, já indiciado pela justiça americana.
O ministro dos Esportes da África do Sul, Fikile Mbalula, defendeu nesta quarta-feira a "legalidade" dos 10 milhões de dólares pagos ao futebol caribenho, que a justiça americana considera como um suborno para conseguir a sede da Copa do Mundo de 2010.
Segundo o ministro, a quantia paga ao futebol caribenho estava destinada a associações locais e era parte do projeto sul-africano de transformar a Copa do Mundo de 2010 em um motivo de orgulho para a África e todos os africanos, incluindo a diáspora.
Já o próprio Valcke garantiu em entrevista à rádio France Info que "não tem culpa" no escândalo, e afirmou que pretende permanecer no cargo até a eleição do novo presidente.
Quem admitiu a culpa foi o americano Chuck Blazer, principal delator do esquema de corrupção da FIFA.
O ex-membro do comitê executivo da entidade confessou ter recebido, com outros dirigentes, propinas nos processos de escolha das sedes das Copas do Mundo de 1998 e 2010, de acordo com a súmula de uma audiência de novembro de 2013, divulgada nesta quarta-feira.
Persona non grata
Após a renúncia, Blatter recebeu a primeira estocada: os organizadores do Mundial Sub-20 na Nova Zelândia, uma competição da FIFA, afirmaram que não desejam a presença do suíço, que deveria assistir a final do evento em 20 de junho.
A queda de Blatter foi comemorada pela imprensa e por vários dirigentes do futebol mundial.
Na terça-feira, o presidente da Uefa, Michel Platini, chamou a renúncia de "boa decisão". Seu antecessor, o sueco Lennart Johansson, candidato que perdeu a eleição para Blatter em 1998, foi mais longe ao afirmar que era "inteligente de sua parte".
"É uma excelente notícia", declarou o presidente da Federação Inglesa, Greg Dyke. A imprensa britânica também celebrou a renúncia.
A Comissão Europeia pediu uma "mudança fundamental" na FIFA, ao considerar que a renúncia de Blatter representa apenas "uma etapa em um longo processo que deve continuar para restabelecer a confiança".
"Boa notícia", afirmou o holandês Michael Van Praag, que desistiu da eleição da sexta-feira passada, na qual Blatter conquistou o quinto mandato e teve como rival apenas o príncipe jordaniano Ali Bin Hussein.
A assessoria do jordaniano afirmou que ele está "disposto a assumir a presidência da FIFA a qualquer momento, se for solicitado".
O ídolo brasileiro Zico e o sul-coreano Chung Mong-Joon, ex-vice-presidente da FIFA, também cogitam disputar a eleição.
Confiança perdida
Os europeus também terão algo a dizer, especialmente o presidente da Uefa, o francês Michel Platini, de 59 anos, que anunciou o adiamento de uma reunião da entidade prevista para sábado em Berlim, onde os dirigentes do continente deveriam definir suas relações futuras com a FIFA.
"Novas informações aparecem a cada dia e é razoável tomar um pouco de distância antes de uma posição conjunta sobre o tema", afirmou o presidente da Uefa em um comunicado.
Independente dos nomes, os candidatos terão uma tarefa gigantesca para tentar restabelecer a imagem da entidade.
Vários patrocinadores da FIFA - Coca-Cola, Adidas, Visa, McDonald's e Hyundai - concordaram que a saída de Blatter é um passo na direção para restaurar a confiança perdida.
Os processos judiciais prosseguem e as autoridades suíças continuam com a investigação sobre o processo de escolha das sedes dos Mundiais de 2018 (Rússia) e 2022 (Catar).
Na semana passada, no início do furacão, a FIFA insistiu que as duas Copas acontecerão nos dois países nas datas previstas.
Mas Jack Warner e Nicolás Leoz participaram na votação de 2010 que designou os dois países e a pressão é cada vez maior a respeito da Copa do Mundo no Catar.
O governo da Rússia afirmou nesta quarta-feira que prossegue com os preparativos para o Mundial de 2018, enquanto o Catar alega não ter nada a esconder sobre as condições da escolha como sede da Copa de 2022.