Mujica: principal nome da política uruguaia nos últimos anos continuou a aparecer em inúmeros eventos apesar da aposentadoria (Antony Jones/Getty Images)
EFE
Publicado em 24 de outubro de 2019 às 18h32.
Montevidéu — José "Pepe" Mujica, o ex-presidente do Uruguai que se transformou em um dos políticos mais influentes da América do Sul neste século e que no ano passado, alegando cansaço, havia anunciado a aposentadoria e renunciado ao mandato de senador que ocupava desde 2015, parece ter encontrado fôlego extra aos 84 anos e tentará retomar o posto nas eleições deste domingo.
O ex-guerrilheiro, ex-deputado, e ex-presidente uruguaio pretende voltar ao Parlamento para ajudar na renovação de uma esquerda uruguaia carente de líderes de grande expressão como ele mesmo.
Em agosto de 2018, Mujica, que presidiu o país entre 2010 e 2015, anunciou para surpresa de muitos que deixaria o Senado para "tirar uma licença antes de morrer de velho".
No entanto, o principal nome da política uruguaia em nível internacional nos últimos anos continuou a aparecer em inúmeros eventos e a fazer parte da vida pública nacional.
Segundo o analista político e pesquisador do Instituto de Ciência Política da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade da República, Daniel Chasquetti, é "muito difícil" que no Uruguai surja em pouco tempo uma figura com tanto alcance internacional como Mujica, o que ajuda a explicar seu retorno.
"Acredito que Mujica chegou no momento certo. Começava uma crise política das lideranças, ainda não havia nada parecido com (Donald) Trump, nem (Emmanuel) Macron, nem (Jair) Bolsonaro. Havia uma crise muito grande dos partidos, da representação", disse Chasquetti à Agência Efe.
O analista político considera que Mujica propôs "tornar as coisas mais simples", e isso o fez ter notoriedade em nível internacional.
"O personagem e as demandas se ajustaram, e isso é difícil de acontecer. Hoje o estado no qual está o mundo está exigindo outro tipo de liderança", opinou.
Além disso, Chasquetti afirmou que é muito complicado que no Uruguai volte a surgir, no poder, alguém parecido com o ex-guerrilheiro.
"Mujica tinha uma economia em crescimento, uma (coalizão) Frente Ampla muito forte, um cenário muito propício. Conseguiu, com muita sabedoria, avançar na agenda de direitos, pôs o Uruguai na vanguarda no mundo, mas em um contexto diferente. Hoje, o cenário mudou", enfatizou.
A liderança de Mujica transcendeu as fronteiras de tal maneira que fez com que muitas pessoas reconhecidas internacionalmente - artistas, políticos, atletas e pensadores - quisessem passar por seu sítio, nos arredores de Montevidéu, simplesmente para conversar um pouco e tomar um mate com ele.
Para Chasquetti, a aposentadoria de Mujica nunca aconteceu - "ele nunca saiu da política, só ao posto", disse.
"Mujica ainda tem um nicho de eleitorado relevante, e quando saiu para fazer campanha, isso se notou. Há muita gente que é muito fiel a ele, mas agora não há mais esse fator novidade que pesou na campanha de 2009", comentou.
No entanto, para o analista, o fato de Pepe Mujica ter entrado de cabeça na campanha ajudou a atrair uma grande quantidade de votos para a coalizão governista, a Frente Ampla (FA).
A ala de Mujica na FA, o Movimento de Participação Popular 609 (MPP), o incentivou a liderar, mais uma vez, uma lista de candidaturas ao Senado.
Mujica não será o único líder da velha-guarda frenteamplista que concorrerá nas eleições, já que a vice-presidente do Uruguai - e sua esposa -, Lucía Topolansky, também disputará um posto no Senado.
Para o deputado Alejandro Sánchez, também do MPP, a ideia da coligação é que o ex-presidente possa colaborar com o processo de renovação da Frente Ampla.
"É verdade que ele anunciou a aposentadoria, mas o MPP parte de uma ideia, e conseguimos convencer Pepe, que é um dos dirigentes políticos que mais trabalhou para gerar espaços de renovação", contou.
Para o político, a renovação não só representa uma troca de gerações, mas uma forma de "construir novas ideias" sem perder o elo com os veteranos.
"Uma das coisas que dissemos a Pepe é que precisávamos que ele continuasse por causa do seu conhecimento, sua capacidade, pela popularidade que tem, mas também por sua visão de futuro", disse.