Jovens são treinados em Alepo: "Os jovens se apresentam espontaneamente, motivados por suas famílias". (©afp.com / JM López)
Da Redação
Publicado em 6 de fevereiro de 2013 às 13h19.
"Aqui eles entram crianças, mas saem transformados em máquinas de matar", afirma sem rodeios Abdul Rasah, um sargento desertor, responsável pelo treinamento de um grupo de cerca de vinte adolescentes de 14 a 18 anos que, em breve e com a autorização dos pais, se somarão às fileiras de rebeldes sírios que combatem o exército de Bashar al Assad.
"Aqui desde pequenos já estão empunhando armas de brinquedo... e, quando estão um pouco maiores, os próprios pais os ensinam a utilizá-las de verdade. Aqui não é Ocidente, aqui não se brinca de guerra… Aqui a guerra está a 10 quilômetros ", afirma o instrutor, apontando para o aeroporto de Menag (no norte), de onde é possível ouvir com nitidez os disparos de artilharia.
Seus alunos o veem com veneração e respeito absoluto.
"Moosab!", grita Rasah furioso, para que os demais escutem a repreensão. "Você deve matá-los... e não acariciar o peito!", repreendeu a um dos adolescentes. O jovem, de 14 anos, conseguiu desarmar seu inimigo, mas ao ter que fazer o gesto de que iria esfaqueá-lo, em vez de dar um soco no estômago, colocou a mão sobre o peito. Envergonhado, o menino agacha a cabeça.
Tlalin - "Estou muito orgulhoso de meu filho, sei que levará a bandeira do Islã com honra e se transformará em um bom soldado", defende o pai, Abu Kamel, que combate no Exército Sírio Livre (ESL), assim como seus nove irmãos e dez sobrinhos.
Moosab, que já tem um tímido bigode no rosto, sonha em acompanhá-los à guerra. "Se Alá permitir, lutarei em Damasco junto com meus primos", afirma o menino amante de futebol e torcedor do Real Madrid.
Sobeh, de 15 anos, é o mais veterano dos recrutas, com mais de 50 dias de instrução na academia da província de Aleppo.
"Vim porque meu pai e meus irmãos maiores estão combatendo no ESL e quero ir com eles. 'Me custou convencer meu pai, mas no final consegui e ele mesmo foi quem me trouxe", conta.
Bashar, de 16 anos, é o mais novato. Seus irmãos o inscreveram na academia. "Meu pai morreu lutando no ESL (...) e quero vingá-lo", afirma. O rapaz nunca esteve em um combate. "Mas já vi nos filmes e na televisão. Sei que não é um jogo e que morre gente… mesmo assim, é onde quero estar", destacou.
Já Mustafá, de 14 anos, parece menos convencido, mas repete as ordens que lhe deram os adultos: "Quero lutar pelo meu país e por minha família; e se tenho que dar minha vida, estou disposto a isso. Só Alá sabe meu futuro", declara.
"Os meninos são os melhores soldados que conheço. Você dá ordens e eles obedecem. Um adulto pode contestar uma ordem ou questionar. Em comparação, estes meninos não duvidam. São perfeitos soldados", afirma o ex-sargento Rasah.
Em seis meses, o instrutor de 38 anos já formou cerca de 500 meninos e adolescentes.
Muitos perecerão em combate e não verão o futuro que lhes espera a Síria, mas "virão outros a substituí-los", assegura.
A substituição é crucial: em 22 meses, a repressão e a guerra civil síria deixaram cerca de 60.000 mortos, segundo dados das Nações Unidas.
As organizações de defesa dos direitos humanos acusam com frequência tanto os rebeldes como as forças do regime de recrutar adolescentes para a guerra.
Uma das particularidades do conflito sírio é a implicação das famílias no alistamento de crianças, analisa Jean-Nicolas Beuze, responsável da Unicef para o Oriente Médio e África do Norte.
"Não há um recrutamento ativo de crianças como em outros conflitos. Os jovens se apresentam espontaneamente, motivados por suas famílias, apesar de os chefes dos grupos armados terem a obrigação de recusá-los, e quem não o faz incorre em uma grave violação dos direitos das crianças", disse Beuze à AFP.
Na internet são muitos os vídeos divulgados por meios internacionais ou por brigadas rebeldes que transformam as crianças em mascote, onde se vê meninos com kalashnikovs e, em outros casos, com um lança-foguetes maior que eles.
Os partidários do regime também difundem esse tipo de vídeo para desprestigiar seus inimigos, mas é difícil verificar a autenticidade.
Em um destes vídeos, particularmente atroz, é possível ver uma criança que decapita um homem com um machado. Os homens que o rodeiam, apresentados como rebeldes, o parabenizam, separam a cabeça do tronco e a deixam rolar diante de seu jovem algoz.