Netanyahu e Putin: a Rússia poderia usar sua relação para ajudar os dois países a se comunicarem, disse especialista em Geopolítica (Sergei Ilnitsky/Reuters)
AFP
Publicado em 10 de maio de 2018 às 15h53.
Em meio a uma escalada entre Irã e Israel, a Rússia pede diálogo e multiplica os contatos entre os dois países, com os quais mantém uma relação especial, fazendo o papel de intermediário.
"Para resumir, o Kremlin está sentado entre duas cadeiras", constata o analista russo Alexei Malachenko.
"É uma situação complicada e difícil para a Rússia, que tem laços com os dois inimigos", completou.
As tensões entre Irã e Israel aumentaram perigosamente na madrugada desta quinta-feira, quando o Exército israelense realizou dezenas de ataques aéreos contra alvos iranianos na Síria.
O Estado judeu afirmou que foi uma resposta a disparos iranianos contra a parte das Colinas de Golã ocupada por Israel.
O Kremlin expressou sua "preocupação" e disse esperar "contenção de todas as partes", apelando a ambos os países que resolvam suas divergências "exclusivamente por meio de canais diplomáticos".
Presente militarmente desde setembro de 2015 na Síria, a Rússia se estabeleceu como um ator importante no Oriente Médio.
"O papel da Rússia como mediadora é muito apreciado na região, e esse papel tende a crescer", se a crise entre Israel e Irã piorar, acredita Alexander Krylov, especialista em Relações Internacionais da universidade russa MGIMO.
"O valor agregado da Rússia no Oriente Médio é que ela mantém bons contatos com forças, com as quais outros atores em conflitos regionais se recusam a conversar: com o Hamas, o Hezbollah, o Irã, os curdos", explicou Krylov.
Moscou é, portanto, uma ponte entre o Estado judeu e Teerã, em desacordo há décadas.
Mesmo antes dos ataques, Vladimir Putin, que tomou posse na segunda-feira para um quarto mandato, recebeu o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu em Moscou na quarta-feira, pela segunda vez desde o início do ano.
O vice-ministro russo das Relações Exteriores, Sergei Ryabkov, esteve em Teerã nesta quinta-feira para discutir as consequências da saída dos Estados Unidos do acordo nuclear com o Irã e garantir, segundo Moscou, que os dois países manterão "estreita cooperação".
Em uma entrevista coletiva, o ministro russo das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, disse que Moscou alertou todas as partes contra "qualquer ação que se mostre provocadora", inclusive durante a visita de Netanyahu na quarta-feira.
Esta reunião, um dia antes dos bombardeios, "mostra que a Rússia pode desempenhar um papel de liderança", acredita Fyodor Lukyanov, especialista em Geopolítica.
"Moscou poderia usar sua relação de confiança com os dois países para ajudá-los a se comunicar e garantir que o confronto não exceda certos limites".
Mas se a Rússia acha "legítimas" as preocupações de segurança de Israel, considera o Irã "um parceiro indispensável em vários pontos, em particular no conflito sírio", lembra Lukyanov.
Há muito antagônicos, Rússia e Irã viram suas relações melhorarem com o fim da Guerra Fria. Enquanto Teerã era excluído internacionalmente, Moscou concordou em meados dos anos 1990 retomar o contrato para construir a usina nuclear iraniana de Bashhr (sul do Irã), abandonado pela Alemanha.
Na Síria, o Irã é, como Moscou, um aliado inflexível do regime de Bashar al-Assad. Juntamente com a Turquia, os dois países são os patrocinadores do processo de Astana, que diminuiu as tensões em solo sírio no ano passado, sem conseguir qualquer avanço real na solução política do conflito.
Para o especialista Alexei Malachenko, a Rússia fará todos os esforços para manter boas relações com Israel e Irã, especialmente porque os ataques israelenses "não ameaçam" a posição da Rússia na Síria.
Uma estratégia que tem seus limites, diz o especialista: "Mesmo com a melhor boa vontade do mundo, ninguém pode trazer o Irã e Israel para a mesma mesa".
"Se Israel desafiar o papel dominante da Rússia, Moscou reagiria e tomaria uma posição", ressalta Lukyanov.
"Mas é improvável que isso aconteça, porque Israel sabe que a Rússia é o poder que define as regras na Síria", completou.