Trump: decisões do novo presidente americano podem ser determinantes. (Drew Angerer/Getty Images)
Ana Laura Prado
Publicado em 15 de janeiro de 2017 às 08h25.
Última atualização em 15 de janeiro de 2017 às 08h25.
São Paulo – Deixando de lado todas as polêmicas envolvendo Donald Trump, uma coisa é certa: ele estará no comando do país mais poderoso do mundo.
Suas decisões serão determinantes e, quando se fala em relações internacionais, um passo em falso dos Estados Unidos pode ser desastroso.
Segundo uma pesquisa anual elaborada pelo Council on Foreign Relations (CFR), a possibilidade de crises internacionais deve ser uma preocupação para o país e, por tabela, para todo o mundo.
Veja a seguir os principais riscos mundiais que vão desafiar os EUA em 2017, assim como seus respectivos níveis de risco e de impacto.
Impacto: Alto; Probabilidade: Moderada
Em 2014, a intervenção russa na Ucrânia e a anexação do território da Crimeia pioraram sua já complicada relação com a Otan.
A aliança anunciou a suspensão de cooperações práticas com o país e, desde então, segue interferindo em questões de seu interesse – como a pressão sobre os países da Europa Oriental e o envolvimento na guerra da Síria.
O líder russo Vladimir Putin considera as interferências como provocações e chegou a acusar a Otan de instigar uma “frenética” corrida armamentista.
Em reação, o país tem reforçado sua capacidade nuclear e não demonstra a intenção de recuar frente as exigências da Aliança.
Impacto: Alto; Probabilidade: Moderada
A Coreia do Norte tem provocado tensão ao buscar fortalecer seu poder armamentista. Só no ano passado foram conduzidos dois testes nucleares e lançadas dezenas de foguetes.
O líder Kim Jong-Un faz questão de deixar claro seu principal objetivo: tornar o país uma ameaça ainda maior à potência norte-americana. A ameaça mais recente foi a de realizar o teste de um míssil balístico intercontinental a qualquer momento.
A postura rendeu reações do próprio Donald Trump, que afirmou que a Coreia do Norte não desenvolverá uma arma nuclear capaz de pôr em risco a segurança dos EUA.
Apesar do ceticismo do presidente eleito, o risco de uma crise envolvendo o país tem preocupado o mundo e já rendeu até mesmo reações da ONU.
Impacto: Alto; Probabilidade: Moderada
A ocorrência de um suposto ciberataque russo para interferir no resultado das eleições americanas tem sido alvo de investigações do setor de inteligência dos EUA.
A principal hipótese levantada é de que a Rússia teria prejudicado a campanha da candidata democrata Hilary Clinton. O país nega as acusações, que têm causado um mal-estar ainda maior entre as duas potências.
Apesar de negar que um ataque tenha favorecido sua vitória, Trump admite a existência de uma constante onda de tentativas de invasão cibernética por parte de outros países – inclusive da Rússia.
Por isso, o presidente eleito afirmou que pretende elaborar um plano para combater esse tipo de ataque após a sua posse.
Impacto: Alto; Probabilidade: Moderada
Os Estados Unidos vivem em constante alerta a ameaças terroristas desde o 11 de Setembro e, em 2016, o país registrou seu segundo maior atentado.
Em 12 de junho, um tiroteio em uma boate gay em Orlando deixou 50 mortos e 53 feridos. Foi o pior episódio envolvendo armas de fogo da história dos EUA.
Desde então, o país registrou outros ataques de menores proporções em diversos estados. Em geral, os crimes foram considerados isolados e, seus realizadores, indivíduos radicalizados que agiram por conta própria.
Enquanto isso, países como a França, Alemanha e Turquia sofreram com grandes ataques. A ameaça de atentados semelhantes no território americano, portanto, não é descartada para este ano.
Impacto: Moderado; Probabilidade: Alta
Em guerra desde 2001, o Afeganistão vive um cenário violento com as constantes ameaças do movimento talibã.
A situação é intensificada pelo fortalecimento do grupo terrorista Estado Islâmico (EI) no território. Segundo a ONU, a violência no país causou o deslocamento de mais de meio milhão de pessoas em 2016.
Sem perspectiva de acabar, a questão pode incluir novas tensões com uma possível aproximação da Rússia e do Irã com os insurgentes.
Impacto: Moderado; Probabilidade: Alta
A Turquia vive uma grande onda de violência desde julho de 2015, com a intensificação do conflito entre o governo e grupos separatistas curdos.
Principal braço do movimento, o Partido dos Trabalhadores Curdos (PKK) tem sido responsável por diversos atentados no território turco.
Após uma tentativa de golpe militar em julho do ano passado, o país vive uma intensa repressão por parte governo de Recep Tayyip Erdogan. Em um mês, mais de 35 mil pessoas foram detidas acusadas de envolvimento.
O parlamento do país encaminha, agora, uma tentativa de reforma constitucional que aumentaria significativamente o poder do governante.
Se aprovada, a medida pode gerar uma reação ainda maior por parte dos grupos opositores.
Impacto: Moderado; Probabilidade: Alta
Após tentativas frustradas de acordos, a guerra civil na Síria se arrasta há quase seis anos e continua deixando um rastro de destruição e mortes no país.
Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), o conflito no país deixou mais de 60 mil mortos apenas em 2016.
Um cessar-fogo foi estabelecido pela Rússia e Turquia em dezembro, mas o regime sírio segue bombardeando áreas dominadas pelos grupos rebeldes.
Novas negociações de paz devem acontecer no começo deste ano. Contudo, as constantes violações da trégua podem prejudicar o estabelecimento de um diálogo.
Com menores impactos ou probabilidades, outras 23 possibilidades de crise também são abordadas pelo relatório do Council on Foreign Relations (CFR).
A ocorrência de confrontos armados nos territórios marítimos da China, por exemplo, é considerada altamente impactante, mas com menores chances de acontecer.
Por outro lado, a muito provável piora na crise econômica na Venezuela deve ter um efeito pouco significativo nos Estados Unidos.
Apesar de terem ficado de fora do estudo, os desdobramentos do Brexit também podem ser uma questão importante.
“Um confronto político entre o Reino Unido e os outros países da União Europeia (UE) poderia ter um impacto a longo prazo na solidariedade transatlântica e na aliança da Otan”, diz o professor de Relações Internacionais da FGV James Cameron.
A tensão envolvendo a China e Taiwan, na qual Trump chegou a se envolver por meio de telefonemas, também é evidenciada pelo professor.
Para ele, uma continuidade de interferências por parte dos EUA poderia aumentar significativamente as chances de um conflito do país com a China.
Embora a resolução para a maioria dos conflitos esteja fora do alcance dos Estados Unidos, sua postura pode ser decisiva para evitar que alguns deles piorem.
Por isso, as expectativas sobre o caráter governista de Donald Trump apenas crescem.
Segundo Cameron, a imprevisibilidade tem se mostrado a principal característica do republicano. Apesar de importante em seu papel de empresário, ela pode ser perigosa nas mãos de um governante.
“É improvável que esta imprevisibilidade seja útil se uma crise explodir, por exemplo, entre os Estados Unidos e a China ou a Rússia. Isso porque ninguém sabe como Trump irá reagir”, explica.
Essa situação, por sua vez, poderia aumentar a instabilidade e as chances de um grande choque entre os EUA e uma outra grande potência.
O professor também destaca o fato de Trump, em geral, enxergar as relações entre países em termos de suas relações pessoais com seus respectivos líderes. Até agora, o exemplo mais prático tem sido sua postura amistosa em relação ao líder russo Vladimir Putin.
Apesar de uma melhora na relação entre os dois países ser desejável, a instabilidade entre eles se torna um fator preocupante. “Se Trump acreditar que Putin o tenha desrespeitado, ele, de alguma forma, poderá mudar sua atitude muito rapidamente”, pontua.