Tamara Stief: corretora e influencer defende valorização de imóveis antigos (Leandro Fonseca/Exame)
Repórter de Invest
Publicado em 11 de junho de 2024 às 08h50.
Última atualização em 11 de junho de 2024 às 09h18.
Pé direito alto, ambientes amplos, iluminação natural e piso de taco fazem brilhar os olhos da corretora sul-matogrossense Tamara Stief, 41. Em pouco mais de um ano, ela viralizou no Instagram, conquistando quase 200 mil seguidores com vídeos descontraídos e sincerões sobre casas e apartamentos milionários na cidade de São Paulo, onde vive há 23 anos. Seu catálogo se baseia em imóveis antigos, amplos e bem conservados – “achadinhos”, nas palavras da própria Tamara, em uma capital que não se cansa de construir novos prédios.
Os números expressivos nas redes sociais se refletem também no negócio. O perfil no Instagram é pessoal, mas por trás de Tamara existe uma estrutura, criada na esteira do crescimento no Instagram. O marido Fábio é sócio do negócio, além de gravar e editar os conteúdos. Junto deles, há outros 10 funcionários, entre corretores e setor administrativo. “Gastei R$ 300 para impulsionar [o primeiro vídeo] e deu 100 mil visualizações. Choveu gente querendo visitar o imóvel. Hoje, já somos uma imobiliária”, conta a influenciadora em entrevista à EXAME.
O nome oficial da imobiliária é Mara Imóveis, mas o que chama atenção é o domínio do site, batizado de “maramores” – apelido criado por ela para se referir aos seguidores nas redes sociais. Tamara não divulga quanto ganha com a venda de casas e apartamentos, mas diz que a empresa dobra em faturamento e número de clientes a cada mês.
Segundo os sócios, tudo é muito experimental – e, por isso, ainda não há uma projeção de até onde a imobiliária pode crescer. O que está claro nos planos da empresa é a ambição de ser formador de preço no mercado paulistano. O foco não é vender um serviço de consultoria, mas sim ajudar os clientes e seguidores a estabelecerem parâmetros do que realmente considerar e valorizar na hora de comprar sua casa.
O perfil de Tamara anuncia de dois a três imóveis por semana no Instagram, que funciona como vitrine para o site onde estão catalogados mais de mil imóveis. O jeito despojado cativa os seguidores, muitos deles sem intenção nenhuma de comprar o que ela anuncia. “Quem fica pelo entretenimento costuma compartilhar o vídeo, e isso é ótimo porque me ajuda a alcançar o público comprador”, diz.
Tamara conta que os vídeos são espontâneos, sem script: “Fico pensando no carro [a caminho do imóvel] em alguma abertura motivacional, alguma história minha, algo que não seja da venda em si. Às vezes canto ou conto uma história. É bem espontâneo, não tem nada ensaiado.”
O jeito sincerão já rendeu memes. Em seu mais recente viral, Tamara anuncia um apartamento “perfeito para você que é herdeiro”: um imóvel de 300 metros quadrados e dois dormitórios nos Jardins, ao preço de R$ 8,2 milhões. “Foi um vídeo que causou polêmica. Muitos gostaram e outros disseram que eu estava desdenhando do meu cliente, mas essa nunca foi a intenção. É muito comédia o que a gente se propõe a fazer.”
As frases afiadas fazem parte do estilo da corretora, que não deixa os defeitos dos imóveis de fora dos vídeos – e chega, por exemplo, a sugerir que alguns espaços precisam de reforma. “Já entrei em apartamentos detonados, mas que tinham potencial. Não vou mentir: gosto de falar para as pessoas realmente o que é o imóvel. Tento ser o mais real possível para não perder o meu tempo, nem o do cliente. É o que eu gostaria que fizessem comigo”, conclui.
A autenticidade virou uma arma para se conectar, inclusive, a clientes mais abastados, como empresários, artistas e políticos. O argumento é que, estabelecida uma relação de confiança, eles se sentiriam mais confortáveis em procurar a imobiliária com a expectativa de um preço justo, sem a inclusão um zero a mais por conta do sobrenome do cliente. Tamara reforça, no entanto, que não quer focar apenas nos ultra ricos. O objetivo é encontrar bons exemplos de imóveis em cada faixa de preço.
Existe, no entanto, um limite: a metragem mínima com que a corretora trabalha é 60 m², e os preços variam de R$ 500 mil a R$ 20 milhões. A Mara Imóveis atua na região entre Alto de Pinheiros e Itaim Bibi, na Zona Oeste de São Paulo, além de Santa Cecília e Vila Buarque, no centro.
Há pouco mais de um ano, toda essa fama estava muito longe da realidade de Tamara. Corretora há 15 anos, ela enfrentava um período de vacas magras no trabalho. A gravidez e a insatisfação com o produto das incorporadoras foram os principais fatores para a demissão do último emprego, ainda em 2020. “Eu via os clientes chateados com a entrega do apartamento. Era muito decepcionante”, conta.
De lá para cá, ela entrou no mercado de venda de apartamentos usados, mas sem muito êxito. “Comecei a trabalhar com 14 anos e, de repente, me vi sem um sustento próprio, dependendo do meu marido. Nos anos de pandemia, vendi cinco apartamentos por ano. Estava acostumada a vender um por mês.”
Tamara pediu emprego em diversas imobiliárias, entre tradicionais e startups, e acabou rejeitada em todas. O ponto de virada veio quando um amigo indicou uma cobertura para que ela vendesse de forma autônoma. Decidiu apostar no vídeo, formato que já tinha visto outros corretores experimentando. O primeiro nasceu de bate pronto, com o celular apoiado em uma mureta e sem mostrar o apartamento – o tour ficou para a segunda parte.
“Acho que muito desse sucesso vem porque as pessoas se identificam com meu gosto. Além disso, consigo encontrar imóveis com preço atrativo. Tenho muita experiência com venda de imóvel e consigo unir o útil ao agradável, que é um bom preço com um imóvel charmoso”, explica.
Outro atrativo é a própria Tamara. O gosto pela moda é motivo de comentários sobre os looks da corretora/influenciadora. E, para o futuro, os planos são explorar a imagem de influencer para além dos imóveis. “Tenho essa skill e tenho vontade de investir nisso. A ideia é abordar tudo que eu gosto: moda, arte, design. Vou ser bem seletiva [nas parcerias e publicidades]”.
A seletividade atinge também o portfólio de imóveis. Tamara conta que é frequentemente convidada para conhecer apartamentos, mansões – e até ilhas –, mas prefere se manter no perfil que a tornou conhecida: os imóveis antigos de chão de taco e janelas grandes que viraram um contraponto aos apartamentos compactos e studios que tomam a cidade.
Em vídeo com mais de 200 mil visualizações, Tamara se posicionou contra a revisão do Plano Diretor de São Paulo, que aumentou a área de adensamento em torno dos eixos de transporte. A mudança deixa maior a área onde as incorporadoras estão autorizadas a subir prédios maiores – em geral, com mais andares e mais apartamentos pequenos.
Aprovada no ano passado, a revisão do Plano Diretor é considerada parte de um projeto de destruição da história de São Paulo, nas palavras da corretora. “É um canibalismo com a cidade, um querendo comer o outro. Fica todo mundo tenso porque você não sabe se vai surgir uma torre amanhã na sua janela. E não tem planejamento: não precisa mais de studio na cidade e continuam fazendo pelo dinheiro”, acrescentou à reportagem.
As principais críticas são a destruição de casarões e casinhas históricas para dar lugar a grandes condomínios de prédios. Tamara também questiona o que chama de “casas cubo”, em referência ao formato quadrado (e padronizado) das novas mansões. “O antigo era visto como casa da vovó, mas ele é o que realmente tem valor porque tem um padrão construtivo que não existe mais. Não tem negócio melhor do que comprar um imóvel antigo”, defende.
Tamara tem duas dicas principais para quem busca uma casa ou apartamento: escolha uma região que facilite a sua logística do dia a dia e que tenha melhor custo benefício, com melhor preço possível em espaços maiores. Algumas máximas são repetidas quase que como bordões em seus vídeos, como o “maior luxo do mercado imobiliário é espaço” e “você não vai morar na fachada [área comum] do prédio. O que importa é da porta para dentro”.
E quando for a hora de expandir com a imobiliária para novos mercados, Tamara já tem duas cidades no radar: Rio de Janeiro e Salvador. “São duas cidades com história, e eu quero trabalhar com coisa antiga. Não sou contra novas construções, mas sim contra a destruição sem planejamento. Quero resgatar o que temos de bom e que, se não for cuidado, acaba e não volta mais.”