Mercado imobiliário

Inflação alta 'encolhe' o Casa Verde e Amarela

Um quinto das construtoras que atuam no Casa Verde e Amarela suspendeu os lançamentos de projetos ou saiu do programa do governo federal por não conseguir viabilizar novos projetos

MRV: o preço médio dos seus apartamentos lançados dentro do programa chegou a R$ 243 mil agora, alta de 25,5% em um ano (Germano Lüders/Exame)

MRV: o preço médio dos seus apartamentos lançados dentro do programa chegou a R$ 243 mil agora, alta de 25,5% em um ano (Germano Lüders/Exame)

Karla Mamona

Karla Mamona

Publicado em 9 de novembro de 2022 às 10h16.

Um quinto das construtoras que atuam no Casa Verde e Amarela (CVA) suspendeu os lançamentos de novos projetos ou saiu do programa do governo federal por não conseguir viabilizar novos projetos devido à pressão inflacionária. Havia 791 empresas ligadas às contratações em 2021. O número recuou para 635 em 2022, conforme levantamento do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) realizado a pedido do Estadão/Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.

"A saída das empresas está relacionada à perda de rentabilidade e ao fato de terem produtos que não se enquadram mais no programa", avaliou o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins. "Foi um movimento natural. A construtora só vai fazer um produto que conseguir vender e obter retorno. O mais prejudicado é quem fica sem esse imóvel."

Disparada de preços

As empresas sentiram o aumento generalizado nos custos de construção, especialmente de materiais como concreto e aço. A inflação setorial medida pelo Índice Nacional de Custos da Construção (INCC) cresceu 11,2% no acumulado dos últimos 12 meses até agosto de 2022. Em um dos momentos de pico, chegou a subir 16,7%, no acumulado de 12 meses até agosto de 2021.

Como resposta, as incorporadoras foram forçadas a repassar para os consumidores o aumento nos custos. O problema foi que, em muitos casos, os novos preços ficaram incompatíveis com o poder de compra dos consumidores, o que levou à suspensão dos projetos pelas empresas.

Ao longo do ano, o Ministério do Desenvolvimento Regional aumentou os subsídios, dilatou os prazos de financiamento e baixou os juros no Casa Verde e Amarela, dando mais fôlego aos consumidores. A partir daí, as empresas puderam subir os preços e recuperar a lucratividade perdida, despertando o interesse em retomar lançamentos dentro do programa.

"O aumento do preço final foi um imperativo para as empresas compensarem o aumento do custo e recuperarem a margem", afirmou o analista de mercado imobiliário do Citi André Mazini. "É um quadro bem dramático. As empresas formiguinhas saíram, e as grandes acabaram aumentando a participação de mercado."

Após os ajustes recentes no programa, Mazini acredita que essas construtoras devem retornar. Entretanto, esse movimento tende a ocorrer de forma lenta e gradual porque agora as empresas terão de refazer as contas, ajustar os projetos, realizar o lançamento as vendas e as obras - um ciclo longo, que leva cerca de três a quatro anos para ser concluído.

Para o analista Bruno Mendonça, do Bradesco BBI, ainda não está claro se as empresas menores conseguirão, de fato, voltar para o programa. "Os ajustes melhoraram as condições de contratação e vão ajudar as grandes a recolocar as operações no eixo. Mas não sei se foram suficientes para as empresas formiguinhas voltarem" ponderou.

Para reduzir perdas, preço do imóvel sobe

A situação não está fácil nem para as grandes empresas. A MRV - maior operadora do Casa Verde e Amarela - viu sua margem bruta diminuir de 26,3% no primeiro semestre de 2021 para 19,2% no mesmo período de 2022. Como resposta, passou a subir o preço dos imóveis para tentar recuperar essas perdas. O preço médio dos seus apartamentos lançados dentro do programa chegou a R$ 243 mil agora, alta de 25,5% em um ano.

"A maior parte do ajuste de preços já foi feita. Vamos continuar fazendo, mas a agressividade não vai mais ser tão alta assim", explicou Eduardo Fischer, copresidente da MRV. Ele admitiu que teve como efeito colateral a perda de vendas, uma vez que a renda dos consumidores não cresceu na mesma proporção do valor dos imóveis. "Subir preço sempre deixa uma 'ressaquinha', né? Ela tende a trazer a venda para baixo em um primeiro momento, mas depois tem reversão."

Em agosto, em média, as residências do programa habitacional foram comercializadas por R$ 177.780, valor 11,2% maior do que o do mesmo mês do ano passado. A maior subida de preços aconteceu no grupo 1, destinado às famílias mais pobres, com renda de até R$ 2.400 por mês. Neste caso, o salto foi de 17,6%, chegando a R$ 154.195.

Tendência

Martins prevê que os preços rumem para uma estabilização nos próximos meses, ao considerar que o Índice Nacional de Custos da Construção (INCC) já parou de subir de modo significativo. Em agosto e setembro, a oscilação foi de 0,3% e 0,1%, respectivamente. "O Brasil está criando empregos, e a tendência é de que os salários aumentem (via acordos coletivos), dando mais poder de compra à população. As empresas podem até subir os preços, mas não muito, porque vai escapar da renda da população e dos tetos dos programas. Acho que vamos chegar a um equilíbrio", disse.

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