Estátua de Mao ao lado de modelo ocidental em anúncio em Baotou, na China (Natalie Behring-Chisholm/Bloomberg News)
João Pedro Caleiro
Publicado em 29 de abril de 2015 às 19h28.
São Paulo - Não está conseguindo vender os apartamentos que construiu? Alugue um estrangeiro.
Essa tem sido a solução encontrada por desenvolvedores imobiliários na China, de acordo com um mini-documentário publicado no New York Times pelo cineasta David Borenstein, que prepara um longa sobre o assunto.
"Tem esse truque: faça parecer internacional. Quando você coloca um estrangeiro lá, tudo muda. Não é mais um prédio remoto construído por um desenvolvedor desconhecido - é uma cidade internacional do futuro", diz a profissional do setor de casting entrevistada.
Conversando com um desenvolvedor, ela nota que se ele não tiver fundos suficientes para uma pessoa branca, uma alternativa é contratar negros - que tem "personalidade aberta" e preço mais em conta (160 dólares). Indianos saem pelo mesmo valor, apesar de serem usados mais raramente.
Os estrangeiros são recrutados em bares e contratados para participar de eventos de lançamento com sua mera presença ou fazendo algum tipo de performance como dança, canto ou desfile.
Visual e atitudes são construídos e controlados para que eles sejam vistos como celebridades como atletas e atores ou mesmo como engenheiros que participaram do projeto em questão. Até a presença do documentarista era apontada frequentemente pelos organizadores como prova de que o empreendimento é internacional.
"Na China, você pode ser qualquer coisa, sem conhecimento ou educação, se você for do Ocidente. É tudo falso. A gente só tem que aparecer para dar a eles um rosto branco", diz um dos contratados, divulgado falsamente como ex-participante do "America's Next Top Model" e um dos 20 principais modelos dos Estados Unidos.
Contexto
O recurso a práticas heterodoxas para vender apartamentos é sinal de uma crise mais ampla do setor imobiliário e da economia da China.
O investimento, em especial na construção, é o principal motor de crescimento do país há muitos anos, mas isso levou a um excesso de estoque que se refletiu em cidades fantasma e mais recentemente, em uma perigosa queda de preços no setor.
O governo tenta atenuar o problema com mudança de regras e novos estímulos, mas sabe que precisa rebalancear sua economia em direção ao consumo das famílias e que alguma desaceleração é inevitável.
De acordo com o Société Generale, um pouso forçado da China é atualmente o maior "cisne negro" da economia global. "Não será fácil alcançar outro crescimento de 7% este ano", disse recentemente ao Financial Times o premiê do país, Li Keqiang - e esse problema não há estrangeiro que possa resolver.