Marketing

Por que as marcas estão investindo cada vez mais em collabs?

Em um mundo fragmentado e competitivo, parcerias entre empresas ou com celebridades se destacam como estratégia de marketing para expandir valores, alcançar novos públicos e turbinar resultados

Em nova collab com a Tok&Stok, Alexandre Herchcovitch retoma a coleção “Caveira” em uma edição especial (Divulgação)

Em nova collab com a Tok&Stok, Alexandre Herchcovitch retoma a coleção “Caveira” em uma edição especial (Divulgação)

Publicado em 24 de agosto de 2024 às 13h54.

Última atualização em 27 de agosto de 2024 às 14h38.

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Uma década atrás, quando nem o conceito e nem a prática de se fazer uma collab entre empresas eram tão difundidas como são nos dias de hoje, Alexandre Herchcovitch e a loja de móveis Tok&Stok lançavam, juntos, os primeiros produtos de uma linha exclusiva de acessórios para casa e que traziam a imagem de uma caveira - símbolo que durante muito tempo representou a grife do designer de moda. Pois essa parceria acabou de ser retomada, com novas peças de uso pessoal e de decoração para casa.

Desta vez, a novidade está disponível em todas as lojas, site e aplicativo da Tok&Stok desde 13 de junho. Nesta nova collab com a Tok&Stok, o artista retoma a coleção “Caveira” em uma edição especial, e traz novas peças com desenhos alusivos ao desfile que celebrou os 30 anos de carreiras de Herchcovitch, realizado em dezembro de 2023.

Para ele, a chance de ter produtos à venda nas lojas e plataformas digitais da rede de artigos para casa é uma oportunidade de ampliar significativamente o alcance de sua marca e de explorar novas possibilidades criativas, em um cenário competitivo como é o da moda.

“Ele ganha em visibilidade, alcance e tem a chance de reforçar sua presença em um segmento complementar ao seu core business”, diz Ghislaine Dubrule, fundadora e CEO da Tok&Stok, que, obviamente, tem expectativas de um retorno positivo com a parceria. “Esperamos crescer 42% em engajamento nas nossas redes sociais. Entretanto, mais do que crescimento em vendas, esse lançamento é um reforço do nosso posicionamento de criar produtos exclusivos e inovadores e de dar, ainda mais, visibilidade aos artistas brasileiros”.

Essa parceria é um exemplo oportuno das possibilidades que podem surgir para os negócios colaborativos entre duas marcas que, aparentemente, percorram caminhos de mercado distintos. “A ideia central ao unir duas marcas é combinar suas forças para criar algo ainda mais potente”, explica Alexia Chlamtac, palestrante do curso de Marketing Digital para Moda na ESPM-SP e CEO do Estúdio Ondina, agência de marketing digital que tem clientes como Sephora, Latam Airlines e Arezzo.

“A beleza das collabs está na capacidade de apresentar marcas a novos públicos e somar esforços de maneira que todos os envolvidos se sintam seguros e cientes do que está sendo realizado e do porquê.” Segundo a CEO da Tok&Stok, que quase quebrou no período da pandemia, mas vem se reestruturando depois de ter demitido funcionários, fechado lojas e recebido um investimento de R$ 100 milhões por parte do fundo Carlyle Group (EUA), a empresa pretende retomar o lançamento de collabs estratégicas. “Até o final do ano, prevemos lançar outras três collabs.”

Um outro patamar

Uma das companhias brasileiras mais bem-sucedidas com as collabs é a Cimed, quarta maior indústria farmacêutica do país, que produz medicamentos, cosméticos e suplementos vitamínicos. Em 2023, a empresa foi procurada pela Fini, líder no segmento de balas de gelatina no Brasil e que faz parte do grupo espanhol The Fini Company, para encarar um desafio.

Há 20 anos no Brasil, com presença no varejo, em e-commerce e até em cinemas, entre outros canais de venda, a marca queria entrar no segmento do varejo independente de farmácias (as farmácias pequenas), já que seus produtos estavam à venda apenas nas grandes redes. A Cimed propôs à Fini a ideia de criar uma linha de Carmed, o selo de hidratante labial criado em 2015, com aroma e sabor das balas Dentadura, o Bananinha e o Beijo.

Até maio de 2023, quando esses Carmed chegaram às farmácias, a Cimed vendia cerca de 100 mil unidades do hidratante por mês e produzia o suficiente para um estoque que garantisse seis meses de abastecimento. Pouco mais de um ano depois, a empresa já vendeu mais de 13 milhões de unidades, que geraram um faturamento de R$ 400 milhões – uma febre que contagia de crianças a fãs de Madonna já chegadas à meia-idade. “Quando lançamos essa linha com a Fini, os produtos acabaram em 15 dias”, conta Karla Marques Felmanas, vice-presidente da Cimed. “A collab com a Fini projetou a Cimed para um outro patamar.”

Com 25 lançamentos em sua história, o Carmed fez crescer a categoria de hidratantes labiais em mais de 90% no Brasil e levou a Cimed a liderá-la, com 70% de market share. “Grandes cases como o de Carmed são exemplos relevantes da potência e oportunidade de expansão e visibilidade de marca por meio de collabs e parcerias entre marcas e conexões com diferentes públicos”, afirma Valmir Feil, diretor geral da The Fini Company Brasil.

A empresa aposta nas collabs e co-brandings com empresas de setores diferentes ao seu desde 2018, a fim de construir interação e estreitar relacionamento com públicos de outros nichos. “A Cimed entendeu a força da parceria”, diz Tatianna Oliva, fundadora da Cross Networking, uma aceleradora de negócios especializada em parcerias estratégicas entre marcas, empresas e pessoas. “Na hora de fazer a parte dela, a Cimed investiu dinheiro e equipe e acelerou, a partir do momento em que a Fini deu carta branca para ela trabalhar da forma como quisesse. E Fini deu à Carmed um sabor, ajudando a conquistar fãs de todas as faixas etárias.”

Nem sempre é dinheiro

Se a collab com Fini encheu os cofres da família Marques, dona da Cimed, a farmacêutica lança mão da estratégia também quando quer atingir outros objetivos, mesmo que não haja expectativa de retorno financeiro direto. Foi o caso de uma das parcerias realizadas com Burger King, no Dia da Mentira (1º de abril), quando a rede de fast-food distribuiu gratuitamente 35 mil unidades do Carmed BK, um hidratante labial com sabor de carne grelhada.

Para ganhar um deles, o cliente tinha que comprar um sanduíche da linha Whopper em uma das 37 lojas definidas pela rede. Os produtos se esgotaram em poucas horas e as lojas participantes tiveram um aumento de 300% no número de pedidos. “Nós sempre buscamos marcas que possam nos emprestar algo e que a gente possa entregar algo também, seja do ponto de vista de público-alvo, do tom de voz da ação ou da essência da marca”, diz Mayra Dietzold, ex-diretora de marketing de Burger King. “Essa é a collab ideal”.

Durante a realização dessa parceria, as lojas participantes do BK tiveram um aumento de mais de 372% nos pedidos e um tráfego 13 % maior. “Tem gente vendendo um Carmed BK por R$ 600 no Mercado Livre”, diz Karla, lembrando que os produtos da linha são vendidos na farmácia entre R$ 16 e R$ 22. “Essa ação não teve dinheiro envolvido, mas passamos a ter contato com um consumidor de hambúrguer, diferente e mais adulto, que talvez não conhecesse a marca”, destaca a executiva.

Casamento com a inovação

Para Alexia Chlamtac, CEO do Estúdio Ondina, o sucesso de uma collab está atrelado a um fator muito importante: a inovação, que pode se dar até mesmo quando se juntam duas marcas que, à primeira vista, parecem incompatíveis, mas que veem oportunidades em comum, de acordo com a famosa equação do “ganha-ganha”.

Foi esse encontro de propósitos e o desejo por inovação, por exemplo, que uniram a Moving, uma marca no segmento de bebidas proteicas em lata, e a Oakberry, rede de franquias presente em 45 países e que declara um compromisso com a sustentabilidade no processo sustentável na produção do açaí. Juntas, elas apresentaram na NaturalTech, maior feira de negócios em produtos naturais da América Latina, na segunda quinzena de junho, em São Paulo, latinhas de Moving nos sabores açaí e açaí com guaraná, com a marca Oakberry estampada no rótulo.

A parceria surge em um momento de crescimento significativo no mercado de alimentação saudável, que, segundo a consultoria Euromonitor Internacional, apresenta uma expansão anual superior a 33%. Com a parceria, a Moving projeta posicionar o produto em 30 mil pontos de venda no Brasil e rapidamente iniciar a distribuição desses produtos para o mundo todo, com a capilaridade de Oakberry, a começar por Portugal.

“Projetamos um faturamento de R$ 20 milhões até o fim do ano com essa collab, diante de um investimento de R$ 2 milhões, tendo três áreas envolvidas: nosso time de pesquisa e desenvolvimento, além das equipes de marketing e C-level das duas empresas”, diz Fernando Gorayeb, cofundador e co-CEO da Moving.

Em contrapartida, segundo Gorayeb, Oakberry percebeu uma sinergia de público e posicionamento com a Moving: ambas são marcas voltadas para pessoas ligadas a atividades físicas e esportes. “E nós conseguimos entregar um sabor de açaí que foi aprovado rapidamente pelo time de produtos do parceiro.”

Collab para sempre

Com tantas áreas envolvidas em uma collab, as empresas vêm profissionalizando cada vez mais as suas parcerias. Para Tatianna Oliva, ao entrar no universo de outra marca, é preciso estruturar todo o negócio para a novidade. E para que a parceria seja produtiva, convém deixar claro de que forma as partes irão se beneficiar. “Uma collab não pode simplesmente juntar forças de maneira aleatória, sob pena de levar a resultados insatisfatórios. Muitas vezes, surgem desentendimentos sobre os benefícios financeiros, gerar conflitos e abrir precedentes negativos. Por isso, é fundamental que todos os aspectos sejam formalizados em um acordo contratual”, diz Alexa Chlamtac, do Estúdio Ondina.

E parcerias como essa podem ser uma iniciativa que responda a uma necessidade pontual mas que, na visão de Tatianna Oliva, tem o potencial de se tornar um negócio perene para os dois lados. Ela cita a experiência de Maizena, tradicional marca de amido de milho controlada pela multinacional de alimentos Unilever, que buscou a Cross Networking em busca de uma solução para aproximar o produto e os jovens.

Ao estudar esse público, a Cross percebeu que quando ele vai morar sozinho e passa a cozinhar, não quer apenas bancar o “masterchef amador”, mas quer ter também utensílios e peças de decoração que impressionem suas visitas. O fato de Maizena ter um desenho vintage foi o mote que a Cross encontrou para levar à Tok&Stok a criação de uma linha de itens de casa. Até o momento, foram vendidos mais de 400 mil produtos e o que era pra ser uma edição limitada, tornou-se um SKU (Stock Keeping Unit, ou produto de linha, em tradução livre) de Tok&Stok. “Por outro lado, essa parceria já permite à Unilever receber royalties de marca pagos pela Tok&Stok”, conta Tatianna Oliva.

Os dois lados das redes

Se as redes sociais têm o poder de fazer um produto decolar, por outro lado a superexposição de celebridades, que muitas vezes são garotos-propaganda ou parceiros, requer que as marcas redobrem os cuidados quando partirem para uma collab com um influenciador. “Esse influenciador precisa entender que ele também é uma marca e que, ao se associar, ele pode ser levado ao ponto que quiser e onde não quiser”, defende Tatianna Oliva, da Cross Networking. Afinal, a marca representa o seu público e tem uma imagem a ser zelada. E se o influenciador não entender isso, a collab pode tirar dele o que construiu a vida inteira – e vice-versa.

Ela cita o caso do DJ Alok que, em 2019, passou a ter um avatar no Free Fire, um dos por jogos de luta mais procurados – e do qual o próprio DJ era jogador assíduo. Para que não houvesse ruído em sua imagem, a Cross Networking sugeriu à Garena, empresa chinesa que é dona do jogo, que seu personagem tivesse poderes “do bem”. Em contrapartida, o jogo passou a ter na trilha sonora uma música do DJ brasileiro. Feito o acordo, estabeleceu-se ainda que quem comprasse o jogo ganharia brindes, como uma camiseta e uma das tatuagens de Alok. E parte da receita com a venda do jogo seria revertida para o Instituto Alok, que auxilia instituições ligadas à educação no Brasil e no exterior.

“Quando você atrela um produto a uma pessoa, pode dar supercerto ou pode ter um problema enorme, porque a gente não consegue gerenciar a vida nem as opiniões delas. É por isso que eu prefiro não ter produtos que levem o nome de influenciadores ou celebridades na própria embalagem”, diz Karla, da Cimed. “Em caso de alguma situação de crise, a gente tem que se posicionar rapidamente. E se você se posiciona com transparência, respeito e velocidade, reduz o estresse.”

Collab 2.0

Experiente na parceria com influenciadores, a varejista de brinquedos Ri Happy vem mudando o formato das collabs. “Temos adaptações que são poderosas tanto para o nosso lado como também para os influenciadores”, diz o CEO Thiago Rabello. Na visão de Rabello, a capilaridade da rede – são mais de 300 lojas no Brasil inteiro – tem um valor muito grande para os influenciadores.

Recentemente, a Ri Happy importou e passou a comercializar no Brasil uma linha inédita de brinquedos colecionáveis, os Miniverse, e precisava criar uma demanda para esse produto. A marca desenhou então uma ação-piloto com Enaldinho, influenciador digital que conversa com jovens e crianças, e que possui mais de 36 milhões de inscritos em seu canal no Youtube. Por ora, o influenciador mineiro de 26 anos vem produzindo conteúdo sobre Miniverse em seu canal, brincando com os itens da coleção, embora o acordo preveja que ambos sejam sócios na empreitada, para que juntos atinjam seus objetivos.

“Uma das nossas expectativas é poder levar Enaldinho para a China e, juntos, escolhermos novos produtos”, diz Thiago Rabello. “Além da geração de conteúdo propriamente dita, a gente vai ter ativações em loja, entre outras ações para um relacionamento mais de longo prazo”. Segundo o CEO da Ri Happy, com pouco mais de dois meses de parceria o Miniverse já é o segundo produto mais vendido na rede. Mais uma prova de que collab não é brincadeira.

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