Os clientes estão cada vez mais exigentes e ligados às questões de responsabilidade social e sustentabilidade. (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 15 de dezembro de 2011 às 14h48.
Rio de Janeiro - Mais conveniência, autenticidade e experiência são algumas das principais reivindicações do novo consumidor mundial. É o que mostra a pesquisa internacional Retail Trend 2012, realizada pelo The Future Laboratory, sobre as tendências do varejo global para o próximo ano. Apesar dessas questões não serem novas no mercado, ainda são poucas as empresas que seguem estes conceitos e estratégias para se aproximarem do público. De acordo com o estudo, os clientes estão cada vez mais exigentes e ligados às questões de responsabilidade social e sustentabilidade.
A pesquisa aponta que uma nova geração de consumidores determinará uma reinvenção do varejo por meio de conceitos como o “revivalismo” e o “Rubarnism”, apresentados pela Future Laboratory, além da curadoria. Estas características trarão produtos naturais e menos estímulos para as grandes cidades. Algumas empresas como Starbucks, Domino’s e Moleskine já apostam nesta reestruturação e investem na interatividade, transparência com o público e construção de uma herança da marca. Por aqui, nomes como Pão de Açúcar e O Boticário também realizam um trabalho alinhado às exigências dos consumidores.
As tendências para o próximo ano impulsionarão as marcas a mudarem de postura no mercado conforme o desejo dos clientes. “O consumidor está buscando uma vida com menos estresse e estímulos. Ele procura a super conveniência. As pessoas, por exemplo, não querem mais ir ao supermercado, mas à lojinha de bairro, sem pegar trânsito. Também buscam artigos com herança e mais relacionados às artes, com aparência de feitos à mão. Faz parte ainda dessa busca uma curadoria das marcas, sem tantas opções do mesmo produto”, explica Paulo Al-Assal, Diretor Geral da agência Voltage, representante do estudo no Brasil, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Diálogo com o Cliente
Atendimento de qualidade é um dos fatores mais desejados pelos consumidores em relação às empresas. Para satisfazer o consumidor, segundo o levantamento, é necessário construir formas diferenciadas de dialogar com o público e entender como a marca é percebida por ele. Uma das estratégias propostas para as empresas por Al-Assal é saber utilizar o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) ao seu favor. Atualmente, o serviço se configura como um monólogo, no qual apenas o consumidor fala e as companhias não reagem de acordo com as expectativas.
“Se o SAC recebe cerca de 30 mil ligações e realiza o cadastro destas pessoas, a empresa já conta com uma grande de base de perfis dos consumidores que são engajados com a marca e desejam contribuir. Por meio desse material podem ser feitas pesquisas mercadológicas, incentivar os consumidores a co-criarem com a empresa e a produzirem soluções relevantes”, destaca Al-Assal.
O acompanhamento nas redes sociais também se torna cada vez mais importante nesta nova disposição do varejo. Os clientes exigem um diálogo mais autêntico e ágil, principalmente os jovens da geração Y e Z que se identificam mais com os canais na internet do que com o serviço por telefone. Um caso clássico de transparência e co-criação foi a estratégia da Domino’s Pizza, nos Estados Unidos. Após ter registrado 6% de queda nas vendas, a rede decidiu reformular o cardápio com a ajuda dos clientes que reclamavam das mudanças na qualidade do produto. Durante meses, a empresa testou junto com os consumidores diversas inovações nas receitas até chegar ao cardápio atual.
Neste mês, a Domino’s americana também criou uma ação relacionando dois conceitos demandados pela nova geração de consumidores. Juntou interatividade e conveniência e produziu o game Pizza Hero para iPads (foto acima). O jogo promove uma competição entres os usuários no quesito velocidade de preparo e é possível receber em casa a pizza criada virtualmente.
Experimentação da marca
Com mais informações e ferramentas online de pesquisa, os consumidores tornam-se extremamente exigentes e pesquisam muito antes de comprar, procurando saber de onde vem o produto adquirido e a história da empresa. Para gerar experiência do online no offline, algumas lojas na Europa montaram quiosques de busca virtual nas unidades para que o cliente pudesse fazer uma pesquisa sobre o produto no próprio espaço. A ideia é superar uma disposição dos internautas conhecida como ROPO (Research Online, Purchase Offline), pela qual as pessoas realizam buscas na web sobre o produto, mas acabam comprando nas lojas físicas.
Os varejistas europeus e americanos têm investido em exposições interativas e educacionais destinadas a aproximar o cliente do processo de produção. A Heineken já consegue proporcionar estes elementos com a “Heineken Experience”, o museu sobre a cervejaria e seus produtos, localizado em Amsterdã, na Holanda. Desde 2001, o local oferece uma excursão aos processos de fermentação da cerveja durante os anos. Caminho semelhante seguiu as cervejarias Therezópolis, Grupo Petrópolis e Ambev, com a Bohemia, ao criarem pontos turísticos de visitação às fabricas da empresa, com direito à degustação e visualização dos processos de produção, nas cidades da Região Serrana, no estado do Rio de Janeiro.
“O grande protagonista no varejo não é mais o produto, mas outras variáveis mais importantes, por exemplo, o relacionamento e a curadoria. As marcas têm que ensinar as pessoas e engajá-las. O Brasil ainda não está oferecendo a super conveniência, principalmente nas grandes cidades, como São Paulo, onde a falta de mobilidade é gigantesca”, afirma Al-Assal. O Boticário, no entanto, já conseguiu enxerga o valor da conveniência e, além do e-commerce, conta com mais três mil pontos de venda espalhados pelo país, entre lojas de bairros e grandes centros comerciais.
M-commerce e a super conveniência
Os meios virtuais de venda já não são novidades, mas se fortalecem a cada dia a partir de consumidores que buscam o conforto de acessar os serviços e produtos a qualquer hora e de qualquer lugar. Responsável por 50% de todas as transações no Japão, o mobile commerce ganha cada vez mais espaço no mercado brasileiro com o crescimento do número de usuários de smartphones.
As gerações Y e Z, principalmente, devem formalizar o canal nos próximos anos. Somente nos Estados Unidos, as compras com o celular devem atingir a marca de US$ 8,6 milhões em 2014, segundo a ABI Research. O mobile payment também deve crescer no país seguindo esta tendência, a Lojas Colombo, Submarino.com, Saraiva e Pão de Açúcar já aceitam pagamentos por meio de celulares com sistemas da operadora Oi e Vivo.
Com os mais de 230 milhões de telefones móveis no Brasil, segundo dados da Anatel do último mês, o mercado se torna otimista em relação ao modelo de compra. “O mobile será uma moeda no futuro. O consumidor brasileiro é desconfiado com as compras online, é da cultura da população. Mas este tipo de transação já é uma realidade no Japão e, no Brasil, temos grande potencial de torná-la também. Existe uma previsão de que US$ 115 bilhões serão gastos por meio do mobile commerce até 2015”, ressalta Al-Assal.
Rubarnism e sustentabilidade
A super conveniência também está relacionada a outros conceitos, como o modelo chamado “Rubarnism”, que procura trazer as coisas boas da vida no campo para a metrópole, como produtos orgânicos e artesanais, embalagens mais simples e menos opções de escolha para os pontos de venda. De acordo com o estudo, a prática já está sendo empregada na Europa. “Supermercados na Inglaterra e na França aplicam a super conveniência em três aspectos: no tamanho e formato da loja, na diminuição do mix de produtos e na aproximação do cliente, com mercados de bairro”, explica Al-Assal.
A tendência Rurbanism está relacionada à busca pela autenticidade, uma reação avessa à onipresença da vida digital. Esta revolução está impulsionando uma mudança da geração do “eu” para a do “nós”, pela qual os consumidores buscam consumir alimentos de produtores locais, ajudando também o seu meio social. Seguindo está tendência, algumas redes de supermercado aumentaram a oferta de alimentos orgânicos e produtos caseiros, como o Walmart e o Pão de Açúcar, favorecendo a sustentabilidade de pequenos produtores.
Desta forma, o consumidor não deseja apenas que as marcas compartilhem esses valores, mas também que ajudem a expressá-los. O público prefere aderir a campanhas que realizem de fato uma atividade de cunho social, como faturamento revertido para causas sociais e preocupação com o meio ambiente, segundo a pesquisa global. Este mês, a Coca-cola lançou a embalagem com 30% do PET feito a partir da cana de açúcar para a marca de água mineral Crystal, que mostra ao consumidor melhorias à natureza ao fazer com que o plástico possa ser amassado após o consumo, reduzindo em 35% o seu volume para facilitar o armazenamento do material reciclável.
Já o Pão de Açúcar tem trabalhado o revivalismo, inserido no conceito de trazer o campo para cidade, por meio da construção dos seus modelos de padaria dentro dos supermercados. Os espaços organizados nas lojas trazem características rurais e designs artesanais. “Todas as empresas têm que ficar ligadas nas tendências, mas cada uma terá que avaliar em quais se encaixam e como podem explorá-las. É preciso estudar o que o cliente da marca deseja”, destaca Paulo Al-Assal.
História e Curadoria: menos é mais
Não é possível mudar o perfil do negócio apenas para tentar acompanhar os novos valores de consumo, nem toda empresa conseguirá transmitir um caráter mais artesanal ou natural se lida, por exemplo, com tecnologia. Existem outros aspectos, no entanto, que podem ser incorporados por toda indústria, como a curadoria. Contrariando a lógica de super produção do mercado, os consumidores, segundo o estudo global, desejam menos opções nas gôndolas dos pontos de venda, desde que sejam bem selecionadas e estejam de acordo com suas necessidades e desejos.
Outra abordagem que serve para todos os setores e categorias é inserir a história da marca junto aos produtos. O conceito é muito bem utilizado no mercado de Luxo, com marcas centenárias, como Louis Vuitton e Channel, que agregam ao valor das suas coleções a herança histórica. Uma empresa jovem, no entanto, também pode criar uma narrativa para atrair os consumidores. Como fez a Moleskine, fundada em 1997. A marca se apropriou da história ao relacionar os seus cadernos a escritores e artistas, como Ernest Hemingway e Picasso, que usavam blocos semelhantes para anotações.
“Sabemos que o consumidor está cansado de tanto estímulos. Ele procura um Danoninho, por exemplo, e tem várias possibilidades diante de si. Por que não facilitar a vida dessa pessoa e fazer uma curadoria? Por que não diminuir o número de produtos expostos? Menos é mais. As pessoas estão cansadas do excesso de tanta informação e estímulos. A marca pode se segmentar, criar nichos de produtos, mas precisa diminuir as escolhas”, declara o Diretor Geral da Voltage.