"O foco na Copa do Mundo e nas Olimpíadas que estão por vir trarão ainda mais destaque positivo ao Brasil", disse o professor e economista norte-americano Tamer Cavusgil (SXC.hu)
Da Redação
Publicado em 26 de outubro de 2011 às 11h58.
Rio de Janeiro - Apesar do bom momento da economia brasileira e da imagem geral positiva do Brasil no exterior, o país não é reconhecido em termos de empresas que atuam internacionalmente. O número de companhias nacionais que são conhecidas em todo o mundo é muito pequeno perto de outros países em crescimento, como a China, por exemplo.
Alguns pontos precisam melhorar para as empresas brasileiras se aventurarem mais, como um modelo de educação eficiente, estímulos aos empresários e incentivo do setor público. As empresas com mais chance são as que têm a classe média como público-alvo e, na hora do investimento, é preciso um estudo cauteloso dos mercados para decidir em qual entrar. As avaliações são do professor e economista norte-americano Tamer Cavusgil.
O especialista tem como foco de estudo as áreas de business internacional, mercados emergentes, estratégia global e internacionalização de empresas. Cavusgil lidera o Instituto de Negócios Internacionais da Georgia State University, nos Estados Unidos, ligado a uma série de atividades de intercâmbio, pesquisa e expansão de negócios. Leia a entrevista completa abaixo.
Vemos que o Brasil está com uma imagem positiva atualmente no âmbito global. Como você acha que isso ajuda os negócios no país?
Tamer Cavusgil - Concordo que o Brasil esteve em destaque na última década ou mais, como um grande poder econômico e um dos mercados emergentes que crescem mais rápido. As pessoas no resto do mundo têm uma imagem muito favorável dos brasileiros, até por sua cultura e beleza natural.
O foco na Copa do Mundo e nas Olimpíadas que estão por vir trarão ainda mais destaque positivo ao Brasil. Nos Estados Unidos, a percepção é muito boa, sem nenhuma associação realmente negativa. Isto tudo significa que agora é uma época apropriada para as companhias brasileiras se arriscarem no campo internacional.
Existe um pequeno número de empresas, grandes, que fazem negócios no exterior, mas, em geral, a indústria brasileira não se arrisca muito. As companhias estão um pouco atrasadas em entrar no business internacional, até no resto da América Latina. Isto requer, em minha opinião, uma visão mais empreendedora e a exploração de mercados novos, especialmente nos de crescimento rápido.
Comparado à China, por exemplo, não vemos o mesmo momento de reconhecimento entre as empresas de porte médio. A percepção é que a maioria das companhias brasileiras se contenta em ficar em casa, fazendo negócios locais, apesar de terem a oportunidade, já que o momento da imagem nacional as ajudaria.
Por que você acha que temos poucas marcas globais?
Cavusgil - Não há uma boa compreensão do que as empresas e indústrias brasileiras podem fazer globalmente. Isso é porque, ao contrário da China e da Índia, o Brasil não é tão ativo em indústrias diferentes, como a farmacêutica, de telecomunicações, de alto valor. Não há uma grande representatividade nessas áreas. Essa é a necessidade agora. Para chegar lá, é preciso motivar os executivos e tornar atraente para eles fazer negócios no exterior.
Há um crescimento interno, que acaba funcionando contra as ambições de internacionalização, porque a maioria das companhias tem potencial suficiente em casa, então por que se preocupar em se desenvolver no mercado internacional? Mas isso precisa mudar se o Brasil quer ser reconhecido em âmbito mundial.
O que as empresas precisam para se aventurar internacionalmente?
Cavusgil - As companhias devem cultivar relacionamentos em outras economias de crescimento acelerado, tanto em países da América Latina, quanto na África e na Ásia. Muito mais precisa ser feito e, para chegar lá, o Brasil necessita achar mais talentos e desenvolver habilidades.
Há uma escassez de técnicos científicos e de engenharia, apesar do crescimento da economia. Também é preciso buscar novas indústrias para agregar valor, obter um maior conhecimento em áreas além de commodities como minas e petróleo, por exemplo. Há boas empresas, como a Embraer, mas elas são limitadas em número. Um ponto importante é que o Brasil foca em energia nuclear, o que é bom.
A energia se tornará um recurso escasso pelo mundo e se o país conseguir ser líder em desenvolver fontes alternativas e investir em agricultura sustentável, será muito favorável para os negócios.
Quais são as maiores dificuldades que as empresas brasileiras precisam ultrapassar para se tornarem internacionais?
Cavusgil - O sistema educacional necessita de uma reforma. Agora, ele não responde totalmente às necessidades dos negócios de uma economia em crescimento. A formação de pessoas com as habilidades certas e talento poderia ser feita de forma generalizada, não necessariamente especialista. Além deste ponto importante, o maior desafio é motivar os executivos, alertá-los das oportunidades no exterior.
É preciso destacar casos de sucesso de empresas que se aventuraram em âmbito internacional, mostrar quais são as indústrias interessantes na economia global, em quais mirar. O governo também pode ter um papel, tornando a internacionalização menos difícil e desafiadora, por meio de incentivos para estimular os empreendedores locais. Um exemplo a se considerar é o de governos pró-ativos que pegam líderes governamentais para levar grupos de executivos em visitas a novas fronteiras e economias, e assim cultivam relações.
Isso se chama diplomacia comercial, no qual o governo e o business trabalham de mãos dadas, abrindo novos mercados e explorando relações bilaterais. É necessário um esforço focado da parte do setor público para prover ajuda às companhias de maneira genuína. Outro ponto é uma reforma em regulações e taxas para as empresas perceberem que o investimento será válido, que haverá um retorno ao fim.
Qual o papel do marketing no processo de internacionalização das empresas?
Cavusgil - O marketing é criticamente importante e dois fatores ajudariam as companhias. Um deles é a imagem nacional, a marca do Brasil, que está muito boa atualmente. O país é visto de forma positiva em todos os lugares, tanto na Europa, como na Ásia e na América do Norte. Já a outra questão é o branding das empresas, ponto em que eu acho que o Brasil perde um pouco de sua vantagem. Não há muitas companhias brasileiras bem conhecidas fora do país, ou da América Latina.
Ouvimos falar de Embraer, Petrobras, Natura e Vale, mas a maioria não sabe dizer além dessas. Há uma falta de trabalho da imagem corporativa fora do Brasil. É necessário um maior investimento da parte das empresas para divulgar aquisições ou crescimento orgânico, estabelecer a imagem em novos mercados e promover a marca.
Os coreanos, por exemplo, fizeram isso muito bem, juntamente com o governo, eles se engajaram em um esforço para promover, muito ativamente, as marcas nacionais. Bastante gente no mundo hoje conhece a Samsung, a Hyunday, a LP, entre outras. Um esforço em conjunto entre o governo e a comunidade de business é muito importante.
O principal é demonstrar suas vantagens na arena global. Por outro lado, o Brasil entrou um pouco atrasado no cenário internacional, só faz cerca de 10 anos que ultrapassou as fronteiras nacionais, enquanto os chineses, indianos e até mexicanos têm feito isso há mais tempo. Agora é a hora apropriada para as empresas brasileiras começarem a se arriscar no exterior e entrarem em mercados diferentes.
Quais ferramentas de marketing ajudariam as empresas a divulgar sua imagem e se estabelecer internacionalmente?
Cavusgil - Cada companhia, individualmente, precisa fazer targeting, ou seja, identificar a natureza de seus produtos, o mercado que mais se identifica com eles e focar. As empresas precisam estudar a concorrência muito cuidadosamente e desenvolver uma estratégia de posicionamento bem pensada, já que estarão entrando em mercados lotados.
Nos Estados Unidos o ambiente é extremamente competitivo, então é preciso avaliar se este é o lugar certo de investir. Há muitas oportunidades em outros mercados emergentes e de nicho. Um ponto crítico é encontrar parceiros capazes, o que provavelmente levará um tempo maior. Um parceiro muito confiável deve ser o distribuidor, para aumentar os negócios no respectivo país, a longo prazo, trabalhando harmoniosamente com a empresa brasileira.
Essa é uma parte chave na estratégia de marketing. As empresas de porte médio não conseguirão ter muita presença no mercado exterior sem se apoiar em distribuidores asiáticos para levar o produto ao consumidor, pelo menos no começo, e isso requer uma seleção cautelosa. Também aconselho selecionar muito cuidadosamente o mercado. Sabemos que a classe média está crescendo rapidamente em um grande número de países com mercados emergentes, até na Europa oriental, como na República Tcheca, e certamente nos asiáticos, como no Taiwan.
Suspeito que a maioria das empresas brasileiras de sucesso internacional serão focadas em consumidores de classe média, mais do que no mercado de luxo ou na base. Entender que esta classe é abundante e com competição menos excessiva, e então identificar uma distribuição própria com parceiros logísticos e investir no país a longo prazo é o que precisa ser feito. Um país de cada vez, um mercado de cada vez.
Você conhece alguns exemplos de empresas brasileiras que estão no caminho para se tornarem conhecidas lá fora?
Cavusgil - Há casos de companhias que nascem globais e que fazem bons progressos. Uma delas é a marca de biquínis Mulata (que tem loja nos Estados Unidos) e outras como a Tecsis (de tecnologia eólica). O mercado internacional é muito lotado, temos os chineses, indianos e outros asiáticos, como Taiwan e Malásia, que estão dominando. É claro, sempre temos os europeus e os Estados Unidos também.
Por isso é difícil. A aquisição da Anhauser Bush pela cervejaria InBev foi noticiada bastante lá fora, porque é uma estratégia bem interessante da empresa brasileira comprar uma das maiores cervejarias do mundo. Outra empresa de investimento comprou o Burguer King, caso que também ficou famoso. Mas esses são investidores, empresas de capitais, e não organizações criadas e geridas por brasileiros.