Já parou para pensar por que, mesmo em posições de liderança, muitas vezes insistimos em decisões que parecem sabotar o futuro da organização? Por que gestores experientes repetem erros conhecidos, ignoram dados, seguem impulsos — como se estivessem testando a resiliência do sistema ou desafiando as leis do bom senso corporativo?
Seria, talvez, uma forma sutil de desafiar a previsibilidade do planejamento estratégico, uma tentativa inconsciente de provar que a intuição ainda tem seu lugar no mundo das planilhas? Como líderes que se rebelam contra o próprio legado, como executivos que ignoram a governança em nome de uma “visão pessoal”?
Ou seria um grito de autonomia? Uma maneira de dizer que nós, os tomadores de decisão, queremos provar que podemos ir além dos frameworks, dos conselhos, dos manuais de compliance?
“Disciplina é liberdade.” A frase de impacto, que muitos conhecem, mas poucos praticam, nunca foi tão verdadeira no ambiente corporativo. A estrutura, os processos, os rituais de uma boa governança não são prisões, mas ferramentas que ampliam a liberdade de agir com consciência, clareza e responsabilidade.
E, no entanto, frequentemente trocamos essa liberdade disciplinada por decisões impulsivas disfarçadas de ousadia. Essa troca inconsciente é o que mina a maturidade das lideranças e fragiliza as estratégias de longo prazo.
Por que somos tão ruins em decidir com estratégia? Por que, mesmo com tantos relatórios, KPIs e dashboards, seguimos tropeçando nos mesmos vieses? A resposta talvez esteja no tempo: queremos resultados agora. E o mistério do futuro gera impaciência até nos líderes mais experientes, tornando-os reféns do presente.
A verdade é que odiamos esperar. Odiamos sentir que não estamos no controle. Mas, ironicamente, quando temos o controle, muitas vezes conduzimos mal. Vai entender…
Daniel Kahneman já havia nos alertado: “Somos seres emocionais que usam a razão para justificar suas ações.” A liderança não escapa dessa lógica. Após séculos de evolução organizacional, ainda reagimos, muitas vezes, mais com o ego do que com a estratégia.
Decidir sem clareza é decidir às cegas
Tomamos decisões para acalmar ansiedades, para responder expectativas, para manter aparências. No fundo, muitas escolhas nas empresas são pedidos silenciosos de clareza e direção. São decisões que gritam por atenção para aquilo que a liderança ainda não entendeu — ou não quer encarar.
Fazemos o que “precisa ser feito”. Mas quem define isso? O mercado? O conselho? A cultura? A expectativa do acionista? A vaidade da liderança?
Seguimos como quem segura uma lanterna em meio à neblina: iluminando apenas o próximo passo e fingindo que isso basta para guiar a empresa inteira. Tomamos decisões porque é mais fácil agir do que parar para pensar. E, no caminho, vamos remendando os desvios, gerenciando crises, trocando os esparadrapos de processos que já não sustentam mais o que se tornou complexo.
O certo e o errado, no mundo dos negócios, não deveriam ser questão de opinião. Mas relativizamos. Politizamos. Convenientemente turvamos as fronteiras da ética em nome da performance. E talvez seja justamente essa linha tênue — entre a coerência e a conveniência — que define a verdadeira maturidade de uma liderança.
Enquanto isso, seguimos degustando o “elixir da inovação”, explorando novas tecnologias, metodologias e modelos. Jogamos dados com o futuro, esperando que o acaso nos recompense por nossa coragem.
Mas, no fim das contas, é sempre bom lembrar: nem sempre vence quem joga melhor. Às vezes, vence quem decide com mais consciência.