Jornada reduzida: defensores acreditam que menos horas de trabalho podem resultar em maior produtividade (Lucy Lambriex/Getty Images)
Colunista
Publicado em 30 de agosto de 2023 às 10h50.
A Reconnect Happiness at Work, em parceria com a 4 Day Week Global, está com inscrições abertas para empresas interessadas em participar de um projeto-piloto no Brasil para a implantação da semana de trabalho de quatro dias úteis.
Os defensores dessa iniciativa argumentam que ela representa uma oportunidade única para demonstrar que menos horas de trabalho podem resultar em maior produtividade.
Conceitualmente, a ideia me parece promissora. Quem não gostaria de trabalhar menos horas?
Movimentos transformadores frequentemente começam com metas aparentemente inalcançáveis que, depois de muito esforço e inovação, acabam se tornando realidade. Mudar paradigmas enraizados requer resiliência e pensamento inovador.
No entanto, ao considerar a viabilidade dessa prática no Brasil, mantenho-me cético.
O mundo empresarial funciona por meio de cadeias de valor interligadas. Pouquíssimas empresas podem se dar ao luxo de divergir do calendário padrão de seus ecossistemas.
Vamos considerar o setor de serviços: imagine que você contratou uma agência de publicidade e precisa de uma alteração urgente em uma campanha para o final de semana. Você liga na sexta-feira e descobre que seu contato não está disponível, pois já cumpriu sua cota semanal de trabalho de quatro dias.
Ou pense em um escritório de advocacia onde seu advogado está indisponível numa terça-feira crucial para uma decisão judicial. Você precisa agir rápido, mas terá que aguardar 24 horas...
Em mercados competitivos e que demandam agilidade, cenários como esses são impraticáveis. A menos que todas as principais empresas adotem essa prática simultaneamente, não vejo como manter a competitividade com um calendário desalinhado ao de clientes, fornecedores e concorrentes.
Mesmo que uma empresa considere estabelecer um sistema de plantões e rodízios, são poucas as que podem absorver os custos adicionais de manter equipes extras para isso.
Então, como iniciar tal transformação?
Apenas empresas líderes em seus mercados teriam o poder de ditar as regras e iniciar essa mudança, mas a vasta maioria das empresas não detém esse tipo de influência.
A pandemia trouxe a opção de trabalho remoto e híbrido para muitos. A satisfação dos funcionários aumentou a ponto de diversas empresas adotarem essas modalidades permanentemente.
Para trabalhadores do conhecimento, essa flexibilidade é uma grande vantagem, permitindo equilibrar melhor vida pessoal e profissional. O importante passou a ser a entrega, e não o microgerenciamento de como o trabalho é feito.
Nesse sentido, instituir uma jornada de trabalho rígida de quatro dias poderia ser um retrocesso.
O Brasil enfrenta desafios de baixa produtividade por diversos motivos já conhecidos. Antes de pensar em reduzir a jornada de trabalho, precisamos focar em tornar o país mais produtivo e competitivo. Sem eficiência, não haverá geração de riqueza nem distribuição de renda.
Marcelo Vidigal escreve sobre como a tecnologia e inovações influenciam empresas e seus modelos de negócios.