Mercado imobiliário

Salas comerciais podem ter se tornado mau investimento

Excesso de oferta, precificação incorreta e más perspectivas econômicas podem derrubar a rentabilidade de novas salas comerciais em alguns bairros de São Paulo


	Alguns bairros com menos tradição comercial podem ter tido excesso de oferta
 (Dragan Sasic/ stock.xchng)

Alguns bairros com menos tradição comercial podem ter tido excesso de oferta (Dragan Sasic/ stock.xchng)

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Da Redação

Publicado em 30 de dezembro de 2013 às 17h52.

São Paulo – Investidores de imóveis comerciais devem ficar atentos e tomar cuidado se pretendem obter uma renda com aluguel ao investir em salas comerciais em alguns bairros de São Paulo. Segundo especialistas ouvidos por EXAME.com, muitas das salinhas comerciais lançadas recentemente podem estar caras e não sustentar os preços dos aluguéis estimados por muito tempo. Lançados em bairros sem tradição corporativa, esses empreendimentos começam a ser entregues a partir da segunda metade deste ano e podem sofrer com um excesso de oferta, conjugado com um cenário econômico que já não ajuda.

Até 2007, o mercado de imóveis corporativos em São Paulo se concentrava no segmento de lajes corporativas de alto padrão, chamadas “triple A” (AAA). De lá para cá, a escassez de imóveis AA ou A, com salas menores, levou as incorporadoras a lançarem um grande número de empreendimentos em bairros sem tradição comercial – predominantemente residenciais até então. Mas o que parecia um bom negócio inclusive para o investidor pessoa física, que investir diretamente nesse tipo de imóvel, pode acabar se revelando um “mico”.

“Especialmente nos anos 2010 e 2011 foram lançados muitos edifícios. Alguns bairros estão inflados, pois não tinham nenhum empreendimento e de repente pipocaram vários, que vão concorrer uns com os outros. Uma boa fatia desses escritórios entra no mercado para locação, e vai haver um provável encalhe em alguns bairros. A consequência é que o preço do aluguel vai cair para se tornar mais competitivo”, explica Luís Paulo Pompéia, diretor da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp).

Os problemas das salinhas

Para João da Rocha Lima, professor do núcleo o de Real Estate da Poli-USP, não só foram lançados muitos empreendimentos como também foram exagerados os preços de venda e os valores estimados dos aluguéis. “Os imóveis foram precificados de acordo com uma expectativa de aluguel muito alta, baseada em um momento em que os preços dos aluguéis estavam no pico”, diz o especialista. Ele se refere aos anos de 2010 e 2011, que serviram como base para estimar o aluguel de boa parte das salinhas comerciais lançadas recentemente.

Segundo ele, os empreendimentos que forem entregues do segundo semestre de 2012 em diante provavelmente estarão caros e com uma precificação de aluguel muito elevada, insustentável no longo prazo. O professor inclusive alertou para a formação de uma bolha das salinhas comerciais em meados do ano passado, em uma carta trimestral do Núcleo de Real Estate da Poli-USP ao público.

Lima explica que, para valer a pena, o investimento em um imóvel comercial deve gerar uma renda com aluguel relativamente estável por um período longo de tempo, que deve ser de pelo menos 20 anos. Ele diz que pode levar até uns 12 ou 15 anos apenas para se recuperar um investimento em uma sala comercial. “Se você considerar as previsões econômicas para os próximos dois anos, você sabe que não vai haver grandes demandas por novos espaços. A tendência é que os aluguéis venham para baixo. Quem está investindo agora está admitindo que o aluguel vai se manter alto nos próximos 20 anos”, diz o professor.


Além da grande oferta, da precificação possivelmente equivocada e do cenário econômico pouco animador para manter patamares elevados de aluguel, há ainda um quarto fator para prejudicar os valores dos aluguéis das salinhas comerciais, e que diz respeito a um risco intrínseco ao negócio. Um edifício cheio de salas comerciais pode não se manter competitivo ao longo de 20 anos, tornando-se ultrapassado frente a empreendimentos mais modernos, ou mesmo passando a receber inquilinos que deteriorem a imagem das demais unidades.

Além disso, são inúmeros os proprietários e os inquilinos, o que torna toda decisão e resolução de problemas mais difícil e pode impactar negativamente na competitividade de longo prazo do empreendimento. “O proprietário não tem domínio sobre a qualidade do produto. O domínio é do edifício. Se houver perda de qualidade do empreendimento, o proprietário é apenas um de centenas de outros. Qualquer questão, inclusive sobre reforma, deve ser resolvida em assembleia”, explica João da Rocha Lima.

Em função de tudo isso, o professor estima uma queda de preços de aluguéis já daqui a uns dois anos. “Se você tem uma onda de baixa ao longo do ciclo de vida, ocorre uma concorrência predatória dentro do próprio empreendimento, fora a concorrência com edifícios da mesma região. As eventuais vacâncias representam custo, sem renda”, lembra.

Para ele, um valor mais justo e rentável do aluguel nas regiões comerciais de São Paulo atualmente giraria em torno de 70 reais o metro quadrado, para um valor de investimento em torno de 6.500 a 7.000 reais o metro quadrado. Lembrando que a rentabilidade de um investimento imobiliário deve ser ao menos superior à poupança: cerca de 0,5% ao mês ou 6% ao ano. “Acontece que houve empreendimentos lançados com expectativa de aluguel de 120, 140 reais. Em áreas mais badaladas, chegaram a mais de 200 reais”, observa Lima.

Os bairros que inspiram cautela

Mas são os bairros sem tradição de imóveis corporativos e comerciais que inspiram mais cautela. O mote desses lançamentos era justamente que os novos empreendimentos comerciais de médio padrão ficassem perto de onde as pessoas moram. Contudo, houve um número expressivo de lançamentos em alguns desses bairros, o que pode ocasionar uma forte queda nos valores dos aluguéis. “O retorno pode cair para uma ordem de 0,5% ao mês, o que, especialmente para este segmento, é baixo”, diz Luís Paulo Pompéia, da Embraesp. Ou seja, algo como um aluguel de 3.000 reais para uma sala de 600.000 reais, o que ele já considera um produto não muito fácil se alugar.

De acordo com o banco de dados da Embraesp, de janeiro de 2007 a junho de 2012, foram lançadas 22.943 salas comerciais em São Paulo com até 100 metros quadrados. Veja a seguir quais os bairros que inspiram mais cautela do investidor, segundo o diretor da Embraesp, Luís Paulo Pompéia, em função do número aparentemente excessivo de lançamentos nos últimos anos:

Pinheiros
Lançados 12 empreendimentos com 1.930 unidades. Pinheiros seja talvez o bairro que mereça mais atenção. Para Luís Paulo Pompéia, haverá problema de liquidez na região por oferta excessiva e preços que ele considera altíssimos: de 16.000 a 19.000 reais o metro quadrado. Além de não ter tradição de escritórios, Pinheiros está relativamente próximo ao Itaim e à região da Faria Lima, muito mais tradicionais. O diretor da Embraesp acredita que a passagem da linha 4-Amarela de metrô pelo bairro e a renovação do Largo da Batata podem estar contribuindo para inflar os preços.


Santana
Lançados 8 empreendimentos com 1.413 salas. Embora os preços estejam dentro da normalidade, entre 4.700 e 9.800 reais por metro quadrado, pode-se considerar um número alto de unidades.

Aclimação
Lançados 5 empreendimentos de 544 salas, com previsão de entrega entre março de 2013 e maio de 2015. “A Aclimação era um bairro predominantemente residencial, sem tradição nesse tipo de empreendimento. Em 2014 pode ocorrer algum excesso de oferta”, diz Pompéia.

Bela Vista
Lançados 4 empreendimentos, um deles na Avenida Paulista, de 653 salas. Apenas um imóvel tem previsão de entrega para janeiro de 2015; o resto já está em vias de conclusão. “Pode ocorrer algum problema de falta de liquidez já neste ano. A região da Paulista já tem uma quantidade expressiva de conjuntos comerciais usados”, diz o diretor da Embraesp.

Brooklin
Lançados 7 empreendimentos, de 1.555 salas. Uma boa parte deles prevista para 2014. Apesar de o bairro, que também é bastante residencial, ter tradição nesse tipo de empreendimento, Pompéia considera a quantidade de lançamentos um pouco acima do normal para a região. “A menor sala tem 23,19 metros quadrados. É uma ‘micro’ sala. Deve ainda ter um banheiro. A maior delas tem 72 metros quadrados”, observa.

Moema
Lançados 8 empreendimentos com 934 salas. “O bairro tem alguma tradição comercial, mas não costumava ter grande número de lançamentos de escritórios pequenos. Então parece ser uma quantidade um pouco alta. E certamente haverá outros empreendimentos no bairro com mais de 100 metros quadrados”, diz Pompéia.

Morumbi
Lançados 4 empreendimentos com 1.291 salas. Não é um número muito expressivo de empreendimentos, mas sim de salas. Há, portanto, uma grande concentração: 270 unidades em um empreendimento, 298 unidades em outro e 500 unidades em outro. Para Luís Paulo Pompéia, essa concentração pode levar a uma certa dificuldade de liquidez.

Perdizes
Lançados 5 empreendimentos de 1.067 salas, a maioria prevista para o período entre agosto de 2013 e maio de 2014. Pompéia considera o número de lançamentos alto para o bairro, embora o preço do metro quadrado não seja tanto, variando entre 6.600 e 10.000 reais. “No começo de 2014 pode começar a ocorrer algum problema de ocupação. Ou será difícil vender, ou será difícil alugar”, acredita.

Vila Leopoldina
Foram lançadas 1.770 unidades, número considerado um pouco alto por Luís Paulo Pompéia. Para ele, o bairro inspira cautela, ainda que tenha vocação para empreendimentos comerciais de qualquer porte, por sua boa localização. O bairro tem fácil acesso para as Marginais Pinheiros e Tietê, assim como para as Rodovias Castelo Branco, Anhanguera e Bandeirantes. Além disso, conta com a proximidade de estações de trem e metrô. Ainda assim, em função do grande número de unidades, o sucesso de um investimento na região pode depender de detalhes, como o número de vagas na garagem.

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