Pessoas usam máscaras em aeroporto: aéreas permitem adiar viagens para a China e a Itália até junho (Dinuka Liyanawatte/Reuters)
Marília Almeida
Publicado em 27 de fevereiro de 2020 às 15h53.
Última atualização em 28 de fevereiro de 2020 às 15h19.
O Coronavírus Covid-19, já se espalha por 30 países, inclusive na Europa e no Brasil, acendendo um alerta para quem tem viagem marcada nos próximos meses. Além de milhares de voos para a China cancelados até março, eventos adiados e pontos turísticos fechados, há a dúvida sobre quão seguro é viajar para locais que registram casos da doença.
Para Eduardo Martins, diretor do buscador de voos Viajala.com.br, é importante que o viajante se sinta confortável com a decisão que tomar, seja ela de manter ou de cancelar os planos. "Viagens costumam ter como objetivo o prazer, o descanso, o relaxamento", aponta. "Se o turista está com medo e vai viajar achando que pode ser contaminado a qualquer momento, talvez seja melhor adiar os planos para não desperdiçar tempo e dinheiro."
As regras de companhias aéreas costumam não permitir alterações e cancelamentos gratuitos nas passagens emitidas com as tarifas mais baratas, e vários hotéis e pousadas também não oferecem a opção. Porém, em situações especiais de crise, como essa, é comum que as empresas sejam mais flexíveis, especialmente para bilhetes comprados até o fim de janeiro ou começo de fevereiro, quando o surto começou a tomar maiores proporções.
Veja abaixo as alternativas atualmente oferecidas pelas companhias aéreas e hotéis no caso de viagens para a China e Europa:
A Qatar Airways, do Catar, a francesa Air France e a holandesa KLM são algumas das empresas que cancelaram seus voos para a China até o fim de março e qualquer passageiro que voaria para lá nesse período pode cancelar ou alterar gratuitamente sua reserva.
A KLM e a Air France estão permitindo também que os viajantes adiem viagens que estão mais distantes, empurrando o embarque de maio para junho, por exemplo, ou que troquem o destino sem taxa de alteração.
A Turkish Airlines também adotou a mesma política, autorizando quem voaria em fevereiro e março a cancelar seu voo gratuitamente ou viajar até o fim de maio de 2020.
Já a chinesa Air China está fazendo alterações e cancelamentos sem custo, remarcando as passagens para qualquer data até o fim de junho, sem cobrar a diferença de tarifa mesmo para voos mais caros.
Na Emirates, dos Emirados Árabes, quem ia voar para Guangzhou ou Xangai, na China, até o fim de abril de 2020, pode cancelar a viagem e receber o valor integral da passagem ou redirecionar seu voo para Pequim ou Hong Kong, sem pagar a diferença de tarifa, até o fim de junho de 2020. Quem quiser viajar até abril também pode escolher entre outros destinos operados pela companhia, como Cingapura, Tailândia, Vietnã, Emirados Árabes e Seychelles.
A American Airlines está cancelando ou alterando gratuitamente as reservas de quem viajaria até o fim de abril, permitindo que a passagem seja usada até o fim de junho e desviada, preferencialmente, para o Japão. Quem quiser alterar origem e destino poderá usar a passagem por até 331 dias depois da data original.
É recomendado entrar em contato com a companhia aérea o quanto antes e estar atento às suas redes sociais. "Essas orientações são atualizadas constantemente, conforme o avanço da doença, e tanto as datas permitidas para trocas quanto os países de destino podem mudar a qualquer momento", avisa Martins.
Algumas empresas estão isentando o consumidor da diferença tarifária. De qualquer forma, se o viajante optar por um destino cuja passagem está mais barata do que a comprada inicialmente, pode ser que ele não receba nenhum tipo de estorno, como é o caso da KLM, ou fique apenas com um saldo de crédito na companhia aérea para usar em uma próxima compra. "Dependendo do caso, pode valer mais a pena pedir o cancelamento do voo, garantindo o reembolso total, e comprar por conta própria a passagem mais barata", recomenda o executivo do Viajala.
Embora todas as companhias aéreas que voam do Brasil para a China tenham revisado suas políticas de cancelamento e alteração (algumas até deixando de voar para o país), são poucas as que já atualizaram essas regras para voos com destino a outros países, especialmente a Itália, que já registrou 12 mortes e mais de 370 casos confirmados de coronavírus.
A KLM e a Air France informaram que seguem operando seus voos para a Itália normalmente, mas que fizeram essa semana alterações nas regras de cancelamento para passagens para o Norte da Itália (Milão, Veneza e Bolonha), região mais afetada, emitidas originalmente até 25 de fevereiro. Elas poderão ser remarcadas para voar até o fim de março, mas as empresas devem ser avisadas até o começo do mês.
Já a Latam está cancelando sem custo as reservas de quem comprou passagem para Milão ou alterando para até 15 dias depois da data original do voo, sem multa e sem cobrança de diferença de tarifa. Quem quiser adiar seu voo para mais de 15 dias depois ou mudar a cidade de destino não pagará multa, mas estará sujeito a pagar a diferença tarifária.
A hospedagem já paga também pode ser um problema para quem precisa cancelar a viagem, já que vários hotéis não devolvem o valor total quando as diárias são canceladas.
Redes como a Ascott, de Cingapura, e a Accor flexibilizaram sua política para hospedagens até o dia 31 de março, permitindo cancelamentos e alterações sem custo nas suas unidades de China, Hong Kong, Macau e Taiwan. Os hotéis Radisson também permitem mudanças na reserva de quem vai para a China sem cobranças extras.
O Airbnb, que possui uma cláusula de causas de força maior que obriguem hóspedes ou anfitriões a alterar ou cancelar viagens, também está reembolsando os viajantes que fizeram reservas na China até o começo de fevereiro de 2020 para viajar até o início de abril de 2020.
Enquanto a situação não se define, Eduardo Martins recomenda que seja dada preferência por hotéis que oferecem cancelamento gratuito e reembolso integral, mesmo que a viagem esteja a meses de distância ou seja para países que ainda não registram casos.
"É difícil ter flexibilidade nas passagens, já que a tarifa que permite alterações costuma ser mais alta, mas a oferta de hospedagem é maior que a de companhias aéreas, e é comum que bons hotéis permitam que o usuário cancele a estadia sem custo semanas ou até dias antes do check-in", explica.
"Não sabemos o que vai acontecer nos próximos meses e é melhor optar por lugares que facilitem a desmarcação, para minimizar o transtorno de cancelar uma viagem", conclui o diretor do Viajala.
O consultor de gestão empresarial Ricardo Antunes, 30 anos, comprou, em setembro do ano passado, passagens para viajar para China e Japão com a namorada em abril deste ano com a United Airlines, fazendo escala nos Estados Unidos. Com o surto do Coronavírus, Ricardo preferiu manter a viagem, mas descartar a visita à China.
"Como se trata de uma passagem promocional muito barata, não vale a pena pedir o reembolso, porque dificilmente ele pagará por outra viagem para a Ásia. Por isso optamos pela alteração", explica. "Apenas excluímos a China das férias porque sentimos que ficaríamos paranóicos cada vez que alguém espirrasse ao nosso lado e tivemos medo de adoecer em um país estranho, distante e cuja língua não falamos", justifica.
Ele conseguiu fazer as alterações com a United Airlines, sem custo, mas o processo foi demorado e o desfecho, longe do ideal. Pelo grande volume de alterações sendo feitas ao mesmo tempo, com as companhias realocando milhares de pessoas, acabam surgindo ajustes engessados e ineficientes.
Para não ter a passagem cancelada, Ricardo e a namorada terão que fazer um "bate-volta" pouco convencional para Xangai, mesmo já tendo excluído a China do roteiro. "Vamos chegar no Japão no dia 18 de abril, mas somos obrigados a fazer o trecho de ida e volta de Tóquio a Xangai nesse mesmo dia, começando a nossa viagem de verdade só no dia 19", lamenta.
Na volta, a escala nos Estados Unidos também preocupa - o país não está permitindo que ninguém entre em território americano tendo estado há menos de 14 dias na China. Por isso, o casal teve que prolongar a estadia no Japão, para completar a quarentena em Tóquio e poder fazer o voo de volta. "Foram inúmeras ligações estressantes para a empresa, porque faltam informações, falta auxílio", diz. "Essa 'estadia' de algumas horas na China, além de desgastante e desnecessária, é um risco de contaminação", aponta o consultor.
Segundo o Procon, os consumidores que compraram passagem aérea ou pacote turístico com destino para Itália, ou outro país que tenha casos comprovados de pacientes infectados com o vírus, devem procurar o órgão caso decidam cancelar ou postergar sua viagem em razão da preocupação com o coronavírus.
Isso porque, nessa hipótese específica, que não tem previsão legal, é necessário negociar com a empresa que não pode se recusar a oferecer alternativas ao consumidor.
Ainda de acordo com o chefe de gabinete do Procon-SP, Guilherme Farid, "mesmo as empresas não tendo culpa, a lei reconhece que a parte vulnerável da relação é o consumidor, de modo que é ele quem merece especial proteção".