IMPOSTO DE RENDA: classe baixa é a mais prejudicada pela falta de correção na tabela (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Repórter de finanças
Publicado em 13 de setembro de 2023 às 12h49.
Desde o dia 28 de agosto, é lei: a faixa de isenção do Imposto de Renda para Pessoa Física (IRPF) aumentou para R$ 2.112,01. Antes da atualização da tabela progressiva do Imposto de Renda, a isenção era para quem ganhava até R$ 1.903,98. O aumento beneficia as camadas mais baixas da população, mas, segundo especialistas, ainda está longe do ideal.
Um levantamento publicado pelo Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal) aponta que, caso a tabela do IRPF fosse corrigida com base no IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), a faixa de isenção em 2023 deveria ser de R$ 4.631,25.
"Embora a medida seja importante e urgente, pois desonera trabalhadores de menor renda, ainda é preciso ampliar mais a faixa de isenção. A correção da tabela para as rendas médias também é importante e justa, e seria possível se os ricos passassem a pagar imposto de renda como no resto do mundo", comenta Isaac Falcão, presidente do Sindifisco Nacional.
Com a nova faixa de isenção, devem ficar isentas da declaração do Imposto de Renda de 2024 cerca de 10,1 milhões de pessoas. É o que estima a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco). Caso houvesse a correção integral da tabela, o Sindifisco calcula que 16,8 milhões de declarantes estariam na faixa de isenção - que, nesta situação, seria acima de R$ 4.631,25.
O estudo da Sindifisco compara as faixas de renda e alíquotas atuais com as "ideais", caso fossem corrigidas pelo IPCA. Segundo os cálculos, pessoas com rendimento de R$ 6 mil, atualmente, pagam R$ 765,04. Na tabela corrigida, esse valor seria R$ 102,66, ou seja, os contribuintes estão pagando R$ 662,38 a mais.
Já o contribuinte com renda mensal tributável de R$ 10 mil paga atualmente R$ 1.865,04. Se houvesse a correção, a dedução seria de R$ 696,15, o correspondente a R$ 1.168,89 a menos.
Ambos os contribuintes, quem ganha R$ 6 mil ou R$ 10 mil, estão pagando valores a mais, segundo o estudo, por conta da defasagem da tabela. Contudo, quando olhado em termos de porcentagens, a pessoa de menor renda desembolsa 645,25% a mais, enquanto a de maior renda paga "apenas" 167,91%.
"Percebe-se, aqui, em números, o que já foi colocado acima: o ônus da não correção da tabela é maior para os que ganham menos, ofendendo o princípio da capacidade contributiva", relata o estudo.
Apesar de enfatizar a importância da correção da tabela, o presidente do Sindifisco ressalta que as novas faixas implicariam em uma renúncia fiscal de R$ 108,02 bilhões. Portanto, a entidade defende que a correção deve vir acompanhada de medidas de compensação dessa perda.
Desde 2016, a tabela do IRPF não era corrigida. Neste ano, houve a correção, mas somente para a primeira faixa. Essa falta de reajuste para as outras quatro faixas, segundo o Sindifisco, prejudica a classe média.
O prejuízo ocorre porque, na teoria, esta parcela da população teve um aumento no salário e, consequentemente, um aumento proporcional de tributação. Mas, na prática, o estudo explica que não é um aumento real da renda e, sim, apenas o valor do dinheiro sendo corrigido.
Para Luiza Leite, advogada tributarista e sócia no Silva Gonzaga Leite advogados, com o aumento do salário mínimo para R$ 1.320, uma parcela da população teve seu salário reajustado, já que o salário mínimo serve como referência para muitas empresas. Nesse caso, se o governo não tivesse aumentado a faixa de isenção, as pessoas que tiveram um reajuste passariam a pagar o IR.
"Uma pessoa que recebesse um pouco mais de um salário mínimo, já teria que pagar imposto, se tornaria contribuinte. Como temos também a questão da inflação, o custo de vida dessa pessoa que teve o salário reajustado, se manteve. Então estas pessoas deveriam ter direito a isenção", destaca Leite.
Felipe Rei, sócio na Vieites, Mizrahi, Rei Advogados e pós-graduado em Direito Tributário, concorda com a visão. “Embora tenha ocorrido um reajuste para aumentar a faixa de isenção, a tabela do IRPF ainda se encontra defasada, tendo em vista que não foi corrigida em relação à inflação oficial nos últimos anos”.
O especialista ainda cita outro estudo da Unafisco, que mostra que desde 1996 até os dias atuais, estima-se que a tabela acumula defasagem de 147,40%.
Uma das alternativas para aumentar a arrecadação, de acordo com o estudo do Sindifisco, é a tributação de lucros e dividendos, que voltou ao radar do governo com a tramitação da reforma tributária. Para o presidente da entidade, taxar as modalidades poderia ser um caminho para reduzir o peso fiscal das camadas mais baixas, já que distribuiria a arrecadação para a parcela mais rica.
“Vivemos em um país em existe privilégios tributários. A parcela mais rica da população não vive da renda do trabalho, mas sim, de lucros e dividendos, que não são tributados. A falta de correção da tabela também penaliza os mais pobres”, afirma Falcão.
Contudo, Luciana Pantaroto, planejadora financeira CFP pela Planejar, ressalta que a discussão, à primeira vista, pode parecer uma solução simples, passar a tributar algo que antes não era. Porém, ela alerta que o movimento poderia desencadear uma série de impactos.
“Deve-se analisar possíveis distorções no mercado em consequência da medida, como desincentivar a distribuição de lucros aos sócios da empresa. Este é um tema polêmico e complexo que deve ser debatido e estudado com maior profundidade, em especial quanto aos impactos econômicos, antes de qualquer alteração na lei”, pontua.
Pantaroto também afirma que outra forma visada pelo governo para reduzir o déficit da arrecadação gerada pelo aumento da faixa de isenção, é a alteração na tributação de fundos exclusivos e investimentos no exterior. As propostas tramitam no Congresso via Medida Provisória e Projeto de Lei, respectivamente, e foram recebidas com cautela pelo mercado.