Jennifer Risher: a autora escreveu o livro "Nós precisamos conversar: uma autobiografia sobre riqueza" (Jim Wilson/The New York Times)
Carolina Ingizza
Publicado em 27 de setembro de 2020 às 18h40.
Última atualização em 29 de setembro de 2020 às 18h09.
Jennifer Risher aceitou um emprego no campus de recrutamento da Microsoft em 1991. Tinha 25 anos e lhe ofereceram opções de ações no valor de centenas de milhares de dólares. Enquanto trabalhava lá, conheceu seu marido, David, que tinha mais opções de ações do que ela. Mais tarde, ele foi trabalhar na Amazon, quando esta ainda vendia somente livros, e conseguiu opções ainda mais valiosas lá.
Em poucos anos, eles valiam dezenas de milhões de dólares e estavam a caminho de uma vida confortável. Quando Jennifer Risher faz uma recapitulação, foi a sorte ou foram as boas decisões que a ajudaram a conseguir aquele emprego na Microsoft?
Ela faz essa pergunta e outras em seu livro, "We Need to Talk: A Memoir About Wealth". Elas tentam estimular o pensamento crítico sobre o dinheiro, o status e o poder que derivam dele.
"A riqueza não se parece com o que Hollywood nos vende. Quero desmistificá-la – uma experiência que milhões de pessoas têm, mas da qual não podem falar. Há uma normalidade quando todos os seus amigos são igualmente ricos", disse ela.
Fazer perguntas difíceis sobre dinheiro é um exercício importante para entender o que temos, como o conseguimos e como nos sentimos em relação a isso.
Claro, as perguntas que as pessoas normalmente se fazem sobre sua riqueza dependem de perspectiva. Risher, por exemplo, é branca e cresceu na classe média – seu pai trabalhava no ramo de seguros e sua mãe era dona de casa quando Risher e seu irmão eram pequenos, antes de retomar a carreira de bibliotecária.
Risher frequentou uma faculdade privada de humanas na Costa Leste dos EUA, algo que não a preparou para as dezenas de milhões de dólares que ela e o marido acabariam adquirindo.
As abordagens também diferem daquelas entre acadêmicos e conselheiros de finanças, cujo trabalho é fazer com que as famílias sejam discretas em relação à sua riqueza. Entrei em contato com vários deles para obter sua opinião sobre as questões de Risher e perguntar-lhes quais destas consideravam as mais difíceis, e quais eles recomendavam que as pessoas se perguntassem.
Aqui estão quatro questões que se destacaram:
"Acho que essa é uma pergunta muito importante, particularmente quando você ganha dinheiro rapidamente. Se você não tem uma boa resposta para isso, vai sabotar a si mesmo. Vai encontrar maneiras de se livrar dele", afirmou Bradley Klontz, professor associado de Psicologia Financeira da Universidade Creighton.
Uma coisa que é preciso entender ao responder a essa pergunta é o risco de comparação social. Não importa quanto dinheiro você tenha, as pessoas se comparam às outras quase instintivamente. "É o profundo terror subconsciente que sentimos com a probabilidade de sermos isolados de nossa tribo, algo que poderia nos matar", disse Klontz.
Segundo ele, também é algo que pode levar as pessoas que têm dinheiro a fazer menos do que poderiam. Sua próxima pergunta é: qual o significado que uma vida de riqueza deve ter? "Nosso propósito é lutar por nossa sobrevivência diária. Qual é meu propósito quando esse propósito me é tirado?"
Sem uma intenção, os ricos tendem a ficar desconectados da variedade de pessoas que conheciam antes de se tornarem ricos. "Estamos aqui para fazer do mundo um lugar melhor, no entanto estamos definindo o mundo. É a responsabilidade e a oportunidade", observou Klontz.
Em que você pensa quando ouve essa pergunta diz mais sobre você do que a pergunta em si. É uma questão em aberto, fazendo com que seja ótima para discussão. Mas também força as pessoas a ser contemplativas.
"As pessoas podem se surpreender consigo mesmas. Viver bem significava, em determinado momento, sucesso na carreira. Ou significava ser o melhor pai que eu poderia ser, ou me perdoar por erros ou escolhas que acabaram sendo diferentes. Todas essas coisas não têm nada a ver com dinheiro, mas o dinheiro pode ser um meio para escolhas felizes ou infelizes. Saber o que significa viver bem norteia essas escolhas", explicou Keith Whitaker, presidente da Wise Counsel Research, consultoria sobre riqueza familiar e filantropia.
Whitaker disse que até os mais introspectivos começaram listando as armadilhas superficiais do bem viver – casas, carros, barcos, viagens. Mas quando as pessoas param e pensam nessas respostas, muitas vezes conseguem ir além. "É então que elas percebem: 'Não quero apenas essas coisas. Quero essas coisas com bons amigos, ou um bom relacionamento com meus filhos e netos.' Ou: 'Quero essas coisas com um senso de integridade.'"
É aí que essas perguntas podem levar as pessoas a pensar em seu dinheiro como mais do que apenas uma maneira de comprar o que desejam. Faz com que pensem em como querem se envolver com a família, a comunidade e o mundo.
Para Michael Liersch, chefe de assessoria e estratégias de crescimento do Wells Fargo Private Bank, essa pergunta é a primeira de três relacionadas que ele faz às famílias com as quais trabalha. (As outras: Você sente que tem o suficiente? Quem deveria estar envolvido nessas conversas?)
Uma coisa que Liersch tenta fazer com essas conversas é uma preparação para obter respostas e ideias para que os membros da família discutam, mas também tenta mostrar às pessoas que responder a essas perguntas apenas uma vez não é suficiente, particularmente agora, quando as opiniões sobre riqueza e privilégios divergem muito. "Pesquisas sugerem que, quanto mais intencionais formos com a criação de nossos princípios orientadores, maior a probabilidade de alcançá-los", apontou ele.
Essa foi uma pergunta que Risher se fez quando examinou suas principais escolhas de vida, incluindo viver no mesmo bairro que colegas de tecnologia, mandar seus filhos para uma escola particular e compartilhar sua riqueza com a família e os amigos. "Mesmo para pessoas ricas, a riqueza não nos conecta. Quando ela é uma barreira a essas ligações, há um problema. Nosso silêncio em torno do dinheiro só o torna mais poderoso do que nós. Não somos capazes de ver a realidade."