Dinheiro: os mercados onde o vencedor leva tudo podem acabar criando enormes diferenças de riqueza entre quem teve sorte e quem não teve (Thinkstock/SIphotography)
Da Redação
Publicado em 1 de setembro de 2016 às 17h49.
Robert Frank estava jogando tênis em uma fria manhã de sábado em Ithaca, Nova York, quando seu coração parou. Uma parada cardíaca repentina -- um curto-circuito na sinalização elétrica do coração -- mata 98 por cento das vítimas e deixa o restante com sequelas permanentes.
No entanto, duas semanas depois, Frank estava de volta à quadra de tênis.
Como isso aconteceu? Houve um acidente de trânsito a poucos metros do lugar onde Frank colapsou. Duas ambulâncias responderam, mas as lesões eram leves e só uma delas foi necessária.
A outra ambulância, que normalmente fica a oito quilômetros dali, chegou a Frank em questão de minutos.
“Hoje estou vivo por pura sorte”, diz Frank, de 71 anos, professor de economia da Universidade Cornell. Ou por milagre. De qualquer modo, não cabe a Frank o mérito de ter sobrevivido naquele dia.
Por coincidência ou por obra divina, ele foi atendido. Nove anos depois, ele continua debatendo-se com o conceito de sorte. E, aplicado a seu campo da economia, esse conceito levou-o a um território perigoso: a riqueza.
Coloque sorte e dinheiro na mesma frase, diz ele, e se prepare para enfrentar uma “fúria desenfreada”. A senadora americana Elizabeth Warren, de Massachusetts, e o presidente dos EUA, Barack Obama, foram ridicularizados por sugerir que os americanos ricos deveriam agradecer ao que Obama chamou de “este inacreditável sistema americano que temos e que possibilitou que vocês prosperassem”.
Até se referir aos ricos como “os mais sortudos de nós” -- como eu fiz há alguns meses -- pode desencadear algumas reações desvairadas.
“Existem pessoas que simplesmente não querem nem ouvir falar da possibilidade de que elas não tenham feito tudo por conta própria”, diz Frank.
Mercados onde o vencedor leva tudo
Primeiro, Frank quer deixar claro que sim, você construiu tudo isso -- em sua maioria. Bill Gates, Warren Buffett ou qualquer outra pessoa muito bem-sucedida não foi simplesmente sortuda.
“É claro que a maioria dos grandes vencedores no mercado é extremamente talentosa e trabalhadora”, escreve ele.
Será que Gates poderia ter alcançado essa riqueza sem nenhum golpe de sorte? Claro que é possível. Mas a teoria de Frank é que nossa economia está mudando de forma a amplificar o papel da sorte em fazer a diferença.
Os mercados onde o vencedor leva tudo podem acabar criando enormes diferenças de riqueza entre quem teve sorte e quem não teve. Uma pessoa -- inteligente, persistente, mas sem sorte -- enfrenta dificuldades, enquanto uma pessoa igualmente (ou até um pouco menos) talentosa e trabalhadora tem um golpe de sorte que lhe rende milhões, ou bilhões, de dólares.
Não podemos controlar nossa sorte, então o que podemos fazer? Frank diz que a única solução é investir mais em educação, infraestrutura e em todas as outras coisas que sabemos que contribuem para que todos sejam bem-sucedidos.
Quanto mais se gastar nesses bens públicos, mais as pessoas terão uma chance de ter sorte, diz ele. Isso, é claro, implica impostos mais altos. Mas Frank, sempre diplomático, assegura aos ricos que não vai doer tanto quanto eles poderiam temer.
Frank sabe que é difícil convencer as pessoas de seu argumento. Mas certa perspectiva ajuda: o consenso político pode mudar rapidamente se bons argumentos forem apresentados, defende ele.
Por isso, ele quer passar o resto da vida -- os anos adicionais que lhe foram concedidos naquela quadra de tênis nove anos atrás -- explicando por que estaríamos muito melhor se reconhecêssemos nossa sorte.
“O simples fato de que uma pessoa exista é muito improvável astronomicamente”, diz Frank. “O fato de você estar aqui para viver, respirar e admirar um pôr do sol -- é algo inacreditavelmente improvável”.