Apesar de excessivamente otimista, brasileiro é mais preocupado e alterou o nível de risco da sua carteira de aplicações na crise (iStock/Abril Branded Content)
Marília Almeida
Publicado em 26 de agosto de 2020 às 13h29.
Última atualização em 28 de agosto de 2020 às 23h01.
Os investidores do mundo todo, inclusive do Brasil, esperam, de maneira excessivamente otimista, um retorno médio anual superior a 10% em investimentos nos próximos cinco anos, apesar da incerteza causada pela covid-19. A constatação é do Schroders Global Investor Study 2020, estudo global realizado pela gestora de investimentos com sede no Reino Unido.
As expectativas médias de retorno anual para os próximos cinco anos chegaram a 10,9%, de acordo com o levantamento, que ouviu mais de 23 mil investidores, de 32 locais ao redor do planeta. Foram consideradas pessoas que investirão pelo menos 10 mil euros (ou o equivalente) nos próximos 12 meses e que fizeram alterações em seus investimentos nos últimos 10 anos.
No Brasil, os cerca de mil investidores entrevistados esperam obter um retorno total médio anual (crescimento de receita e capital) mais elevado do que a média global: 13,3%. A expectativa de retorno mais otimista dos brasileiros está alinhada com a da média nas Américas, de 13,2%. Atualmente, a taxa de juros está em 2% ao ano.
Ainda assim, o Brasil ficou na sétima posição no ranking dos mais otimistas. Na comparação entre países, os investidores nos EUA (15,4%), Indonésia (14,8%) e Argentina (14,6%) foram os mais otimistas. No outro extremo da escala, os menos otimistas eram os investidores no Japão (6%), Suíça (7%) e Itália (7,9%).
No Brasil, a expectativa de retorno para os próximos 12 meses também ficou acima da média global, em 10,2%, praticamente estável em relação ao esperado no ano passado (10,3%).
Juliana Machado, especialista em fundos da EXAME Research, além dos juros baixos, a proliferação de informações sobre investimentos dá a sensação aos brasileiros de que são capazes de investir. Esse fenômeno tem diversas vantagens, como atrair pessoas para aplicações fora da poupança e de maior risco e incentiva a poupar mais. Mas também há desvantagens. "Nem sempre essa segurança e otimismo vem acompanhada da capacidade econômica para suportar perdas e da experiência em investir. O resultado é que muitas pessoas tomam mais risco do que deveriam".
É importante que o brasileiro tome mais risco, mas também tenha investimentos diversificados conforme o seu perfil de risco e tenha uma reserva de emergência robusta em um momento de fragilidade econômica como o atual. "A sensação de que coisas tem um só caminho, e de que ele poderá ter retornos de 13% ao ano e tomar risco nos próximos cinco anos sem ter perdas no meio do caminho, é excessivo".
Apenas 6% dos investidores esperam que o impacto econômico negativo causado pelo Covid-19 dure mais de quatro anos., e 21% esperam que as ramificações da crise perdurem por mais de dois anos. Para 75% dos investidores no Brasil, o impacto econômico do Covid-19 durará entre seis meses a dois anos.
O impacto da pandemia global, no entanto, levou muitos investidores a fazer alterações substanciais em suas carteiras de investimentos, com 28% declarando que transferiram montantes significativos para investimentos de baixo risco. Outros 25% disseram que transferiram parte de seu portfólio para investimentos de menor risco.
Curiosamente, 20% confirmaram que aproveitaram a oportunidade para transferir parte de seu portfólio para investimentos de alto risco, enquanto 19% disseram que optaram por não fazer nada e mantiveram seus investimentos como estavam.
No Brasil, quando os mercados de ações passaram por um período de volatilidade em fevereiro e março de 2020, 79% das pessoas fizeram alterações em sua carteira, com 70% delas modificando o nível de risco. Entre os entrevistados no país, 27% disseram ter transferido porções consideráveis da carteira para investimentos de risco mais baixo; e 16% disseram ter transferido porções consideráveis da carteira para investimentos de risco mais alto.
“Não há como fugir do fato de que o impacto do Covid-19 nas economias, mercados e além provavelmente será substancial nos próximos anos. Mas agora, mais do que nunca, precisamos nos ater aos nossos princípios de investimento”, disse Rupert Rucker, diretor de soluções da Schroders no Reino Unido.
“Precisamos enxergar além do barulho dos mercados e nos concentrar em manter investimentos bem equilibrados a longo prazo. Isso é ainda mais importante quando as taxas de juros são tão baixas em todo o mundo”, concluiu.
No Brasil, a taxa básica de juros na mínima histórica, o câmbio desvalorizado e a crise do Covid-19 tornam a diversificação de investimentos primordial para buscar retornos acima do mercado, conforme destaca Daniel Celano, CFA, diretor da Schroders Brasil.
“É natural que um momento de incerteza gere apreensão e aversão a risco no curto prazo, mas vemos no cenário atual uma busca por mais conhecimento financeiro, bem como uma mudança relevante no portfólio dos clientes”, afirmou Celano. “A combinação de ativos locais e internacionais em renda fixa, crédito privado e renda variável é o melhor caminho para um portfólio menos volátil e com mais oportunidades de geração de retornos”.
Entre fevereiro e junho deste ano, durante a pandemia, o número de investidores pessoas físicas na B3 saltou 36%, de 1,9 milhão em fevereiro para 2,6 milhões no fim de junho, ou seja, mais de 700 mil novos investidores na bolsa em quatro meses.
Segundo a B3, o investidor pessoa física é mais jovem, preocupado em diversificar seus investimentos e demonstra visão de longo prazo ao manter suas posições mesmo no auge da volatilidade dos mercados.
A crise do Covid-19 também provocou um foco maior do investidor nas suas aplicações, com quase metade (49%) das pessoas entrevistadas afirmando que agora pensam em seus investimentos pelo menos uma vez por semana, em comparação com 35% antes da pandemia.
No Brasil, essa porcentagem é ainda maior: 65% dos investidores pensam nas suas aplicações frequentemente (ao menos uma vez na semana) desde o começo da crise. Antes da crise, a parcela era de 52%.
Além disso, 25% dos investidores globais disseram que a maior prioridade para seus gastos com renda disponível era investi-la em aposentadoria, um aumento significativo em relação a três anos, quando apenas 10% declaravam a aposentadoria como prioridade. Isso enfatiza que a conscientização sobre a necessidade de poupar para a aposentadoria aumentou.
No Brasil, as três principais prioridades para gastos com renda disponível são: aportar em outro tipo de investimento, por exemplo, ações, títulos, mercadorias (32%); investir em aposentadoria (20%); depositar na poupança (13%).
O mais importante, diz Juliana Machado, da EXAME Research, é blindar a carteira de investimentos contra eventuais tombos severos, que vão além da pandemia. "A crise de 2008 e a própria pandemia mostraram que podemos enfrentar um cenário disruptivo a qualquer momento. Por isso temos de ter cada caixa de investimento bem separada. Não podemos ter muito dólar na carteira, porque passamos a não nos proteger, mas a apostar contra o real. E não podemos ter 90% da carteira em ações quando isso não condiz com nossas visões sobre risco, mundo e também de vida".