Quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral: arrematado por 1,35 milhão em 1995, pode valer hoje mais de 45 milhões de dólares (Malba/Reprodução)
Da Redação
Publicado em 18 de outubro de 2020 às 17h10.
Última atualização em 18 de outubro de 2020 às 19h51.
No fim de setembro, o leilão de um lote de obras do ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira, do falido Banco Santos, chamou a atenção: televisionado, o evento mostrava o leiloeiro James Lisboa com dificuldade em bater o martelo.
Obras de grandes nomes da arte brasileira e internacional recebiam lances cada vez mais altos: o leilão, que projetava arrecadar 7 milhões de reais, atingiu 25 milhões de reais. Em tempos de juros baixos na renda fixa, seriam obras de arte uma boa aplicação?
“Arte não deve ser o principal investimento de ninguém. Primeiro você compra sua casinha, faz sua poupança e depois pensa nisso”, diz Heitor Reis, considerado um dos principais especialistas no assunto no país.
Reis, que ajudou o banco Plural (ex-Brasil Plural) a montar o primeiro fundo de investimento em arte, que chegou a reunir 700 obras de 200 artistas brasileiros, diz considerar quadros, esculturas e fotografias como um ativo com um bom potencial de investimento.
Colecionadores recomendam fazer uma extensa pesquisa sobre o artista em que se pretende investir.
O executivo José Olympio Pereira, presidente do banco Credit Suisse no Brasil, que coleciona arte há 30 anos e preside a Bienal de São Paulo, diz que nada garante a valorização de um artista, assim como acontece com a renda variável. “Se você fizer um estudo econômico, não acho que se possa relacionar, por exemplo, a compra de uma obra por um museu à valorização daquele artista no mercado.”
Como o retorno é incerto, vale uma máxima que também se aplica a outros investimentos: a diversificação.
Como é muito difícil prever se um artista vai “explodir” no mercado, Pereira conta ter construído uma coleção ampla e eclética. Ou seja: nada de comprar toda a obra de um artista ou de apenas uma vertente de arte. “Sempre comprei arte por paixão. E, ao longo desses 30 anos que eu compro arte, teve obras que se valorizaram e outras que não, que eu dou de presente.”
Quem não gosta de arte e investe mesmo assim pode acabar com o gosto amargo bem no meio da sala de estar. “Se você comprar arte só por investimento, ela pode deixar de ser uma fonte de prazer e passar a ser um aborrecimento à medida que não performar”, diz o presidente da Bienal.
Na visão de Reis, o melhor caminho é adquirir as obras por gosto estético e deixar que a vantagem econômica venha eventualmente, mas sem contar com ela. “Quem compra por prazer tem bem menos chance de errar.”
Como em outras classes de ativos, como ações ou imóveis, há opções mais seguras e apostas mais arrojadas. Quanto o assunto é arte, a clara vantagem está de quem tem patrimônio para assinar cheques mais altos.
Isso porque o investimento em artistas consagrados -- que exigem desembolsos de centenas de milhões de reais -- são apostas mais seguras. Ter um Di Cavalcanti, uma Tarsila do Amaral ou um Portinari na parede é uma garantia de que o investimento (quase) certamente não vai desvalorizar. O mesmo raciocínio vale para artistas contemporâneos como Adriana Varejão ou Vik Muniz.
Um exemplo é um dos mais famosos quadros da arte brasileira, o Abaporu, de Tarsila de Amaral. Comprado em 1995 pelo argentino Eduardo Constantini por 1,35 milhão de dólares, foi doado ao Malba, museu fundado pelo colecionador em Buenos Aires. O quadro não está à venda, mas teria um valor superior a 45 milhões de dólares caso fosse leiloado, disse recentemente o argentino.
Responsável pelo leilão milionário das obras de Edemar Cid Ferreira -- que arrecadou recursos para pagar os credores do Banco Santos --, o leiloeiro James Lisboa ressalva que, mesmo quando se fala de nomes consagrados, também é necessário algum conhecimento técnico sobre o tema.
“Nem toda a obra de um artista vai ter a mesma valorização. O artista é um operário, precisa criar para sobreviver. Então é preciso ter em mente que a qualidade da obra varia de peça para peça”, afirma.
Para quem não é grande colecionador e não tem milhões para montar uma coleção extensa, o jeito é apostar em artistas que ainda não tiveram saltos de preço.
“A maior parte do mercado de arte não está nos leilões conhecidos, mas em artistas cujo preço das obras hoje varia de 10 mil reais a 25 mil reais”, explica Lisboa. A resposta sobre a valorização da obra pode vir só em uma, duas ou até três décadas. Por isso, Lisboa reforça o conselho: “Compre o que te dá prazer.”