Juros: enquanto a Selic foi reduzida em 3,5 pontos percentuais de Marlo de 2013 a março deste ano, a taxa de juros média para pessoas físicas subiu 8,52 pontos percentuais para 96,49% ao ano (Milkos/Getty Images)
Natália Flach
Publicado em 9 de abril de 2020 às 10h08.
Última atualização em 9 de abril de 2020 às 19h58.
Após dois anos consecutivos de queda, as taxas de juros das operações de crédito tanto para pessoas físicas quanto jurídicas tiveram alta em março. De acordo com dados compilados pela Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a taxa de juros média geral para pessoas físicas subiu 0,03 ponto percentual ao passar de 5,76% ao mês (95,82% ao ano) em fevereiro para 5,79% ao mês (96,49% ao ano) em março. É o maior percentual desde dezembro de 2019.
Por sua vez, a taxa de juros média geral para pessoa jurídica apresentou alta de 0,05 ponto percentual no mês, passando de 3,12% ao mês (44,58% ao ano) em fevereiro para 3,17% ao mês (45,43% ao ano) em março. É a maior taxa de juros desde dezembro de 2013.
Em nota, o Bradesco afirma que "manteve todas as condições de prazos e taxas e que não mudou sua política de crédito". Já o Banco do Brasil disse que monitora constantemente as taxas de juros dos produtos de crédito para pessoas físicas e jurídicas. "Os fundamentos do mercado e a concorrência são avaliados permanentemente pelo BB nas decisões que estabelecem sua política de preços", afirma a nota, sem dar mais detalhes. Por sua vez, o Itaú Unibanco enfatiza que não aumentou suas taxas para pessoa física, micro e pequenas empresas. "Ao contrário, tem oferecido inclusive condições de renegociação e já prorrogou mais de 340 mil contratos de crédito para pessoas físicas e jurídicas", diz, em nota. "No caso de médias e grandes empresas, o custo do crédito no mercado de forma geral está pressionado pelas condições adversas. Ainda assim, apenas na última semana, o Itaú BBA quadruplicou a sua oferta." Procurados, os demais bancos ainda não responderam ao pedido de entrevista feito pela EXAME.
A alta pode ser atribuída ao momento econômico atual de incertezas provocada pela pandemia de coronavírus e suas possíveis implicações, como recessão econômica e aumento do desemprego. “O ambiente de provável elevação dos índices de inadimplência aumentou substancialmente o risco do crédito fazendo com que as instituições financeiras elevassem os juros”, explica Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor executivo de estudos e pesquisas da Anefac, em nota.
A mudança no cenário fez com que as grandes empresas tenham hoje menos opções para captar recursos. Até a eclosão da crise, elas podiam recorrer ao mercado de capitais ou aos bancos. No atual cenário, entretanto, os investidores estão com menos apetite a risco e algumas companhias tiveram de adiar suas ofertas iniciais de ações (IPO, na sigla em inglês) e emissões de dívida.
Naturalmente, as que não podem aguardar a volta do mercado de capitais procuraram os bancos, que agora lidam com custos maiores de captação e de capital, graças ao aumento da percepção de risco do país. "Com isso, as grandes empresas precisam negociar as condições bancárias caso a caso. Isso não significa obrigatoriamente um aumento de juros. Mas pode acontecer em segmentos específicos ou em linhas específicas", diz um executivo do setor financeiro que não quis se identificar.
No fim de março, a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), a Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) e a Associação Brasileira de Franchising (ABF) enviaram ao Banco Central e ao ministério da Economia uma carta solicitando, entre outras medidas, que atuem de modo a "evitar a elevação desmedida das taxas de juros e solicitações desproporcionais de garantias que inviabilizam o acesso às operações de crédito já existentes no mercado". Em nota, o BC afirmou que está analisando todos os pleitos que tem recebido e o ministério disse que não comenta medidas em estudo.
Para as pequenas e médias empresas com faturamento anual de até 10 milhões de reais, foi criado um fundo emergencial voltado para o financiamento da folha de pagamento. O objetivo é garantir a sobrevivência dos pequenos negócios e, consequentemente, preservar postos de trabalho. "Fizemos um estudo que mostrava que a folha de pagamento respondia por 45% a 50% dos gastos das PMEs, por isso focamos nessa questão", explicou Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, em transmissão realizada na quarta-feira com executivos do Credit Suisse.
Essa linha, que financiará dois meses de folha de pagamento, receberá 85% de funding do Tesouro Nacional, recursos que serão aportados em um fundo a ser administrado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e 15% de bancos como Bradesco, Santander e Itaú Unibanco, que serão responsáveis pelo repasse dos recursos a seus clientes.
Os tomadores terão seis meses de carência, e o pagamento parcelado em até 36 meses, com uma taxa de juros equivalente ao CDI, ou seja, sem cobrança de spread. As empresas clientes dos bancos que solicitarem os recursos para o financiamento da folha de pagamento serão submetidas à análise de crédito das instituições financeiras.
De março de 2013 a março deste ano, a taxa básica de juros da economia, a Selic, foi reduzida em 3,5 pontos percentuais de 7,25% para 3,75%. No mesmo período, a taxa de juros média para pessoas físicas aumentou 8,52 pontos percentuais de 87,97% para 96,49% ao ano; enquanto nas operações de crédito para pessoa jurídica houve uma elevação de 1,85 ponto percentual de 43,58% para 45,43% ao ano.