Dólares: a maior parte desses investimentos novos elimina variações da moeda americana. (Susana Gonzalez/Bloomberg)
Da Redação
Publicado em 14 de novembro de 2017 às 18h01.
Última atualização em 16 de novembro de 2017 às 11h38.
O investimento de brasileiros no exterior por meio de fundos está crescendo aceleradamente este ano.
Segundo dados levantados pela J.P.Morgan Asset Management, o patrimônio total de fundos brasileiros com investimentos globais passou de R$ 6,5 bilhões em fevereiro do ano passado para R$ R$ 10,6 bilhões em agosto deste ano, um aumento de 64%. Já o total de investidores nesses fundos subiu de 5.490 em fevereiro deste ano para 34.836, um aumento de mais de 500% no período.
“Em outubro, esse número já ficou perto de 50 mil cotistas”, afirma Giuliano de Marchi, responsável pela área de produtos para América Latina do J.P. Morgan. Ele participou do Congresso de Planejamento Financeiro 2017.
Hedge cambial
A maior parte desses investimentos novos foi feita com hedge cambial, que elimina os impactos da variação do dólar sobre os investimentos. Do total, 62,2% do patrimônio dos fundos globais tem hedge, bem mais que os 3,4% do volume financeiro de fevereiro de 2016. O que mostra que o brasileiro está disposto a diversificar suas aplicações no exterior, mas ainda não quer diversificar com moedas, o que é um pouco incoerente. Pesquisa feito pelo J.P. Morgan mostra também 59% dos investidores consultados preferem aplicações no exterior com proteção cambial.
Risco em não aplicar no exterior
De Marchi chama a atenção para o que chama de risco dos investidores brasileiros correm ao não diversificar suas aplicações no exterior, ao lembrar que o Brasil representa apenas 3% do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas produzidas pela economia) mundial, 2% da renda fixa 1% do valor de mercado das ações do mundo. “Ao se limitar ao Brasil, o investidor brasileiro fica de fora de 97% da economia mundial, de 98% da renda fixa e de 99% das empresas do mundo”, diz.
Custo menor e mais opções
Além disso, no exterior, os fundos ativos de investimento estão sofrendo a concorrência de fundos passivos, indexados a índices, o que reduz as taxas de administração e os custos dos investimentos. Assim, pode-se investir com um custo menor lá fora e com muito mais opções que não existem aqui em diversos mercados. “No Brasil, temos uma limitação de diversificação pois não temos ativos para investir em determinados mercados ou estratégias, por isso a tendência é buscar aumentar nossa capacidade no exterior”, explica De Marchi.
Riscos de aplicar fora
Alguns riscos que podem influenciar o investidor brasileiro, explica De Marchi. O primeiro é a oscilação da moeda, que pode contaminar a aplicação e provocar oscilações que afetam emocionalmente o investidor. A saída do mercado foi criar produtos com hedge cambial. O segundo risco é de capacitação, já que o brasileiro ainda precisa de educação para entender as opções no exterior. “O brasileiro ainda é pouco sofisticado, olha tudo comparando com o CDI e vai precisar se preparar, é fundamental entender onde está investindo”, diz.
Daqui não saio
Outro problema que reduz a diversificação internacional é a tendência do brasileiro de manter seus investimentos no país, o chamado “home country bias”, afirma Eduardo Estevam Ventura, responsável pelo Itaú Private B anking. “Brasil e Portugal são os países que tem mais esse home bias”, afirma. Ele espera que a manutenção dos juros em um nível mais baixo por dois ou três anos incentive o cliente de alta renda a diversificar no exterior. “As pessoas não sabem o impacto que é uma queda dos juros de 5% reais ao ano para 4%, é uma queda na capacidade de criar riquezas de 20%”, diz. Ele vê como desafio essa nova realidade que espera os brasileiros. “Vamos precisar de mais educação financeira”, afirma.
Haja ativos para investir
Um dos problemas vai ser a falta de ativos para atender à procura dos investidores caso a queda dos juros por um longo prazo se confirme,afirma Sylvio Castro, do Credit Suisse Private Banking. “Hoje, com o juro pós-fixado alto, o CDI ou a Selic, a decisão ótima é deixar o dinheiro todo em aplicações com correção diária”, afirma. Com o juro caindo, porém, essa relação risco-retorno não vai ser mais tão interessante e crescerá a procura por renda variável. “O difícil vai ser ter escala suficiente para atender toda a demanda das instituições por renda variável”, diz. E o movimento de abertura das plataformas dos grandes bancos para gestores independentes vai reduzir o monopólio dos grandes bancos hoje em aplicações conservadoras. “O movimento de diversificação é inexorável”, afirma Castro.
Um tal de fundo no exterior
Eduardo Ventura, do Itaú, lembra também que esse aumento das aplicações no exterior neste ano ainda é feita em sua maioria, 70%, com hedge cambial e tem dúvidas se o investidor sabe mesmo onde está aplicando. “O investidor pode achar que está comprando um fundo corrigido pelo CDI e na primeira oscilação mais forte do mercado americano pode se assustar”, diz.
A festa está acabando?
Sobre os riscos de investir lá fora neste momento, especialmente com as bolsas americanas e europeias em suas máximas históricas, Sylvio Castro diz que é preciso levar em conta o impacto que uma crise externa teria também no Brasil. “Se houver uma queda forte lá fora, que ninguém se engane com o que vai acontecer aqui”, diz. Ele afirma que os cenários de “Bull market” (tendência de alta) dos mercados, como o atual, que já dura quatro anos, em geral morrem por erros de política monetária ou regulação excessiva. “E não vemos um risco iminente de regulação maior nos Estados Unidos, até o contrário”, diz.
Sobre um erro de política monetária, Castro diz que ele seria mais provável em momentos de inflação em alta, surpreendendo para cima, e os preços nos EUA e na Europa estão se comportando muito bem, mesmo com o PIB acelerando. “Claro que pode haver um estouro de uma bolha, mas é difícil dizer isso e sentar esperando por 10, 20 anos”, explica. “Você pode até estar certo, mas antes vai deixar muito dinheiro na mesa nesse tempo todo”, acrescenta.
Segundo Castro, uma alternativa é comprar seguros para eventuais quedas dos mercados, que hoje estão baratos já que todos estão otimistas. “O cenário ainda indica oportunidades no exterior, mas se a pessoa está insegura, o custo de comprar um seguro via derivativos ou opções nunca foi tão baixo”, explica.
Diversificar é melhor remédio
Já para Eduardo Castro, a alternativa para um eventual risco do mercado é a diversificação. “Nossa capacidade de prever uma guerra, por exemplo, é nula, por isso a saída é ter um portfólio equilibrado, para sobreviver a qualquer cenário, pois ninguém consegue se antecipar tanto para prever as mudanças que podem ocorrer”, explica.
Ele destaca muito a questão educacional que acompanha a diversificação no exterior. “No Brasil, temos seis estratégias principais, para 16, 17 nos Estados Unidos, ou seja, as pessoas vão ter de estudar muito mais e se preparar mais para investir”, diz. Além disso, o investidor precisará de mais ajuda para lidar com tantas opções mais complexas e com juros menores. “O trabalho educacional no Brasil vai ter de ser grande, não só pela educação financeira, mas pela tecnologia também”, afirma.
Apesar das crises
Para Giuliano de Marchi, o medo de uma crise também não significa que os mercados não possam se recuperar depois. “Lembro da crise da Rússia, em 1998, da nossa em 1999, do Bug do Milênio em 2000, das Torres Gêmeas em 2001, do Tsunami de 2004, do supprime nos EUA em 2008, depois dos PIIGS da Europa, e mesmo assim hoje o mundo está crescendo e as bolsas estão em suas máximas”, afirma.
“O investimento é risco, e todos têm de aceitar, mas a questão é que risco se está correndo”, diz. “As pessoas precisam se preparar pois o risco existe, faz parte das aplicações e o investidor precisa estar preparado”, afirma. E será o juro baixo que vai ser o grande fator que vai criar desconforto nos investidores e levá-lo a procurar mais opções. “Esses 50 mil investidores no exterior que temos hoje são apenas a ponta do iceberg.“
Sobre as regras brasileiras, que limitam o investimento no exterior, Sylvio Castro, do CS, diz que hoje o grande desafio é como oferecer para o varejo de alta renda o que já oferece para o private banking. “O regulado às vezes trata o cliente de varejo de alta renda como incapaz de entender o risco da aplicação no exterior, e aí sobrariam apenas os investimentos locais, o que criaria outro risco, de não poder diversificar em caso de problemas no Brasil”, explica. “O grande desafio do regulador é como entender que a aplicação no exterior é uma diversificação que reduz o risco para o investidor local”, diz.