Homem assina testamento: Herdeiro pode entrar com ação para anular doação que o exclui da partilha da herança (Thinkstock/Gajus)
Da Redação
Publicado em 6 de julho de 2015 às 12h40.
Dúvida do internauta: Meu pai é falecido e a minha avó (mãe dele) vendeu a casa em que morava e comprou um apartamento no nome do meu tio (filho dela). Era o único bem que ela tinha e ela está com a saúde bem debilitada. Por lei, ela pode fazer isso, sendo que ela tem outros herdeiros, netos do filho falecido dela? A lei não nos protege de alguma forma?
Resposta de Rodrigo Barcellos*:
Juridicamente, o que a sua avó fez foi doar o produto da venda (dinheiro) do único imóvel que tinha ao seu tio.
A doação feita de pai ou mãe para um filho, sem ressalvas ou dispensa da colação, e com a reserva de parte da quantia recebida para a subsistência do doador, no caso sua avó, (por meio do usufruto, por exemplo, ou ainda pelo recebimento de aluguéis), significa que foi feito um adiantamento do que caberá ao filho donatário por herança (artigo 544 do Código Civil), o que não torna inválido o ato praticado, do ponto de vista jurídico.
Contudo, deve ser respeitada a parte que cabe aos demais herdeiros necessários, que têm a sua parte legitimaria da herança assegurada por lei. De acordo com o artigo 1.845 e 1.846 do Código Civil, pertence aos herdeiros necessários (ascendentes, descendentes e cônjuge) metade dos bens da herança, a chamada "legítima”. A outra metade, o detentor do patrimônio pode dispor livremente, seja para herdeiros necessários ou não.
Partindo dessas premissas, entende-se que é possível abrir uma ação contra o doador, ainda em vida, sob o argumento de que a doação excedeu a metade que ele poderia dispor de seu patrimônio (circunstância verificada no momento da liberalidade, de acordo com o art. 549 do Código Civil).
Essa ação ocorreria apenas para ser anulada a doação da parte excedente do patrimônio, que avançou na parte legitimaria reservada aos herdeiros necessários.
Outro caminho a ser percorrido é pela via da “colação de bens”, no momento da abertura do inventário de sua avó, o que ocorrerá após sua morte.
Considerando que o seu pai é pré-morto em relação à sua avó, você terá direitos hereditários na sucessão dela, na qualidade de representante dele e em concorrência com o seu tio, se outros não existirem (artigo 1.835). Assim, você poderá reivindicar o arrolamento (“colação”) dos bens doados nos autos do inventário para igualar a legítima dos herdeiros necessários.
*Rodrigo Barcellos é graduado em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC) e mestre em direito comercial, pela Universidade de São Paulo (USP). É autor do livro "O Contrato de Shopping Center e os Contratos Atípicos Interempresariais", publicado pela editora Atlas. Sócio do escritório Barcellos Tucunduva Advogados, atua nas áreas de Família, Sucessão, Contratos e Contencioso.
Envie suas dúvidas sobre planejamento financeiro, investimentos e herança para seudinheiro_exame@abril.com.br.
Veja, no vídeo a seguir, quem são os herdeiros necessários:
[videos-abril id="673b53d9827bcad9cea69175370bc227?autoplay=true&startoutput=720p" showtitle="false"]