Imóveis: alta dos preços deixou aluguel menos rentável (.)
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.
A forte valorização imobiliária é uma excelente notícia para todos que investiram em casas e apartamentos há alguns anos. Em cidades como São Paulo ou Rio de Janeiro, são muitos os casos de gente que conseguiu dobrar o capital investido em períodos razoavelmente curtos de tempo, como três a quatro anos. Já quem só juntou dinheiro ou tomou coragem para investir em um imóvel agora precisará assumir dois riscos. O primeiro é que o melhor da festa do boom imobiliário pode já ter ficado para trás. O valor médio dos imóveis no Brasil aparece apenas como o 64º maior em um ranking com 90 países elaborado pela Global Property, mas é difícil de imaginar que o atual ritmo de crescimento de preços possa se sustentar no longo prazo.
Além disso, como os imóveis subiram muito mais que os aluguéis, a rentabilidade do investidor que comprar com a finalidade de locação será bem menor. Segundo pesquisa do Secovi-SP (o sindicato da habitação), o valor dos contratos de aluguel fechados em abril teve um aumento de 11,4% em relação ao mesmo mês de 2009. Trata-se de um reajuste significativo. No entanto, o preço dos imóveis subiu muito mais. Pesquisa da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp) mostra que o metro quadrado de imóveis de dois dormitórios teve alta de exorbitantes 42,8% no primeiro quadrimestre deste ano na comparação com o mesmo período do ano passado. No caso dos imóveis de três e quatro dormitórios, o aumento foi de 27%.
Sempre que o preço do imóvel sobe mais que o aluguel, há inevitavelmente queda de rentabilidade. Em alguns casos, já é possível pagar uma locação mensal equivalente a 0,4% do valor do imóvel, segundo Roseli Hernandes, gerente-geral da imobiliária Lello, uma das maiores de São Paulo. "Valores de 0,5% ou menos são desestimulantes para quem obtém renda com aluguel", diz o vice-presidente de locação do Secovi-SP, Francisco Crestana. Com a alta dos juros, novamente será possível obter no Brasil retornos próximos a 1% ao mês com aplicações financeiras de baixíssimo risco. Nesse cenário, só os investidores que comprarem imóveis que continuarem a ter boa valorização conseguirão bater os retornos oferecidos pelos títulos públicos.
Se você acredita que o boom imobiliário ainda está longe do fim, o conselho dos especialistas é comprar um apartamento pequeno com condomínio barato. Esse tipo de imóvel ainda pode ser alugado por um valor mensal equivalente a 0,7% de seu preço, segundo Roseli, da Lello. "Um apartamento pequeno em Pinheiros que eu alugava no ano passado por 1.100 reais agora me rende 1.700 reais mensais", diz Luiz Calado, autor do livro "Imóveis - Seu Guia para Fazer da Compra e Venda um Grande Negócio" e vice-presidente do Ibef. Os inquilinos têm aceitado esse tipo de reajuste justamente por terem poucas opções. A demanda por imóveis pequenos permanece forte principalmente entre pessoas solteiras ou recém-casadas que ainda não sabem se vão se tornar moradores permanentes da cidade. Esse é o caso de estudantes ou de pessoas que conseguem um emprego novo em São Paulo e deixam a família morando no município de origem - gente que dificilmente opta pela compra ao invés da locação.
Para Crestana, do Secovi-SP, o único inconveniente dessa estratégia de investir em imóveis pequenos é a maior rotatividade. Em geral, quem mora sozinho pode mudar para um imóvel próximo à empresa sempre que muda de emprego, por exemplo. O atenuante é que o tempo médio em que um imóvel fica vazio anda bastante baixo. Segundo o Secovi-SP, um imóvel demora entre 11 e 35 dias para ser alugado novamente. Devido à escassez de oferta, há até imobiliárias que organizam uma fila de espera de clientes atrás de determinado tipo de casa ou apartamento para locação.
Por que o aluguel não sobe tanto?
Se há tanta demanda, por que os preços dos aluguéis não sabem mais? Há diversos motivos, dizem os especialistas. O principal deles é que, no Brasil, mais de 90% dos contratos de locação duram ao menos 30 meses e sofrem um reajuste a cada 12 meses de acordo com a variação do IGP-M. Isso quer dizer que independentemente de qual seja a valorização dos imóveis, a alta do aluguel será equivalente à inflação medida pelo IGP-M no último ano. E, em alguns meses de 2009, o IGP-M chegou a ficar negativo. Já nos 12 meses encerrados em maio, a alta foi de apenas 2,88%. A indexação dos contratos acaba arrastando todo o mercado para baixo. "Imagine uma pessoa que vai ver um apartamento disponível para locação por 1.500 reais mensais e que descobre que no mesmo prédio há inquilinos mais antigos que pagam apenas 1.000 reais. Ele não aceita esse preço", diz Roseli, da Lello.
Além disso, há diversos fatores que favorecem a valorização dos imóveis, mas não os aluguéis. O principal deles é a fartura de crédito. Nos Feirões promovidos pela Caixa Econômica Federal, já é possível comprar um imóvel com zero de entrada, diz Luiz Calado, do Ibef. Os bancos privados também são muito mais agressivos na concessão de crédito imobiliário do que eram há cinco anos. E os subsídios do programa Minha Casa, Minha Vida deixaram as classes C e D mais próximas da compra da casa própria. Muitas dessas pessoas deixaram os imóveis alugados em que viviam. "Se a pessoa percebe que ao invés de pagar 2.000 reais mensais de aluguel pode arcar com uma prestação de financiamento imobiliário equivalente, ela vai optar pela compra", diz Roseli, da Lello.
Um terceiro motivo para que os preços dos imóveis estejam nas alturas é a dificuldade de aumentar a oferta nos principais bairros de cidades como São Paulo. Devido à escassez de terrenos, os preços se tornaram exorbitantes. A lei de zoneamento da cidade também é bastante restritiva a novas construções em diversos bairros. Como as incorporadoras não conseguem lançar novos apartamentos, os preços permanecem pressionados.
Longo prazo
Quem comprar um imóvel para alugar também terá de enfrentar o risco de inadimplência. Segundo especialistas, a nova Lei do Inquilinato aumentou a proteção do proprietário e facilitou o despejo de quem não paga o aluguel. No entanto, retirar uma família de um imóvel ainda pode ser um processo desgastante principalmente devido à morosidade da Justiça. A melhor solução, nesse caso, é colocar no contrato de aluguel que eventuais divergências entre locadores e locatários deverão ser resolvidas por meio de arbitragem, diz Emanuela Veneri, sócia-diretora da Arbimóvel, consultoria especializada na solução de conflitos imobiliários. O julgamento é bem mais rápido e não há recurso. "Isso é muito bom para o proprietário porque o despejo do inadimplente ocorre em cerca de seis meses", diz Emanuela.
Há problemas, no entanto, que só devem ser resolvidos no longo prazo. A recuperação do preço dos aluguéis para patamares mais próximos a 0,7% do valor do imóvel pode demorar anos para ocorrer. Somente o aumento da demanda pelo aluguel de imóveis deverá permitir a recomposição dos preços. "Os imóveis para locação estão com valores bem acessíveis", diz Roseli, da Lello. "Mas leva tempo para que as pessoas percebam que podem alugar um imóvel por um preço excelente, aplicar o dinheiro que pouparam no banco, obter um retorno de quase 1% ao mês em um investimento praticamente sem risco e mais para frente comprar um imóvel pagando muito menos juros."