Como segurados também têm direito a um cartão de crédito consignado com margem de até 5%, na prática, poderiam passar a comprometer até 40% dos ganhos (Agência Brasil/Agência Brasil)
Agência O Globo
Publicado em 7 de setembro de 2020 às 13h49.
Última atualização em 7 de setembro de 2020 às 15h06.
O Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) publicou na semana passada uma resolução recomendando que a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia encaminhe uma proposta legislativa para ampliar, de 30% para 35%, a margem do crédito com desconto em folha para aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Trata-se do percentual da renda mensal que o beneficiário pode comprometer com o pagamento das parcelas. Como esses segurados também têm direito a um cartão de crédito consignado com margem de até 5%, na prática, essas pessoas poderiam passar a comprometer até 40% de seus ganhos com o empréstimo.
Segundo fontes do governo, a expectativa é que a secretaria envie ao Congresso Nacional, nos próximos dias, uma medida provisória (MP) com a mudança. Assim, o aumento passaria a valer imediatamente, enquanto a votação ocorre na Câmara dos Deputados e no Senado.
A resolução prevê que a medida tenha efeitos até 31 de dezembro deste ano, em razão da calamidade pública provocada pela pandemia. Mas o CNPS não deixa claro como ficariam empréstimos que ultrapassassem esse período. Hoje, beneficiários do INSS podem parcelar dívidas de consignado em até 84 meses, ou seja, sete anos.
Filipe Pires, coordenador de Finanças do Ibmec-RJ, aponta que a medida é positiva por um lado, pois eleva a oferta de crédito em um momento de emergência, mas, por outro lado, aumenta o risco de o endividamento sair do controle. Segundo ele, em geral é recomendado que se comprometa até 30% da renda com dívidas:
— A margem varia caso a caso. É preciso analisar quanto o cidadão já compromete mensalmente com custos fixos, como aluguel e contas.
É por isso que, em algumas situações, a margem ideal pode ser até mais baixa do que os 30%. É o caso do aposentado e pensionista Rene Andrade, de 78 anos, que tem uma renda mensal de R$ 1.800 e paga parcelas de R$ 223 por mês de consignado. Esse valor representa apenas 12,3% de seu benefício, mas faz falta no fim do mês.
— Esse dinheiro já pagaria contas de luz, de telefone. Parece pouco, mas faz diferença — conta Rene, que contratou o empréstimo para ajudar a filha, que precisava do dinheiro.
Esse é outro hábito que precisa ser evitado, alerta o economista Mauro Rochlin.
— Com o aumento da margem consignável, o risco de pegar empréstimos para terceiros é maior. É uma situação complicada, porque normalmente se trata de um parente ou amigo, mas uma solução para dar mais segurança ao aposentado pode ser pedir um bem como garantia em caso de inadimplência.
No fim de julho, o INSS publicou uma portaria regulamentando mudanças nas regras de empréstimos consignados para aposentados e pensionistas do instituto até o dia 31 de dezembro. Com a medida, ficou autorizado o desbloqueio para consignados em 30 dias após a concessão do benefício. O prazo anterior era de 90 dias.
Além disso, a portaria abriu a possibilidade de bancos ofertarem um prazo de carência para o início do desconto da primeira parcela, no prazo máximo de 90 dias, a contar do início do contrato.
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Para Filipe Pires, coordenador de Finanças do Ibmec-RJ, é preciso prestar atenção às condições do contrato e planejar o pagamento das parcelas, para que não comprometam mais do que o aposentado ou o pensionista pode pagar por mês.
— O crédito consignado é um empréstimo mais barato, porque o risco para o banco é menor, já que as parcelas são descontadas diretamente do benefício do cliente. É por isso que, antes de contratar a modalidade, a pessoa deve tirar o valor das parcelas de seu orçamento mensal e ver se vai parar em pé. Senão, o que acontece é que o cidadão acabar devendo cartão de crédito e cheque especial, que são dívidas mais caras, para conseguir pagar o consignado, que tem juros mais baixos — explica Pires.
Apesar de o empréstimo consignado ser considerado por muitos como uma saída para momentos de dificuldade, a planejadora Paula Sauer aponta que a solução mais adequada, muitas vezes, está dentro de casa, seja reduzindo as despesas ou até mesmo buscando uma nova fonte de renda. Para ela, recorrer ao crédito deve ser a última opção:
— É preciso, e não é fácil, mudar os hábitos de consumo, repensar despesas, rever as contas que se paga no piloto automático, rever as marcas que se consome e trocar por outras mais baratas, por exemplo. Mudar de meio de transporte, cortar algumas despesas, ainda que temporariamente, até que as contas estejam em dia. É preciso fazer escolhas.
Já o economista Mauro Rochlin lembra que, apesar de os juros do consignado serem os mais baixos do mercado, ainda são muito mais altos que a inflação, por exemplo. Nos últimos 12 meses, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumula uma alta de 2,31%, enquanto a taxa de juros média do consignado para aposentados e pensionistas do INSS é de 20,5% ao ano.
— Claro que são taxas muito mais baixas que as do cheque especial ou cartão de crédito, mas se compararmos com os índices de inflação, vamos ver que o juros real para o aposentado é muito alto. É preciso ter o mínimo de planejamento com as parcelas.