Investidores: as bolsas mundiais começaram o ano com fortes quedas, com o risco de crescimento mais fraco da China como justificativa (Alex Wong/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 24 de fevereiro de 2016 às 10h14.
Novas questões no mercado internacional mudaram o cenário para o investidor este ano, afirma Izak Benaderet, diretor de Investimentos da Porto Seguro Investimentos, braço de gestão de recursos da seguradora.
As bolsas mundiais começaram o ano com fortes quedas, com o mercado usando inicialmente o risco de crescimento mais fraco da China como justificativa.
Mas o receio se ampliou e acabou criando uma aversão ao risco que contaminou outros países, como os da Europa, e seus pontos mais frágeis, no caso, os bancos, já enfraquecidos pelas crises das dívidas dos países e pela recessão.
Juro negativo
O temor cresceu pela expectativa de que os bancos centrais internacionais tenham de adotar juros negativos para tentar estimular as economias, o que comprometeria o ganho dos bancos.
No Brasil, a situação é inversa, já que os juros básicos são altos e remuneram muito bem o capital dos bancos.
Esse temor afetou a dívida emitida pelos bancos europeus no mercado, especialmente os do Deutsche Bank, o que provocou forte queda nos preços dos papéis e das ações.
Fed mais devagar
Em virtude dessa turbulência, o mercado reviu a expectativa para a alta dos juros nos Estados Unidos.
Antes a previsão era de até quatro subidas de juros, mas agora o mercado acredita que o Federal Reserve (Fed, banco central americano) vai manter as taxas este ano e talvez até o fim do ano que vem.
E tudo isso fez as bolsas na Europa e nos Estados Unidos registrarem fortes quedas, influenciando também a bolsa brasileira, e os juros dos EUA e da Europa.
Incerteza entre crescimento modesto e recessão
A incerteza continua, observa Benaderet, em relação que vai prevalecer nos mercados, se o otimismo com a retomada da economia americana, mesmo que num ritmo menor que o do ano passado, puxando ainda as demais economias, ou o pessimismo com a China e a Europa.
A economia americana é, inclusive, a que está em melhor forma, também em comparação com a dos países emergentes, afetados pelas quedas das commodities e pela China.
Brasil tem suas próprias incertezas
No mercado brasileiro, a troca do ministro da Fazenda Joaquim Levy por Nelson Barbosa, que era do Planejamento, trouxe bastante incerteza sobre a condução da política econômica daqui para frente, diz Benaderet.
O novo ministro adota um discurso próximo ao de Levy, de perseguir o superávit primário e o equilíbrio das contas públicas. Mas, quando a discussão entra na esfera política, não é possível controlar, avalia o gestor.
Ele reconhece que o diagnóstico do governo para os problemas do país é bom, caso da reforma da Previdência e a questão fiscal.
Mas há dificuldade em entregar um número fiscal capaz de limitar o crescimento da relação dívida e PIB, e que pode atingir níveis muito ruins ao fim de 2018, perto de 85% do PIB, ante 58% do PIB no ano passado.
“A mudança é muito brusca e afeta a percepção de risco dos investidores locais e externos”, diz Benaderet.
Mudança tem de ser nas expectativas
A surpresa com o novo rebaixamento da nota de crédito brasileira pela Standard & Poor’s e, mais ainda com o rebaixamento também da nota e moeda local, devem colocar mais pressão sobre o governo para entregar um plano de voo que possibilite reverter o quadro vicioso da economia.
O país não cresce, não arrecada, o risco aumenta, o juro sobe e a relação dívida/PIB piora e o risco volta a aumentar.
“A mudança se dará na expectativa, é preciso retomar a confiança no investimento, melhorar a arrecadação fiscal para quebrar a dinâmica”, afirma o gestor.
Assuntos que poderiam quebrar esse círculo vicioso, segundo ele, seriam a própria reforma da previdência, que abriria espaço para reduzir juros.
“Não é razoável juros de 6% a 7% reais ao ano com uma queda no PIB entre 3,5% e 4% este ano”, diz.
Mas, na esfera política, os agentes econômicas têm pouco o que fazer, diz Benaderet.
“Não lideramos, somos passageiros do ônibus”, diz, dando o exemplo da reforma da previdência, que é um “assunto pesado” para o PT, partido da presidente Dilma Rousseff, mas que é também de suma importância para o país restaurar alguma confiança.
Enquanto a reforma estrutural não se resolve, ficam em discussão alternativas para aumentar a arrecadação no curto prazo, como a CPMF ou o aumento do imposto sobre aplicações financeiras, e que aumentam a incerteza entre investidores e empresários.
Papéis indexados à inflação e de curto prazo
Hoje, dado o patamar e os riscos para o governo equalizar suas contas, o juro real continua sendo a melhor opção de investimento, avalia Benaderet.
Juros nesses níveis, de 7% reais ao ano, por 3 ou 4 anos, se tornam interessantes, até que se defina a agenda política e se haverá continuidade do atual governo em 2018. Nesse ambiente, as NTN-B 2019 e 2020 podem ser melhores opções.
“Por mais que tenha inflação em níveis altos, o papel, corrigido pelo IPCA e de prazo curto, te dá proteção”, diz. Já os prefixados podem ser uma parcela menor das aplicações, com prazos mais curtos, de um ou dois anos, aproveitando a disposição do Banco Central (BC), de não subir juros.
“Mas o mais seguro no médio prazo são as NTN-B de 3 ou 4 anos”.
Bolsa, tempos difíceis
Para a bolsa, o cenário, não é dos mais favoráveis, mas talvez alguma ação possa ter um preço mais atrativo.
“Mas de modo geral vai ser difícil a bolsa bater a renda fixa nos próximos 12 meses, precisaria haver um evento muito relevante para ações serem atrativas”, diz.
No dólar, a tendência segue de alta, e a moeda americana deve ficar acima dos R$ 4,00.
“O dólar pode até ter um soluço, subir mais, mas com esse juro alto, de 14,25% ao ano, e a melhora das contas externas, com o déficit de contas correntes passando de US$ 100 bi no passo passado para zero no ano que vem, a pressão sobre o câmbio será menor”, explica Benaderet.
A questão fiscal é que ainda coloca em risco o país e pressiona o câmbio. “Ele deve continuar subindo, mas questão é se será acima do custo de oportunidade dos juros.”
Benaderet não acredita em uma ruptura no mercado internacional, apesar do receio com a sustentabilidade do crescimento chinês. Ele vê os bancos centrais atuando fortemente nas políticas monetárias, o que reduz o risco de um problema maior.