Dilma: deciões do governo se tornaram um risco para quem investe em bolsa (Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 1 de agosto de 2011 às 08h12.
São Paulo – Muito tem se falado no mercado sobre o impacto do endividamento americano e europeu sobre as bolsas. O risco de calote e os seguidos rebaixamentos das notas de risco soberano de vários países mediterrâneos e da Irlanda certamente têm prejudicado o desempenho da BM&FBovespa. Da mesma forma, o impasse em torno do aumento do teto da dívida dos Estados Unidos cobrou seu preço sobre a economia internacional. Até a presidente Dilma Rousseff afirmou na última quinta-feira que a “insensatez” e a “incapacidade política" dos EUA e da União Europeia para resolver suas crises eram uma "ameaça global". O que Dilma não disse, mas que se torna cada vez mais visível, é que ela mesma tomou decisões que prejudicaram diversas ações da bolsa em seus sete primeiros meses de governo. O risco representado pelo governo federal deve ser considerado por quem planeja investir no mercado acionário. A seguir, EXAME.com elenca sete papéis abatidos pelo governo Dilma:
1 – Ação da BM&FBovespa foi a vítima mais recente
Na semana passada, o governo anunciou um novo pacote para taxar com IOF as operações com derivativos no mercado futuro de câmbio. Não foi a primeira vez que o governo agiu para conter a alta do real, mas todas as medidas anteriormente anunciadas pelo ministro Guido Mantega (Fazenda) haviam mirado o mercado de dólar à vista. Após os contratos de juros, os de câmbio são os mais negociados da BM&F. Como o volume negociado no mercado futuro é mais do que sete vezes superior ao do mercado à vista, a primeira consequência da medida foi provocar a elevação da cotação do dólar – como o governo queria.
O problema é que o efeito colateral não foi nada latente. As ações da BM&FBovespa despencaram 2,85% e 5,45% nos pregões das últimas quarta e quinta-feira, respectivamente. A percepção de analistas e investidores é que as negociações de câmbio entre dólar e real devem migrar para alguma bolsa estrangeira, como a de Chicago, já que as empresas tentarão fugir da elevação dos custos para se proteger das oscilações do dólar. Criticado, o governo decidiu adiar para o dia 5 de outubro o recolhimento do IOF sobre as posições vendidas em derivativos cambiais. Mas o estrago já estava feito. No ano, as ações da BM&FBovespa (BVMF3) acumulam perdas de 30,4% e são negociadas a cerca de 9 reais.
2 – Cosan tem pane seca apesar de preços altos do etanol
Em seu esforço de vender o etanol mundo afora, a diplomacia brasileira se esforçou nos últimos anos para convencer o resto do mundo que as vastas plantações de cana de açúcar em território brasileiro não representavam uma fonte adicional de pressão sobre os preços dos alimentos. Para a chancelaria, haveria espaço suficiente para a produção de comida e do biocombustível em terras nacionais – uma tese que não convence críticos de diversas partes do mundo, da Europa Ocidental à Venezuela.
Pegou muito mal, portanto, quando vazou na mídia no começo deste ano que a presidente Dilma Rousseff estava estudando o aumento no imposto para a exportação de açúcar como forma de incentivar a produção de etanol, cujos preços batiam recordes. O governo também aventou a possibilidade de restringir financiamentos do Banco do Brasil e do BNDES às usinas que estivessem produzindo mais açúcar do que etanol. O que ninguém no mundo entendeu é por que o governo tomaria tais medidas se realmente houvesse espaço suficiente para produzir os dois derivados.
O impacto no mercado foi péssimo. Hoje com queda de 15% no ano e cotadas acima de 23 reais, as ações da Cosan (CSAN3) chegaram a cair para 21 reais durante o segundo trimestre. Os papéis só se recuperaram porque as ameaças de Dilma nunca se concretizaram. De concreto, a presidente criou a possibilidade de reduzir o limite mínimo de adição de álcool à gasolina de 20% para 18% e deu à ANP (Agência Nacional de Petróleo) poder para regular o setor. Mas a opção clara foi por adotar uma postura mais branda com o setor. Tanto que a adição de gasolina ao álcool continua em 25% e agora o governo já estuda a possibilidade de aumentar a oferta de crédito de bancos públicos para a formação de estoques. Outras medidas positivas que vêm sendo aventadas preveem o corte de PIS e Cofins para investimentos em equipamentos para a cadeia de etanol e a concessão de adiamentos e parcelamentos para o pagamento de Imposto de Renda.
3 - ALL saiu dos trilhos com risco regulatório
As empresas de transporte de carga em geral também têm sofrido com decisões de governo. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) promete anunciar em breve novas regras de exploração da malha viária do país. Entre as ideias em estudo, está permitir o compartilhamento dos trilhos entre as atuais concessionárias e novas companhias que pretendam investir no setor. Uma empresa como a ALL perderia a exclusividade nos trechos onde opera e teria de ceder suas ferrovias para rivais. Nesse cenário, o impacto sobre a rentabilidade da empresa seria óbvio.
Outra medida aventada pela ANTT levaria à criação de um sistema de metas de transporte por trecho. A ideia é retomar concessões subutilizadas e ainda cobrar por eventuais danos gerados pelo abandono de trechos. As concessionárias afirmam que essas medidas contrariam as regras firmadas nos contratos de concessão e tentam chegar a um acordo com a agência com promessas de investimento. Mas o mercado ainda teme uma medida severa da ANTT. Nos sete primeiros meses de 2011, as ações da ALL acumularam queda de 25%.
4 - Pão de Açúcar sofreu com recuo do BNDES
O Pão de Açúcar tinha tudo para ser o antiexemplo de empresas prejudicadas pelo governo Dilma. Afinal, em junho o controlador do grupo, Abilio Diniz, anunciou que havia chegado a um acordo para comprar o Carrefour com dinheiro público. O BNDESPar, braço de investimentos em participações acionárias do BNDES, entraria com 4,5 bilhões de reais para financiar a aquisição. Animado com os ganhos de escala e a sinergia que o negócio traria, os investidores compraram as ações do Pão de Açúcar como poucas vezes se viu. Os papéis preferenciais (PCAR4) dispararam e chegaram a atingir 82 reais no dia 29 de junho.
Mas após um rápido período de euforia, veio o banho de água fria. Na mesma semana, o BNDES começou a sinalizar que não daria apoio à aquisição do Carrefour se Abilio não chegasse a um acordo com seu principal sócio, o grupo francês Casino. Dias depois, Jean-Charles Naouri, do Casino, veio ao Brasil conversar com o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, e enterrou de vez o negócio. Era uma questão de dias para o banco oficialmente recuasse. As idas e vindas do BNDES deixaram Abilio sem o Carrefour e com uma relação azedada com seu principal sócio. O mercado, lógico, não perdoou, e as ações do Pão de Açúcar voltaram a um patamar próximo a 65 reais.
5 – Governo quase inviabilizou a Brasil Foods
Ao contrário dos casos anteriores, as ações da Brasil Foods registram um excelente desempenho neste ano. Os papéis subiram 10%, a nona maior alta do Ibovespa. Mas o governo quase colocou tudo a perder em junho, quando o Conselho Administrativo de Direito Econômico (Cade) ameaçou inviabilizar a fusão entre Sadia e Perdigão. Na semana em que o relator do processo no Cade votou pelo veto ao negócio, os papéis da Brasil Foods recuaram de 31 para 24 reais.
O julgamento foi interrompido antes dos votos de todos os conselheiros. Nas semanas que se sucederam, intensas negociações foram realizadas entre empresa e órgão regulador para se chegar um acordo não tão duro quanto o voto do relator nem tão brando quanto a proposta inicial da companhia para obter o aval do Cade. Em princípio, a Brasil Foods queria vender apenas marcas secundárias - como Rezende, Wilson e Confiança. O resultado final foi que a Brasil Foods aceitou vender mais de 30% de sua capacidade de produção no mercado interno e suspender a venda de uma série de produtos da Perdigão e da Batavo por até cinco anos. Acordo intermediário, cotações intermediárias. As ações da Brasil Foods se recuperaram e hoje valem cerca de 29 reais – ainda abaixo da máxima atingida antes do julgamento ser iniciado.
6 - Sem reajuste da gasolina, Petrobras desceu a ladeira
Após uma capitalização em que levantou quase 120 bilhões de reais e que consistiu na maior oferta de ações da história, a Petrobras parecia bem posicionada para ao menos parar de despencar na bolsa. Afinal, a estatal é uma das poucas empresas de petróleo do mundo que devem aumentar sensivelmente as reservas e a produção nos próximos anos. No entanto, não foi isso o que se viu em 2011. Os papéis já caíram 13% mesmo após terem registrado um dos piores desempenhos do Ibovespa em 2010. Por trás da derrocada aparece novamente o governo Dilma.
Quando diversos ditadores árabes começaram a sofrer pressões populares por mais democracia no começo do ano, o petróleo disparou no mercado internacional. Com a queda do líder egípcio e a guerra na Líbia, a commodity chegou a encostar em 130 dólares por barril em Londres. Esse movimento de alta, entretanto, não gerou ganhos para os acionistas da Petrobras. É verdade que a cotação do petróleo recuou posteriormente. Mas o problema é que o mercado viu o dedo do governo na decisão da Petrobras de manter os preços dos combustíveis inalterados durante todo esse tempo. Como os principais projetos da estatal só devem começar a gerar caixa em 2013 e como a empresa não tem sido muito pontual na entrega do aumento de capacidade prometido, grandes investidores ainda preferem continuar de fora das ações mesmo após o valor de mercado da empresa ter caído abaixo do valor patrimonial.
7 - Vale sofreu interferência como se fosse estatal
Nenhuma empresa dessa lista sofreu uma interferência governamental tão escandalosa quanto a Vale. É verdade que as ações da mineradora registram apenas uma leve queda de 4% neste ano. No entanto, continuam quase 20% abaixo das máximas atingidas durante 2011. O governo foi responsável direto pela desvalorização dos papéis ao decidir unilateralmente que Roger Agnelli não deveria mais ser o presidente da companhia. A escolha de Murilo Ferreira para o comando da empresa até agradou o mercado. Mas a percepção dos investidores de que a influência do governo Dilma sobre a empresa crescerá nos próximos anos não se apagará tão rapidamente. Uma das primeiras decisões estratégicas da mineradora após o anúncio de que Agnelli seria substituído foi a de participar do consórcio que vai construir a usina hidrelétrica de Belo Monte – um projeto bilionário no rio Xingu que não é visto como rentável nem pelas empresas mais agressivas do setor elétrico. A expectativa de que investimentos em siderurgia sejam anunciados em breve também contribui para aumentar a percepção de que a empresa possa se tornar menos rentável nos próximos anos.