Emmanuel Hermann, CEO e sócio-fundador Grupo Leste: "private equity no Brasil se tornou um mercado de 'special situations'" (Grupo Leste/Divulgação)
Repórter
Publicado em 25 de agosto de 2024 às 15h28.
Última atualização em 26 de agosto de 2024 às 09h32.
Estava tudo pronto para que a bolsa brasileira recebesse uma nova rede de academias em 2021. Alguns meses antes, a estreia da maior concorrente, a Smart Fit, havia sido um sucesso, com suas ações subindo 35% em seu primeiro pregão na B3. No entanto, embora aguardada, a listagem da BlueFit foi frustrada pelo fechamento da janela de IPOs, o que deu início à maior seca de ofertas públicas iniciais no mercado brasileiro.
O Grupo Leste, que havia investido na BlueFit quando a empresa possuía apenas quatro academias em operação, via na abertura de capital uma oportunidade de realizar o lucro do investimento. "Entramos na fila de IPOs, mas o mercado fechou rapidamente, com os juros saindo de 2% para 14%", recorda Emmanuel Hermann, sócio-fundador e CEO do Grupo Leste, em entrevista à EXAME no escritório da gestora em São Paulo.
"Nossa tese de investimento em private equity era de low cost premium, oferecendo serviços de qualidade a um custo baixo. Acreditávamos que este era o modelo mais estável para o perfil de consumo do brasileiro."
Com a entrada do Grupo Leste, que se tornou sócio majoritário, a BlueFit consolidou-se como uma das principais redes de academias do país, rivalizando com a Smart Fit, hoje avaliada em R$ 13,6 bilhões. Porém, com o mercado de IPOs estagnado, a falta de opções de saída para investimentos em empresas fechadas levou a Leste a acelerar seus investimentos nos Estados Unidos, para onde migrou a maior parte de seus negócios.
Atualmente, dos US$ 2,4 bilhões sob gestão, cerca de US$ 2 bilhões estão nos Estados Unidos. "A Leste se tornou uma empresa de dupla nacionalidade. Nos Estados Unidos, somos reconhecidos como uma gestora local", conta Hermann.
Mas a reputação não foi construída da noite para o dia, ressalta Hermann. A trajetória da Leste nos Estados Unidos começou há nove anos, com o objetivo de facilitar o acesso de brasileiros a investimentos em empresas fechadas americanas.
Companhias que se tornaram fenômenos globais, como Uber e Airbnb, passaram pela Leste antes de irem a público.
Hermann relata que, nos primeiros anos, as aquisições eram realizadas principalmente via mercado secundário, comprando participações de fundos que já haviam investido em rodadas anteriores. Com o tempo, a Leste ganhou influência e acesso direto ao mercado primário.
"Não é só chegar e pedir para entrar na rodada de investimentos. Tivemos os primeiros acessos em mercados secundários, construímos networking e parcerias estratégicas com brokers. Foi assim que estabelecemos relações para entrar nas rodadas primárias. Para conseguir isso, só estando lá [nos EUA]."
A estratégia nos Estados Unidos tem sido investir em empresas maduras, com potencial de realizar IPO nos próximos dois ou três anos. Entre os alvos, estão empresas de inteligência artificial. "Há um grande desenvolvimento nessa área no exterior. Gostamos da tese e de suas derivadas, como humanoides e a aplicação da IA no mundo real."
Entre as empresas investidas estão a OpenAI, criadora do ChatGPT, na qual a Leste investiu US$ 350 milhões. Mais recentemente, a gestora também aportou US$ 100 milhões na última rodada de investimento da xAI, empresa de inteligência artificial criada por Elon Musk. Outra empresa do icônico empresário presente no portfólio da Leste é a SpaceX, na qual Hermann afirma ter feito "algumas alocações".
Os investimentos no mercado americano têm aberto as portas da Leste para investidores de todo o mundo. Do total investido pela gestora, apenas 35% vêm de brasileiros, 5% de outros países latinos, 40% de investidores americanos e 15% divididos entre europeus, asiáticos e do Oriente Médio.
"É muito mais fácil crescer como gestora nos Estados Unidos", afirma Hermann.
Embora relativamente grande para os padrões brasileiros, Hermann considera a Leste uma gestora pequena em comparação às americanas. "Uma gestora grande no Brasil tem US$ 20 bilhões em ativos alternativos. Nos Estados Unidos, as gigantes têm US$ 2 trilhões, e as médias, entre US$ 100 e 400 bilhões. Os números são muito grandes, assim como as oportunidades de crescimento nesse mercado, além de muitas possibilidades de saída e entrada em investimentos."
Outra frente de investimento relevante da Leste nos Estados Unidos é o mercado imobiliário, onde atua tanto no desenvolvimento quanto no financiamento de construtoras. Esse setor abrange cerca da metade dos recursos da gestora nos EUA.
Na área imobiliária, a principal frente de investimento é na Flórida, onde a Leste tem um de seus escritórios. "No passado, a região era voltada principalmente para negócios latino-americanos. Hoje, tornou-se um centro financeiro muito mais conectado a Nova York. Estamos participando desse processo."
Em Miami, a Leste tem atuado no desenvolvimento imobiliário em parceria com a gestora carioca Opportunity, com a qual dispõe de cerca de US$ 1 bilhão para investir na região. "São projetos em fases de operação e outros no pipeline. O foco é na construção de residências para aluguel, que é um mercado muito grande. Estamos animados com o potencial de recorrência desses projetos", afirma Hermann.
Os novos negócios, segundo o executivo, são oportunidades para captar recursos tanto de investidores locais quanto de brasileiros. No entanto, ele avalia que o cenário ainda é mais desafiador abaixo da Linha do Equador, principalmente devido à competição com os altos juros.
"O mercado brasileiro é pouco desenvolvido e passa por ciclos de prosperidade. O timing, portanto, é crucial. Mas esse não é o espírito da alocação de longo prazo. A poupança deveria estar mais direcionada à massa produtiva, e não ao financiamento da dívida pública."
A Leste mantém cerca de US$ 400 milhões em investimentos no Brasil. Contudo, dado o crescimento no exterior, essa fatia tem se tornado cada vez menos relevante dentro da gestora.
A BlueFit, uma das principais apostas da gestora no país, teve seu controle vendido para o fundo Mubadala, dos Emirados Árabes Unidos, no ano passado, por cerca de R$ 460 milhões. No entanto, na avaliação da Leste, a venda poderia ter sido pelo dobro do valor em condições de mercado mais favoráveis. Para Hermann, o private equity no Brasil se tornou um mercado de "special situations".