BRF: papéis ordinários da dona de Sadia e Perdigão caíram 7,49%, para R$ 21,51 (Victor Moriyama/Bloomberg)
Estadão Conteúdo
Publicado em 9 de junho de 2018 às 09h56.
Brasília - O anúncio de tarifas de até 38% para a entrada de frango brasileiro na China pegou os exportadores de surpresa e levou à forte queda das ações da BRF, empresa mais dependente da venda desse produto ao país asiático.
Os papéis ordinários da dona de Sadia e Perdigão caíram 7,49%, para R$ 21,51. Também afetada pela medida, a JBS fechou em alta de 4,14%, a R$ 8,80. A diferença é que a JBS tem capacidade industrial nos EUA, país que está ganhando acesso ao mercado chinês justamente no momento em que ele se fecha para o Brasil.
Oficialmente, o Ministério do Comércio chinês afirmou que as restrições impostas ao produto brasileiro estão ligadas à tentativa do país de reerguer a indústria local, que estaria sendo prejudicada pela "invasão" da carne de frango brasileira. A investigação se refere aos anos de 2013 a 2016. No ano passado, porém, as vendas brasileiras para a China já caíram mais de 20%, para US$ 800 milhões.
O processo para a imposição de restrição ao frango brasileiro começou em agosto do ano passado. No meio do caminho, em fevereiro, a China derrubou tarifas para o frango produzido nos Estados Unidos. Segundo fontes do setor, isso pode ser um sinal de que o "pedágio" para o Brasil pode ser uma moeda de troca em um momento em que o presidente americano, Donald Trump, endurece o discurso contra o país asiático.
Embora seja difícil dizer exatamente a razão da restrição comercial, é possível prever que a atitude chinesa pode ser só a "ponta do iceberg", um sinal de que outras restrições a produtos agropecuários brasileiros estão por vir. "Meu olhar é que nós vamos ver bem mais anúncios como esse e que o ritmo (do protecionismo) vai se intensificar", diz Alexandre Mendonça de Barros, sócio da MB Agro.
Ao impor tarifas pesadas ao Brasil, a China se iguala a medidas que os Estados Unidos e a Europa já adotam para produtos como carne e açúcar vindos do País. "O ponto central é que o mundo entrou em uma onda protecionista. As decisões não seguem mais a lógica de mercado. Por isso, é muito difícil fazer uma leitura precisa sobre as razões da China neste momento", diz Mendonça de Barros.
Revés
A tarifa chinesa é um novo golpe após uma série de percalços para a indústria da carne nacional, que sofreu com a Operação Carne Fraca e, mais recentemente, com a greve dos caminhoneiros. Segundo a Associação de Proteína Animal (ABPA), em 2017, a China comprou 391,4 mil toneladas de carne de frango do Brasil, ou 9,2% das exportações do produto. Fontes do setor dizem que será difícil para as empresas encontrarem destino novo para esse volume no curto prazo.
As empresas foram pegas de surpresa pela imposição de barreiras. "Deve ser uma posição política da China", disse Ricardo Santin, vice-presidente da ABPA. Ele ressalvou, no entanto, que será difícil encontrar um fornecedor capaz de saciar a demanda chinesa por frango. Os Estados Unidos são fortes no setor, mas ainda sofrem sanções por causa da presença de gripe aviária no país, doença da qual o Brasil é livre, segundo o representante da associação.
Santin afirmou que o Brasil, além de poder recorrer à Organização Mundial de Comércio (OMC), cogita também tentar um acerto comercial bilateral com os chineses.
Procuradas, a BRF e a JBS não quiseram se manifestar.
Governo
Em nota conjunta dos ministérios das Relações Exteriores, Agricultura e Indústria e Comércio Exterior, o Brasil diz que "lamenta" a decisão da China. Diz que as exportações de frango brasileiro complementam a produção daquele país, beneficiando seus consumidores. Fonte do governo disse que a medida foi recebida com preocupação, pois tem "pouca consistência do ponto de vista técnico". Os principais elementos que justificariam a adoção de uma medida antidumping estão ausentes.
O principal argumento do Brasil é que as exportações de frango do Brasil não prejudicaram as empresas locais, o que seria um requisito obrigatório para a aplicação de antidumping. Pelo contrário, as empresas chinesas cresceram, aumentaram sua capacidade, elevaram sua lucratividade e até subiram o preço do frango no mercado interno. A China, no entanto, afirma que o contrário aconteceu.
"A participação das importações brasileiras representa cerca de 5% do mercado da China e elas, em nenhum momento, foram responsáveis por deslocar as vendas internas de produto chinês, que cresceram continuamente ao longo do período da investigação", frisa a nota. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.