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'Queremos vender energia como vendemos combustíveis', diz CEO da Vibra

CEO da empresa antes conhecida como BR Distribuidora conta em entrevista da estratégia em combustíveis renováveis, da entrada em energia elétrica e da escalada do preço de combustíveis

Wilson Ferreira Junior, CEO da Vibra: "teremos ter uma plataforma de energia como já temos uma plataforma de distribuição de combustíveis" (Germano Lüders/Exame)

Wilson Ferreira Junior, CEO da Vibra: "teremos ter uma plataforma de energia como já temos uma plataforma de distribuição de combustíveis" (Germano Lüders/Exame)

BA

Bianca Alvarenga

Publicado em 4 de novembro de 2021 às 06h05.

Última atualização em 4 de novembro de 2021 às 08h45.

Antes de passar pela mudança que a transformou em Vibra Energia (VBBR3), a BR Distribuidora colecionou quase cinco décadas como distribuidora de derivados do petróleo. A virada na gestão da empresa, que começou com a saída da Petrobras (PETR3/PETR4) do controle, pretende mudar radicalmente a atuação da Vibra nas próximas décadas. O objetivo principal é trazer outras fontes de receitas, deixando de depender somente dos combustíveis fósseis.

Para tanto, a companhia começou tomando duas decisões importantes. A primeira foi o estabelecimento de acordos para a entrada no segmento de combustíveis renováveis (uma joint venture com a Copersucar para a comercialização de etanol e uma parceria com a ZEG para o fornecimento de biometano, um tipo de biogás). A segunda decisão estratégica foi a compra de 50% da Comerc, maior empresa do país em comercialização e gestão de energia elétrica.

A última decisão tem as digitais do novo CEO da Vibra, Wilson Ferreira Junior. Antes de assumir a empresa, em março passado, o executivo foi presidente da Eletrobras (ELET3/ELET6) por quase cinco anos e conduziu a estatal de energia por um processo de reestruturação e saneamento de contas, com consequente valorização das ações. Em entrevista à EXAME Invest, Ferreira Junior falou das mudanças na Vibra e dos próximos passos para a empresa.

Por que a Vibra decidiu pela mudança completa em sua visão estratégica?

Eu estudei bastante o setor, antes de chegar à empresa, no dia 16 de março. Na época, nas conversas que tive com acionistas, conselheiros e consultores, senti muita falta de uma visão de longo prazo para a empresa. O que a BR será depois dos 50 anos, que a empresa completa em novembro? Chamei o BCG (Boston Consulting Group), a consultoria mais relevante no setor de óleo e gás, e a encomenda foi essa: precisamos de uma visão de longo prazo para a empresa.

Estamos em meio à COP26 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), o Brasil vive uma série crise hídrica, o mundo está falando muito fortemente de mudanças climáticas e de descarbonização. Mais da metade das emissões de gás estão ligadas à produção de energia elétrica. Se quisermos reverter a curva de emissões até 2050, como é o compromisso, precisamos ter mudança no consumo de combustíveis, e a Vibra é maior distribuidora de combustíveis do Brasil.

Como a empresa pretende participar dessa transição energética?

A consciência das pessoas está indo na direção correta, para uma transição para uma economia de baixo carbono. O Brasil tem vantagens importantes nessa jornada. Enquanto o mundo tem 20% de energia elétrica renovável, o Brasil tem 80% (60% de hidrelétricas e 20% de usinas eólicas, solares, e de biomassa). Na mobilidade também temos uma situação diferenciada, porque desde a década de 70 investimos na frota flex de carros.

Temos na Vibra 15 mil clientes corporativos: são empresa como Vale e Gerdau, que consomem vários tipos de combustíveis, como diesel, gás e lubrificante em seus processos produtivos. Essas empresas também já têm consciência da necessidade de substituir os combustíveis mais poluentes. Em função disso, percebemos que deveríamos nos posicionar como uma fornecedora de combustíveis do futuro. A parceria com a ZEG, que produz gás biometano, vem daí.

Esse cenário futuro vai afetar também os postos de combustíveis e o segmento de automóveis?

O mundo fala em ter um estoque de carros elétricos que represente 30% do total, em um horizonte de dez ou vinte anos. Acho que no Brasil vai ser diferente, porque nossos veículos já têm um tipo de combustível menos poluente. Devemos ter um estoque de 10% de carros elétricos e híbridos, sendo que dois terços dos híbridos devem ser movidos a etanol. A partir de 2030, o etanol deve ser o principal combustível para frota de veículos brasileira.

Por isso, entendemos que precisávamos ser mais competitivos nessa frente, então firmamos uma parceria de comercialização de etanol com a Copersucar. Nosso objetivo é estimular o acesso de empresas e consumidores a esse combustível.

Agora que falamos de combustíveis, qual a estratégia da Vibra na frente de energia elétrica? 

O mercado brasileiro tem 80 milhões de consumidores de energia, sendo que desses 80 milhões, pouco mais de 20 mil estão na categoria de consumidores livres e correspondem a 30% da energia utilizada no país. São clientes de grande porte, empresas, que podem comprar energia de quem quiserem. Desses 20 mil grande consumidores, 45% já são clientes da Vibra. Entendemos, então, que a empresa precisava ter uma plataforma de energia como já temos uma plataforma de distribuição de combustíveis.

Já tínhamos uma iniciativa nesse sentido, porque compramos uma pequena comercializadora, a Targus, no ano passado, e decidimos fazer uma joint-venture com a Comerc, e assim assumirmos o posto de maior comercializadora de energia do país.

Aliás, a compra da Comerc aconteceu nos "45 minutos do segundo tempo", na véspera da entrada da empresa na bolsa de valores. Como foi essa negociação?

Já estávamos olhamos esse mercado das comercializadoras, a consultoria que contratamos trouxe vários nomes possíveis, e vimos que a Comerc era a que tinha fit melhor com o que queríamos fazer, que é tratar a energia elétrica como tratamos o combustível. Só que a Comerc já tinha começado o movimento do IPO, e não pegamos a negociação a tempo. Evidentemente, tivemos um cancelamento enorme de operações na bolsa no ano, por causa da piora no cenário econômico, e a Comerc percebeu que talvez não fosse precificar sua oferta da forma esperada. Fizemos, então, uma proposta e oferecemos mais do que o valor que o IPO havia precificado. Nossa ambição é manter a essência do que fez a Comerc ser grande e relevante. Somos especialistas em combustíveis, não somos especialistas em comercialização de energia, mas queremos ser.

Quais os planos para a rede de postos BR?

Temos mais de 8 mil postos espalhados pelo Brasil. Vamos continuar distribuindo combustível fóssil, porque essa ainda é a realidade da frota de carros brasileira, e a demanda por combustíveis tem crescido, por causa da volta da mobilidade das pessoas. Em 2020, adicionamos 240 novos postos à nossa rede, e neste ano devemos ter algo semelhante a isso.

Estamos, também, aumentando os serviços nos nossos postos, oferecendo desde carregadores para veículos elétricos, passando por serviços de click and collect de varejistas, e até ampliando nossa rede de conveniência, a BR Mania.

Nosso produto não é só a gasolina: pode ser também um café de manhã, para começar o dia melhor. No Brasil, só 15% dos postos têm loja de conveniência, frente a 70% na Europa, e 50% nos nossos vizinhos Argentina e Uruguai. Nossa joint venture com a Lojas Americanas vai colocar mais mil lojas de conveniência nos postos BR nos próximos quatro anos.

Qual a visão da empresa sobre disparada de preços da gasolina e do diesel? Existe uma forma de mitigar o problema?

Não existe solução simples para o problema. Combustíveis são commodity e, por isso, são precificados no exterior, em paridade com preço do petróleo. O barril do Brent esteve cotado a 70 dólares no começo da pandemia, chegou a valer literalmente nada no ano passado, por causa da redução brusca de demanda, e agora está a 80 dólares. É algo próprio de commodities. Além disso, ainda temos a influência do câmbio, por ser um produto dolarizado.

Muita gente pergunta por que os combustíveis precisam acompanhar o preço externo, dado que produzimos petróleo aqui, mas nem todos sabem que de todo combustível consumido aqui, 70% é produzido em solo nacional e 30% é importado. O país cresceu e não ampliamos capacidade de refino, muito porque o mercado internacional é ofertante, e não compensa fazer esse investimento. Se não seguirmos a paridade de preço externo, vamos ter um problema de fornecimento.

A Petrobras informou que não conseguirá atender toda a demanda doméstica de novembro. Existe um risco de desabastecimento no mercado de combustíveis?

Estamos vivendo um período excepcional no Brasil e no mundo. A recuperação pós-pandemia deve ser de preços mais altos, porque as empresas do setor de petróleo não ajustaram as cadeias. Está claro que vamos ter um novembro com um "normal melhor", por causa do avanço da vacinação, e dada a perspectiva de melhora, as cadeias de produção tendem a se ajustar. Acho que vamos ver uma normalização no fornecimento daqui pra frente.

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