Sede do Federal Reserve: integrantes do Fed ouviram educadamente, aumentaram os juros nos EUA em dezembro e depois pararam (thinkstock)
Da Redação
Publicado em 2 de maio de 2016 às 21h45.
No ano passado, algumas vozes influentes pediram que o Federal Reserve não elevasse as taxas de juros, temendo que a medida desacelerasse o crescimento mundial e gerasse turbulências financeiras.
Os integrantes do Fed ouviram educadamente, aumentaram os juros nos EUA em dezembro e depois pararam. Tendo em vista os acontecimentos recentes nos mercados de moedas, talvez algumas dessas vozes agora estejam se perguntando se o Fed deveria retomar os aumentos de juros.
Esse processo de reflexão aparentemente contraditório revela as condições desfavoráveis que surgiram da longa busca, empreendida pelas economias de maior importância sistêmica do mundo, por um conjunto extremamente desequilibrado de políticas econômicas. São três as condições: uma configuração de taxas de câmbio de economias avançadas que parece ter deixado de reagir ‘normalmente’ aos diferenciais de juros; medidas parciais de política econômica, cujo impacto é ínfimo diante dos efeitos que poderiam resultar de uma abordagem mais abrangente; e os crescentes riscos de gerar ondas de instabilidade nos mercados financeiros mundiais.
Nas economias que funcionam normalmente, um aumento das taxas de juros ajudaria a desacelerar a atividade ao encarecer o consumo estimulado por empréstimos e investimentos. Também haveria impacto sobre os fluxos de fundos que cruzam fronteiras, atraindo mais recursos porque os investidores tentariam obter retornos mais altos. A consequente valorização da moeda, pressupondo flutuação relativamente limpa, também reduziria a competitividade das exportações, o que intensificaria a desaceleração econômica.
Antes da reunião do Fed em dezembro para definir a política monetária, alguns – inclusive o Fundo Monetário Internacional – temiam, compreensivelmente, que um aumento dos juros realizado pelo banco central mais importante do mundo poderia gerar turbulências na economia global, que ainda não tinha estabelecido uma base econômica e financeira suficientemente forte. Embora esses especialistas tenham admitido que os EUA eram a economia avançada mais bem posicionada em termos de crescimento e geração de emprego, eles expressaram o temor de que os juros mais altos do Fed sugassem capital dos países emergentes, provocassem desaceleração mais generalizada do crescimento e trouxessem riscos de instabilidade financeira mundial. Os acontecimentos em janeiro e no começo de fevereiro pareciam confirmar esses temores, mas é provável que o susto com o crescimento da China tenha causado impacto muito maior sobre os mercados do que a decisão do Fed.
Pelo menos na teoria, o pequeno passo que o Fed deu para ajustar a política monetária foi mais do que compensado pela flexibilização que veio depois, realizada por três outros bancos centrais importantes sistemicamente: China, zona do euro e Japão. Implementando taxas de juros mais baixas, inclusive negativas na Europa e no Japão, e intensificando a compra de ativos, as três instituições fizeram um esforço valente para estimular a demanda, tanto de forma direta quanto tentando desvalorizar suas próprias moedas.
Poucos meses depois, o impacto sobre as taxas de câmbio contrariou as expectativas e foi contraproducente para o reequilíbrio mundial. Em vez de se desvalorizarem, o euro e o iene se fortaleceram notavelmente frente ao dólar, se somando aos ventos contrários em termos de crescimento econômico e inflação. Na semana passada, o Tesouro dos EUA colocou cinco países, inclusive China, Japão e Alemanha, em uma lista de observação. As práticas cambiais desses países serão monitoradas de perto para determinar se estão obtendo vantagem comercial injusta.
Então, o que explica esses mercados cambiais confusos?
Como argumentei em março, diferenciais de juros podem deixar de ser eficientes na condução das taxas de câmbio quando passam de certo ponto. E mesmo que esse não fosse o caso, o impacto desejado sobre a atividade econômica sucumbiria aos problemas mais profundos de insuficiência de mecanismos estruturais de crescimento, deficiências da demanda agregada, desigualdade alarmante e bolsões de endividamento excessivo.
Esse é outro motivo para desaconselhar a dependência contínua de algo que já mostrou ser uma política econômica extremamente desequilibrada. Quanto mais os países sistemicamente importantes continuarem dependendo excessivamente dos bancos centrais – e não conseguirem sustentar uma resposta de política econômica mais abrangente –, maior será o risco de que a economia mundial arque com os custos da volatilidade das moedas, enquanto obtém poucos ou nenhum dos benefícios esperados das flutuações das taxas de câmbio. Paralelamente, as movimentações cambiais poderiam se tornar ainda mais contrárias ao esperado.