Gavekal: O mercado iniciou o ano como se o mundo já tivesse ganho a guerra contra a inflação (Spencer Platt/Getty Images)
Repórter
Publicado em 19 de fevereiro de 2024 às 10h31.
Última atualização em 19 de fevereiro de 2024 às 11h02.
O mercado iniciou o ano como se o mundo já tivesse ganho a guerra contra a inflação. De tanto otimismo, ainda nos primeiros dias de 2024, investidores chegaram a precificar mais de 70% de chance de o primeiro corte de juro dos Estados Unidos vir ainda em março. Mas as projeções estão sendo rapidamente revisadas diante de índices de preços acima do esperado e falas mais conservadoras por parte de dirigentes do Federal Reserve, o banco central americano. Entre seus membros, o posicionamento é uníssono: os cortes virão, mas não agora. Entre investidores, há discordância sobre quando será o início do ciclo de cortes. Mas há uma dúvida principal: o quanto a economia americana ainda irá sofrer com as taxas de juros na máxima histórica. A recessão, esperada no ano passado, não veio. O consenso, porém, é de que o crescimento será menor. Mas o economista Anatole Kaletsky, co-fundador da Gavekal Research, acredita que a desaceleração econômica representa um risco muito menor que o de um repique da inflação americana.
"Se alguma coisa acontecer no próximo ano que perturbe as perfeitas condições agora precificadas pelos mercados, o problema assumirá a forma de um boom inflacionário, e não de uma crise deflacionária", afirma Kaletsky em relatório da Gavekal.
O economista ressalta ainda que os recentes dados econômicos têm apontado para um risco inflacionário maior que o esperado pelos investidores, a exemplo do Índice de Preço ao Consumidor (IPC) dos Estados Unidos divulgado na semana passada. O IPC anual ficou em 3,1% ante expectativa de queda de 3,4% para 2,9%. "A inflação estrutural medida pelo IPC tem-se mantido estável na região de mais de 3% nos últimos seis meses, sem qualquer evidência de tendência descendente para 2%", diz Kaletsky. "A média ajustada do IPC 'fixo' permanece no intervalo de 4% a 6%."
Os mercados reagiram mal, na semana passada, ao IPC acima do esperado. Mas o pessimismo durou pouco, com os principais índices de ações voltando a subir nos dias seguintes.
"Talvez os investidores simplesmente se recusem a acreditar nos recentes dados econômicos. A maior parte das carteiras estão hoje posicionadas para uma “desinflação imaculada indolor'", afirma o economista. Kaletsky ainda pontua que, como hedge, os fundos estão posicionados em ativos que protegem contra a recessão, e não em posições defensivas contra a inflação.
"Com essa estrutura de portfólio, contemplar a possibilidade de um boom inflacionário pode ser simplesmente doloroso demais. Como disse Upton Sinclair 'é difícil fazer um homem entender algo quando seu salário depende de não entender'. Assim, muitos investidores preferem procurar razões para não acreditar nos dados, em vez de reconhecer que as suas carteiras estão mal estruturadas."