Gilson Finkelsztain: essa é a primeira entrevista do executivo desde que assumiu o cargo, há um ano (Cetip/Divulgação)
Estadão Conteúdo
Publicado em 19 de abril de 2018 às 07h35.
Última atualização em 19 de abril de 2018 às 07h36.
Com o mercado acompanhando com lupa os desdobramentos das eleições ainda bastante incertas de outubro, o presidente da B3, a Bolsa paulista, Gilson Finkelsztain, diz que um próximo presidente com comprometimento com a agenda fiscal do País poderá garantir um ciclo longo de crescimento à economia brasileira e, na esteira, ao mercado de capitais.
Em entrevista ao Estadão/Broadcast, a primeira desde que assumiu o comando da quinta maior bolsa do mundo, há quase um ano, o executivo afirma que chegou a hora de o Brasil “parar de perder oportunidades”, principalmente neste momento em que as peças estão alinhadas para garantir o desenvolvimento do mercado, em especial por causa da taxa de juros, “no nível mais baixo da história”. A seguir, os principais pontos da entrevista.
Qual tem sido a resposta dos clientes após a fusão entre BM&FBovespa e Cetip?
Foi fundamental antes de fechar a operação envolver os clientes, para a fusão não ser uma agenda apenas das companhias e gerar desconfiança. A companhia está em um momento bom, passou por um grande ciclo de investimento de infraestrutura (de R$ 2 bilhões no total), com todos os projetos de TI das duas companhias integrados, mesmo com um País com mercado que não cresceu tanto. Agora é aproveitar esse momento bom de Brasil que estamos esperando.
E o momento é bom?
Os astros parecem estar bem alinhados. O mundo está crescendo e com juros baixos. No Brasil, a inflação está sob controle, com juros baixos e uma agenda de reformas. O Brasil está com uma oportunidade pós-eleição que não deveria perder. E somos mestres em perder oportunidade. O Brasil não perde a oportunidade de perder uma oportunidade. Está na hora de mudar isso.
O que é necessário para termos, de fato, o desenvolvimento do mercado de capitais no Brasil?
Estamos vivendo um ciclo de retomada. Há dúvida em relação à velocidade, mas isso não é tão relevante para a agenda de longo prazo do mercado de capitais. O Brasil provavelmente vai entrar em ciclo de crescimento de três a cinco anos. É pouco relevante para essa agenda se vamos crescer 2,5% ou 3% por ano, mas sim se vamos ter um ciclo longo de crescimento. O que é necessário é não reinventar a roda. O que o mercado espera do próximo presidente é uma agenda reformista, um comprometimento com a agenda fiscal. O mercado não tem uma expectativa muito diferente basta isso. Óbvio que ninguém espera que a gente cometa os mesmos erros do passado, como intervenção de bancos estatais e um BNDES que tente ser o salvador do investimento.
E o cenário para o mercado com os juros baixos?
Juro baixo é transformacional para mercado de capitais. Pessoas físicas e investidores institucionais mudarão a dinâmica de investimento. Os investidores terão que diversificar classe de ativos. Hoje só temos 340 empresas listadas. Os investidores institucionais não negociam renda fixa no mercado secundário e pouco negociam ações. Apesar de termos um mercado financeiro robusto, ele ainda é distante do que pode ser em termos de complexidade e volume.
O número de pessoas físicas na Bolsa tende a crescer?
As pessoas estão começando a perceber no bolso, no extrato, com juro baixo, como o seu investimento rende pouco. Agora perceberão e se educarão de como é importante diversificar ativos, tomar mais risco e perder liquidez. E os fundos de ações têm muito a crescer. Teremos fundos crescendo e pessoas físicas crescendo.
As empresas estão voltando a captar para fazer investimentos?
Vemos uma melhora. As grandes empresas têm agenda maior de investimento, mas ainda aquém do crescimento do crédito de pessoa física. Isso significa que as grandes empresas estão demorando para investir. Talvez a capacidade ociosa e a incerteza de eleição façam com que algum investimento seja adiado, mas as emissões melhoraram bastante.
Podemos ter uma janela aberta para captações, apesar das eleições?
Na medida em que os programas econômicos dos candidatos ficarem mais claros e entendermos um pouco a dinâmica do que podem ser as eleições, acho que poderemos iniciar a retomada das emissões. E até uma abertura da janela no fim do ano. No meio do ano já ficará claro quem são os candidatos e seus programas econômicos. Com o mínimo, o Brasil está preparado para crescer. Se tiver clareza de que não virá nenhuma ruptura, alguma ‘exoticidade’ do lado do plano econômico, todo mundo vai acelerar investimento.
E qual tem sido a percepção do investidor estrangeiro?
Ninguém tem um viés negativo de Brasil. Mas a incerteza com a eleição traz cautela. Todos, sem exceção, estão com vontade de alocar no Brasil, dentro dos mercados emergentes.
A autonomia do Banco Central (BC) seria importante nesse momento?
Muito. A gente deveria aproveitar a janela. Com todas as críticas que pode ter a esse governo de transição, essa seria mais uma das boas heranças que ele poderia deixar. Eu colocaria o teto de gastos, a reforma trabalhista, que será algo transformacional. E a independência do BC seria algo maravilhoso passar agora. Tiraríamos isso da frente, está na agenda há 15 anos. As transições futuras ficarão mais fáceis.
A B3 analisa o mercado de criptomoedas?
A tecnologia por trás é o que mais nos interessa, o blockchain. Criptomoeda está no nosso radar. Houve demanda de cliente por derivativo de balcão, mas não iremos atender, exatamente pela orientação de Comissão de Valores Mobiliários e BC. Mas há algumas lições que temos tido com esse mercado e que têm a ver com nosso negócio: tem uma geração que gosta de negociar mobile, de negociar 24 horas e isso está no nosso radar. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.