Le Grazie é o mais recente nome entre os funcionários de alto escalão do governo anterior a se juntar ao setor privado (Edilson Rodrigues/Agência Senado)
Guilherme Guilherme
Publicado em 24 de setembro de 2019 às 10h23.
O ex-diretor de política monetária do Banco Central Reinaldo Le Grazie está de volta à indústria de gestão de recursos de terceiros no Brasil.
Le Grazie se uniu à gestora de recursos Panamby Capital para lançar um novo fundo multimercado, que vai ter como missão encontrar as companhias vencedoras da transformação digital que tem varrido a maior economia da América Latina. A expectativa é que o fundo seja lançado até o final de outubro, disse Le Grazie em entrevista.
“Existem várias empresas lutando pela supremacia digital no Brasil”, afirmou ele. “Queremos ser especialistas nisso.” Le Grazie disse que está estudando impactos da digitalização em companhias nos setores de pagamentos, bancos e consumo.
O fundo será chamado Panamby Inno -- “Inno” de inovação -- e vai investir cerca de 40% de seus ativos em ações. O fundo também terá um livro de renda fixa focado em ativos brasileiros e um “back book”, que comprará proteção e manterá a volatilidade sob controle, disse Le Grazie.
O fundo vai estrear com capacidade suficiente para gerir até R$ 5 bilhões, de acordo com Le Grazie, que chefiará o comitê de investimentos. Pedro Mollo, veterano de 25 anos do Banco Votorantim, será o diretor de investimentos.
O foco de Le Grazie na inovação não é um acaso: durante seu mandato no Banco Central, ele foi um dos arquitetos de mudanças regulatórias que promoveram concorrência e reduziram taxas no setor de pagamentos do Brasil, incluindo limitar as taxas de intercâmbio de cartões de débito e eliminar obstáculos para a aceitação de cartões.
Ele também tem experiência com gestão de ativos, tendo passado cinco anos na BRAM, a gestora do Banco Bradesco e terceira maior do país -- incluindo um período, entre 2014 a 2016, em que foi o presidente da companhia.
A empresa em que Le Grazie está ingressando, a Panamby Capital, foi fundada por Mollo e outros sócios no final do ano passado, como uma gestora de fortunas e de fundos estruturados. A chegada de Le Grazie marca a expansão para multimercados abertos a investidores institucionais e de varejo. A Panamby possui ao redor de 30 funcionários. Cerca de 12 vão trabalhar nos fundos de mercado.
A indústria de fundos multimercado no Brasil está em um momento de alta, já que caminha para o quarto ano consecutivo de captação líquida positiva, totalizando cerca de R$ 200 bilhões em dinheiro novo desde 2016.
“A política monetária, com o juro na mínima histórica, faz com que os investidores saiam em busca de ativos de risco ao mesmo tempo em as plataformas digitais trouxeram pessoas para a indústria que haviam sido deixadas de fora”, disse Le Grazie.
O ex-diretor do BC espera que a Selic, atualmente no menor nível histórico de 5,5%, fique ainda mais baixa, chegando perto de 4,5% quando o Banco Central terminar o ciclo. A velocidade dos cortes “deve ser a mais rápida possível, para deixar claramente estimulativo”, disse ele. Na sua visão, o maior risco para o crescimento do Brasil está na falta de reação na taxa de investimento do setor privado, algo que vai depender de o governo ser capaz de acelerar as vendas de ativos estatais, disse ele.
“Se tivermos uma trégua de guerra comercial e os investidores voltarem ao modo ‘risk on’, isso será bom para juros e ações brasileiras”, disse Le Grazie. Já a tendência para o câmbio é mais difícil de dizer, segundo ele, porque depende de fatores como a piora da balança comercial do Brasil e pelo fato de que baixas taxas de juros tornam o real menos atraente para os investidores que buscam carry trade.
Le Grazie é o mais recente nome entre os funcionários de alto escalão do governo anterior a se juntar ao setor privado. O ex-presidente do Banco Central Ilan Goldfajn ingressará no Credit Suisse Group como presidente do conselho no Brasil, anunciou o banco no início deste mês. O ex-ministro da Fazenda Eduardo Guardia foi recrutado pelo Banco BTG Pactual como sócio e chefe de sua unidade de gestão de ativos, e Ana Paula Vescovi, ex-secretária do Tesouro, agora comanda o departamento macroeconômico do Santander Brasil.