A presidente Dilma conseguiu que se aprovasse o projeto de lei que limita o valor das aposentadorias dos funcionários públicos e cria fundos de pensão para esses trabalhadores (Roberto Stuckert Filho/PR)
Da Redação
Publicado em 4 de abril de 2012 às 13h26.
São Paulo/Brasília - O país começa a deixar para trás décadas de financiamento das aposentadorias de funcionários da União com a aprovação do projeto que cria a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público, ou Funpresp. O fundo vai fomentar o mercado de dívida ao gerar demanda de até R$ 4,8 bilhões por ano por títulos domésticos.
A Presidente Dilma Rousseff conseguiu que o Congresso aprovasse, na semana passada, o projeto de lei que limita o valor das aposentadorias dos funcionários públicos e cria fundos de pensão para esses trabalhadores. A Funpresp terá sede em Brasília e deverá contar, em 20 anos, com cerca de R$ 150 bilhões em recursos de 500.000 contribuintes, segundo Jaime Mariz, secretário de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social.
O projeto de lei, enviado ao Congresso em 2007, pode ajudar a reduzir o saldo negativo da Previdência que, no ano passado, foi responsável por um terço do déficit nominal brasileiro de R$ 94 bilhões. O país procura reduzir o déficit previdenciário num momento em que a Grécia foi forçada a cortar as aposentadorias em meio à crise financeira.
“A sociedade não vai ter uma conta surpresa para resolver lá na frente” como na Grécia, disse Joaquim Levy, diretor- superintendente da Bradesco Asset Management, ou BRAM, em entrevista por telefone de Washington. “O fundo vai investir pelo menos 60 por cento em títulos do governo.”
Em nota enviada por e-mail, o Ministério da Fazenda disse que, para traçar estimativas sobre as aplicações do fundo, será preciso antes elaborar uma política de investimentos para os próximos cinco anos e passar pela aprovação do Conselho Deliberativo da Funpresp.
Três fundos
A taxa das Notas do Tesouro Nacional série F com vencimento em 2021 caiu 15 pontos-base, ou 0,15 ponto percentual este ano, para 11,17 por cento, de acordo com dados da Bloomberg. O rendimento de papéis do governo mexicano em pesos e com prazo similar caiu 30 pontos-base durante o mesmo período, para 6,19 por cento.
Dividida em três fundos - para o Executivo, Legislativo e Judiciário - a Funpresp deverá ter depósitos anuais de até R$ 8 bilhões com a contratação de cerca de 20.000 servidores por ano nos próximos cinco anos e com a migração de trabalhadores efetivados no serviço público após 2003, segundo estimativas de Levy. O Bradesco planeja fazer proposta para administrar recursos dos fundos, ele disse.
O Ministério da Fazenda estima que a Funpresp comece a operar no segundo semestre de 2013.
‘Conservadora’
“Na largada, será muito conservadora a forma dos investimentos. Será muito mais renda fixa”, disse Fernando Brandão, responsável pelo relacionamento e distribuição de fundos de investimentos do Credit Suisse Hedging-Griffo Asset Management SA para investidores institucionais. “A palavra de ordem é tomar mais risco para ter resultado. Naturalmente, diante do cenário que a gente está vivenciando, taxa de juros cadentes, eles vão precisar alongar esse perfil”, disse em entrevista por telefone.
O Credit Suisse Hedging-Griffo Asset Management ajuda a administrar R$ 30 bilhões em ativos, incluindo fundos de pensão.
O Banco Central vai reduzir a taxa básica de juros de 9,75 para 9 por cento até o fim do ano, de acordo com a última pesquisa semanal do BC com economistas, divulgada em 2 de abril. A autoridade monetária cortou a Selic em 275 pontos-base desde agosto.
Renda variável
Para José de Souza Mendonça, presidente da Associação Brasileira de Previdência Privada, a Abrapp, juros mais baixos reduzirão o interesse em renda fixa, levando a Funpresp a investir em ações.
“TÍtulo do governo está atraindo cada vez menos,” disse em entrevista por telefone de Porto Alegre. “Isso necessariamente vai ter que ir para o mercado de capitais, bolsa, o risco privado.”
A Funpresp terá limites para o quanto poderá ser investido em títulos corporativos, renda variável, imóveis, projetos de infraestrutura e ativos no exterior, e ao mesmo tempo será autorizada a aplicar 100 por cento de seus recursos em títulos públicos locais.
Aposentadorias menores
Os funcionários públicos são contra o projeto, alegando que investimentos no mercado vão representar aposentadorias menores no futuro.
“Somos contra esse regime porque arrisca as aposentadorias dos trabalhadores”, disse Rogério Expedito, secretário-geral adjunto da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal, ou Condsef, em entrevista por telefone de Belo Horizonte. “Pessoas vão pagar a vida inteira sem ter certeza de que terão retorno. Quando voce trabalha com o mercado, nao há aplicação de risco zero. A gente vê outros países quebrando por causa do tal mercado financeiro.”
O país teve um custo de R$ 36 bilhões no ano passado para cobrir as aposentadorias de 960.000 servidores públicos. Já o gasto com o pagamento de benefícios a 29 milhões de aposentados do regime geral ficou em R$ 36,5 bilhões, segundo o Ministério da Previdência.
O fundo é um grande passo fiscal para a consolidação das contas públicas, disse o ministro Guido Mantega, em 29 de março.
Impacto em preços
Segundo a nova lei, o pagamento mensal do governo de aposentadorias de funcionários públicos ficará limitado a R$ 3.916. Servidores que quiserem uma aposentadoria maior, terão que fazer sua própria contribuição com a Funpresp. Atualmente, os aposentados do serviço público federal recebem 80 por cento do salário médio nos últimos 10 anos de trabalho.
Isso significa um gasto médio de R$ 6.592 por mês com aposentados do poder Executivo, R$ 15.427 com os do Judiciário e R$ 23.140 com aqueles do Legislativo, de acordo com dados do Ministério do Planejamento.
“Claramente será uma fonte de economias que vão constituir uma importante nova demanda por papéis brasileiros, que pode ter um impacto direto nos preços”, disse Christopher Garman, analista para a América Latina do Eurasia Group em Nova York, em relatório de 29 de março. A reforma “criará o maior fundo de pensão fechado do país, com potencial para ter impacto significativo na demanda por ativos brasileiros.”