Evandro Buccini, sócio-diretor da Rio Bravo: "A quebra de safra não foi tão grande, mas, quando combinada com a queda dos preços das commodities, impacta bastante" (Rio Bravo/Divulgação)
Repórter
Publicado em 2 de outubro de 2024 às 14h44.
Última atualização em 2 de outubro de 2024 às 14h45.
A força do agronegócio nos últimos anos e a busca por ativos isentos de imposto de renda impulsionaram o mercado de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs). No entanto, fatores inesperados, como a quebra de safra e a queda nos preços das commodities, têm ameaçado a capacidade do setor de honrar suas dívidas. Diante dessa incerteza, muitos investidores estão desfazendo suas posições em Fiagros, fundos que financiam o agronegócio, o que resultou em uma queda generalizada no valor das cotas.
"Talvez seja uma crise. Os Fiagros estão 20% a 30% abaixo do valor patrimonial. Acho que é algo sistêmico, porque até Fiagros de gestoras de alta qualidade estão sofrendo. A quebra de safra não foi tão grande, mas, quando combinada com a queda dos preços das commodities, impacta bastante", disse Evandro Buccini, economista e sócio-diretor da Rio Bravo, em entrevista ao programa Vozes do Mercado, da Exame Invest.
Embora sejam listados na bolsa, Buccini explica que os Fiagros possuem características muito diferentes de outros fundos, como os fundos imobiliários ou de infraestrutura.
"Os fundos imobiliários se tornaram um sucesso, com milhões de investidores, graças à qualidade, segurança e previsibilidade. Depois vieram os fundos de infraestrutura, com características semelhantes em termos de crédito. Mas o mercado agrícola, que parecia ser um 'copia e cola', não é o caso. A cada safra, começa tudo do zero. Você está muito mais exposto ao clima, o que torna o setor mais volátil e arriscado", disse. "Os Friagros vão ter que sair diferentes do que entraram nessa crise, talvez com juros mais baixos e amortizações casadas com as colheitas."
A Rio Bravo é uma das principais gestoras independentes do Brasil, com R$ 13,6 bilhões sob gestão, sendo mais de R$ 12 bilhões em fundos imobiliários.
Além dos fundos, os CRAs atraíram muitos investidores pessoa física, principalmente por causa dos altos rendimentos e da isenção fiscal. Esses investidores, com menor volume de poupança, aumentaram significativamente suas posições em CRA. Segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), o volume investido diretamente em CRAs triplicou para R$ 72,6 bilhões nos últimos dois anos e meio. O maior risco, em caso de inadimplência, é o investidor perder todo o capital.
"Cada CRA, CRI ou debênture envolve uma papelada de milhares de páginas. Se a pessoa conseguir ler tudo, poderá selecionar os títulos adequados. Caso contrário, é muito melhor aproveitar essas emissões por meio de um fundo, que é diversificado. Alocar diretamente é complicado em qualquer classe de ativos", comentou Buccini.
Apesar das preocupações com CRAs, Buccini vê boas oportunidades no mercado de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), onde é possível encontrar rendimentos atrativos com boas garantias. "Hoje, há CRIs pagando IPCA + 9%, com boas garantias."
Ele explica que o spread relativamente elevado é resultado da queda no volume de poupança, o que tem reduzido a oferta de crédito pelos bancos. Esses spreads são significativamente maiores do que os encontrados no mercado de debêntures, onde a forte captação dos fundos de renda fixa tem tornado mais barato o custo de emissão de dívida.
Na Rio Bravo, os fundos de crédito têm adotado uma postura mais defensiva, aumentando o caixa e reduzindo o prazo dos títulos. "Se houver um aumento muito rápido dos spreads, pode haver uma marcação a mercado. O investidor, às vezes, não entende e pede o resgate. Por isso, precisamos proteger o fundo dessa volatilidade."
Embora considere o risco de que a abertura dos spreads possa gerar um efeito manada, Buccini destaca que os fundos têm aumentado o caixa para garantir liquidez em caso de resgates. "Não vejo um risco de liquidez no mercado."