Eletrobras: ministério de Minas e Energia vai pedir privatização da companhia, que acumula dívidas de 40 bilhões de reais (Furnas/Divulgação)
EXAME Hoje
Publicado em 22 de agosto de 2017 às 11h15.
Última atualização em 22 de agosto de 2017 às 18h08.
São Paulo -- As ações da Eletrobras dispararam nesta terça-feira com a notícia de que o Ministério de Minas e Energia vai propor a privatização da companhia. Na bolsa brasileira, os papéis preferenciais terminaram o dia em alta de 32,36% a 23,60 reais, enquanto os ordinários tinham ganhos de 48,94%, a 21,15 reais.
“A medida é espetacular. Qualquer métrica que você analise, a empresa é extremamente ineficiente e tem uma série de amarras do setor publico”, diz um analista que acompanha a empresa. “Deve facilitar especialmente a venda de ativos. Como empresa pública, é preciso passar pela aprovação de uma série de instâncias, como o Tribunal de Contas da União”.
O governo tem 51% das ações ordinárias da companhia (com direito a voto) e 40,99% do capital total. O plano é que o governo venda parte das ações na bolsa, mantenha uma participação, mas deixe de ser controlador. A proposta, que começou a ser costurada há duas semanas como opção ao crescente deficit fiscal do país, ainda precisa ser aprovada pelo conselho do Programa de Parcerias e Investimentos.
Apesar da euforia desta terça-feira na bolsa, analistas afirmam que apenas o detalhamento do plano vai permitir calcular quanto de fato vale a companhia, e quanto o governo vai conseguir arrecadar – as primeiras estimativas falam em 20 bilhões de reais. De qualquer forma, como mostra o desempenho das ações, o plano foi muito bem recebido. O principal temor sempre que se fala em privatização da Eletrobras é concentrar geração e transmissão nas mãos de um único grupo. “Mas da forma como o governo quer fazer não se corre esse risco”, diz a economista Elena Landau, até julho presidente do conselho de administração da companhia. “Nenhum grupo será dono da Eletrobras. O percentual vai ser colocado no mercado. É uma privatização Madura e o mercado de capitais está preparado para isso”.
Como lembra a economista, a motivação do plano, como costuma acontecer com privatizações no Brasil, é fiscal. Mas ele também reforça a delicada situação da companhia. Apesar da elogiada gestão do engenheiro Wilson Ferreira, que assumiu a companhia há um ano, tirar o negócio da lama estava sendo mais difícil que o imaginado. A Eletrobras acumula dívidas de 40 bilhões de reais e continua muito longe da normalidade.
Na bolsa, a companhia vale apenas 19,5 bilhões de reais – um terço de seu faturamento em 2016. Quando Ferreira assumiu, com apoio e otimismo do mercado, a empresa valia 23,9 bilhões de reais. Em outubro do ano passado, no auge de sua valorização nos últimos 12 meses, a Eletrobras chegou a ter valor próximo dos 35 bilhões de reais. De lá para cá, no entanto, as ações voltaram a cair em virtude, segundo analistas, da lentidão na execução do plano traçado por Ferreira.
Da porta para fora, um ambiente político conturbado jogou para baixo o preço da companhia, com o receio dos investidores de que Ferreira não tenha tempo hábil para cumprir seus ambiciosos planos. O mandato do executivo vai até abril de 2019, mas as eleições de 2018 podem encurtar o mandato e fazer ruir todos os avanços vistos até aqui.
Mas os maiores desafios da Eletrobras são internos, apesar dos avanços. De 2012 a 2015, a Eletrobras teve um prejuízo somado de 31 bilhões de reais. Em 2016, o balanço finalmente voltou para o azul, fechando em 3,42 bilhões de reais. Nos dois primeiros trimestres deste ano a companhia lucrou 1,7 bilhão de reais.
No fim do ano passado, a Eletrobras apresentou um plano diretor de negócios e gestão para cumprir até 2021. Pelo plano, o ano de 2017 é de reestruturação interna e de redução em 5 bilhões de reais da dívida de 37,9 bilhões de reais. A reestruturação interna é um passo e tanto para um grupo que tem 17 empresas sob seu controle e participações minoritárias em 178 sociedades de propósito específico (SPEs), como são chamados os diferentes projetos da companhia. Desde junho do ano passado, foram realizadas mais de 50 alterações em conselhos de administração e 60 em diretorias nas 17 empresas controladas pelo grupo – o que representa cerca de 70% das vagas passíveis de alteração pela Eletrobras.
Na maioria dos casos, a Eletrobras tem nomeado executivos de carreira. Mas a pressão por apadrinhamentos continua. Em reportagem publicada em julho, EXAME ouviu de pessoas ligadas à empresa que, apesar da lei das estatais, aprovada no ano passado, indicações políticas continuam acontecendo. Em muitos casos, as indicações são aprovadas porque a lei acaba não impedindo que as indicações políticas aconteçam, desde que sejam de pessoas com experiência no setor. “O conselho tem vetado alguns casos, mas ainda há outros acontecendo. Tudo isso cria um ambiente hostil para as mudanças na Eletrobras”, diz um executivo da empresa.
O segundo plano da Eletrobras para 2017, o de desinvestimentos, também caminhava a passos mais lentos do que o mercado gostaria. Para analistas, parte do valor baixo da empresa na bolsa é justificado porque os investidores estão à espera da venda desses ativos. A companhia chegou a divulgar uma lista de 74 SPEs que poderiam ser vendidas no terceiro trimestre. Outras seis distribuidoras estavam na lsita para venda até o fim do ano.
Wilson Ferreira também vinha encontrando dificuldades de gestão típicas de quem tenta grandes mudanças na cultura e no dia-a-dia de estatais. Em junho, chegou a chamar um grupo de 40% dos funcionários de “vagabundos” por não trabalharem e apenas se beneficiar do serviço público. Seu plano era reduzir o número de funcionários de 23.000 para 12.000, o que obviamente vinha encontrando grande resistência dos sindicatos.
São barreiras que, na teoria, diminuem com a privatização. Mas o processo vai ser pra lá de complexo. E são os detalhes do plano que mostrarão se a euforia desta terça-feira continua.