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Eleições americanas podem ditar ritmo de ajuste fiscal no Brasil

Para Roberto Padovani, economista-chefe do BV, uma eventual vitória de Trump aumentará senso de urgência e magnitude dos cortes para o governo arrumar a casa

Roberto Padovani, economista-chefe do BV: "A eleição dos Estados Unidos é importante porque, se acalmar os mercados internacionais, facilitará ajustes aqui dentro. Acho que a estratégia de qualquer político é promover ajustes fiscais graduais, até porque há eleição em 2026" (BV/Divulgação)

Roberto Padovani, economista-chefe do BV: "A eleição dos Estados Unidos é importante porque, se acalmar os mercados internacionais, facilitará ajustes aqui dentro. Acho que a estratégia de qualquer político é promover ajustes fiscais graduais, até porque há eleição em 2026" (BV/Divulgação)

Publicado em 4 de novembro de 2024 às 13h37.

Os Estados Unidos se preparam para as eleições presidenciais desta terça-feira, 5, ainda sob grandes expectativas sobre quem sairá vencedor. Em um cenário dividido, no qual as pesquisas não apontam um favorito claro, uma eventual vitória de Trump pode tornar o ajuste das políticas fiscais brasileiras mais urgente e intenso, diz Roberto Padovani, economista-chefe do BV.

Padovani prevê que o cenário externo tende a ser mais desafiador para o Brasil nos próximos anos, com a expectativa de juros elevados por mais tempo em economias desenvolvidas, devido à atividade mais robusta e às preocupações fiscais, o que também deve pesar contra a moeda brasileira. A intensidade desse ciclo, afirma, dependerá das eleições americanas.

"O mercado já está antecipando uma possível vitória de Trump, que se traduz em um cenário de maior risco e juros internacionais elevados. Para o Brasil, isso significa mais pressão sobre o câmbio e sobre a capacidade de o Banco Central cortar juros", disse Padovani em coletiva de imprensa realizada nesta segunda-feira, 4, véspera das eleições americanas.

Com o dólar próximo de R$ 5,80, uma eventual vitória de Trump, segundo ele, pode pressionar ainda mais os indicadores financeiros do Brasil, aumentando a urgência de uma resposta fiscal por parte do governo.

Incertezas fiscais e a perspectiva de uma política protecionista em um eventual governo Trump elevaram o preço do dólar para próximo de R$ 5,87 na última semana. Nesta segunda-feira, no entanto, a moeda americana perde força globalmente, com pesquisas apontando a candidata democrata Kamala Harris à frente em Iowa, onde Trump venceu as duas últimas eleições.

O economista-chefe do BV considera que Kamala Harris tenderia a ser mais favorável para a economia brasileira. "O mercado veria uma vitória Democrata como algo menos ruidoso, o que seria favorável para nós." Nesse sentido, Padovani acredita que uma vitória de Harris poderia dar um alívio para o governo realizar um ajuste fiscal mais gradual, com uma desvalorização parcial do dólar globalmente, além de menor pressão inflacionária e monetária vinda dos Estados Unidos.

"A eleição dos Estados Unidos é importante porque, se acalmar os mercados internacionais, facilitará ajustes aqui dentro. Acho que a estratégia de qualquer político é promover ajustes fiscais graduais, até porque há eleição em 2026", afirma.

Enquanto aguarda os desdobramentos políticos da maior economia do mundo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem buscado apresentar um plano que estanque a deterioração da relação entre o governo e o mercado. Cortes de gastos associados a programas sociais, como o BPC e o seguro-desemprego, são apontados como medidas mais prováveis. No entanto, Padovani não vê essas medidas como solução para o problema fiscal, que, segundo ele, exige a desvinculação dos gastos com saúde e educação da receita, sob risco de tornar o arcabouço fiscal insustentável para a redução do endividamento do país.

"O nosso grande problema é o fiscal. Quanto mais se posterga o ajuste, mais a dívida cresce e mais os mercados ficam tensos. Como resultado, o juro real sobe, o que implica uma dinâmica de dívida preocupante. A dúvida é saber como reagir a esse cenário. Esse é o nosso drama, porque temos um problema de sustentabilidade da dívida"

Pelas projeções do BV, a dívida brasileira, que tem crescido nesses dois primeiros anos de governo petista, deve continuar em alta nos próximos anos, saltando de 78% do PIB para 83% em 2026 e para  89% até 2029. Para Padovani, gradual ou não, o ajuste fiscal será inevitável.

Fiscal ofusca diferencial de juros

O endividamento também tem se tornado parte central dos debates sobre a alta de juros no Banco Central. A expectativa para a reunião desta quarta-feira, 6, é que o Comitê de Política Monetária  (Copom) acelere o ciclo de alta para 0,5 ponto percentual. Mas, segundo Padovani, a extensão do aperto monetário dependerá da expectativa sobre a contenção da dívida.

Esse cenário fiscal, aponta ele, tem reduzido o efeito do diferencial de juros em relação à economia americana, que tem aumentado conforme os bancos centrais dos dois países seguem direções opostas. Nos Estados Unidos, espera-se que o Fed corte sua taxa básica de juros em 0,25 p.p. na reunião de quarta.

"O diferencial de juros sempre foi um fator determinante para o câmbio. Mas o crescimento desse diferencial não tem tido o mesmo efeito, devido ao aumento dos fatores de risco, que é muito difícil de mensurar e que está subindo. Se não fosse por isso, era para o dólar estar em R$ 5,30."

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