Real abre o ano em queda forte em relação ao dólar, na contramão das projeções de valorização (Ricardo Moraes/Reuters)
Da Redação
Publicado em 10 de janeiro de 2021 às 12h21.
Última atualização em 11 de janeiro de 2021 às 15h35.
A redução das incertezas globais com a vitória de Joe Biden nas eleições americanas e o início das aprovações de vacinas contra o novo coronavírus levaram o dólar a perder força nos dois meses finais de 2020. Analistas apontaram que a economia global pode ter entrado em uma nova fase duradoura de enfraquecimento da moeda americana, beneficiando países emergentes como o Brasil. Mas não foi exatamente isso o que se viu no país na primeira semana do ano.
O dólar fechou em alta na sexta-feira, 8, e teve o maior ganho semanal em quase sete meses no mercado de câmbio do Brasil. E o real consolidou o pior início de ano em termos de desvalorização em pelo menos 18 anos, conforme investidores repercutiram a força da moeda americana no exterior e a falta de ingressos de recursos ao país.
Há um mês, bancos e corretoras passaram a revisar as projeções para o dólar, apontando que poderia cair para uma faixa entre 4,20 reais e 4,50 reais ao longo deste ano, com o ingresso de capital estrangeiro e a melhora da confiança na economia brasileira.
As incertezas sobre o rumo da agenda de reformas no país e a relação entre o Executivo (do presidente Jair Bolsonaro) e o Legislativo pós-eleições para Câmara e Senado e o salto de casos de Covid-19 no Brasil têm aumentado as dúvidas sobre o crescimento econômico em 2021, depois de um ano já recessivo em 2020.
Essa combinação mina ainda mais a atratividade do real como moeda de investimento, algo que já está afetada pela taxa básica de juros nas mínimas históricas -- atualmente em 2% ao ano -- e pela falta de perspectiva de robustos ingressos de capital.
O dólar à vista fechou na sexta em alta de 0,31%, negociado a 5,4168 reais na venda, depois de oscilar entre 5,4417 reais (+0,77%) e 5,3225 reais (-1,43%).
Na semana, a moeda americana saltou 4,34%. Foi a maior valorização desde a semana encerrada em 19 de junho do ano passado (+5,41%).
Considerando os cinco pregões iniciais do novo ano, o real teve o pior desempenho desde pelo menos 2003, iniciando de forma negativa um mês que, sazonalmente, é de entrada de capital ao país e de queda do dólar.
"O que acontece é que não tem mais ninguém vendendo dólar, só o BC", disse um profissional de um grande banco estrangeiro.
"Fundos já compraram tudo que deviam, bancos já terminaram o 'overhedge' (proteção extra dos ativos em moeda estrangeira dos bancos no exterior), só tem hedge de clientes. E tem muita pressão no câmbio futuro porque o estrangeiro que está entrando na bolsa está fazendo hedge", acrescentou, dizendo que o problema está nos juros, que estão "muito baixos para o quadro do país".
Com a Selic em 2% ao ano, os juros reais (descontando a inflação) estão em território negativo, tornando o real uma moeda barata para financiamento ou montagem de hedge de posições compradas em outros mercados e ativos, como ações.
Enquanto o real caiu 4,16% na primeira semana do ano, o Ibovespa -- principal índice das ações brasileiras -- deu um salto de 5,2%, batendo um recorde atrás do outro. O índice encerrou a sexta acima dos 125 mil pontos pela primeira vez na história, sendo que nuca havia fechado acima dos 120 mil pontos até quinta.
"Não temos ainda fluxo novo para sustentar uma apreciação sustentada (do real). Os fundamentos dos termos de troca estão muito favoráveis, com forte alta das commodities. Além disso, a liquidez global continua exuberante. Mas precisamos mostrar ordem na casa para atrair esse fluxo", afirmou Marcos Mollica, do Opportunity.
Em nota, o Bradesco avaliou que o agravamento da pandemia pode alterar o cenário de recuperação em alguns indicadores de atividade econômica do Brasil e afirmou que as projeções vão depender da evolução da doença e do processo de vacinação.
O banco acredita que o real continuará a reduzir a distância para os seus pares e encerrar o ano em 5,00 reais por dólar, mas ressalvou que esse cenário pressupõe a manutenção do teto de gastos, a continuidade de retomada da atividade e o início da normalização monetária -- leia-se aumento da taxa Selic.
As questões que prejudicam o real têm se somado a um ambiente externo de maior cautela, conforme a pandemia volta a aumentar em número de casos em importantes economias e fortalece a demanda por ativos seguros, como o próprio dólar.